terça-feira, 30 de abril de 2019

No mundo real

Meu novo artigo, publicado também na Gazeta de Alagoas, Tribuna do Sertão e Tribuna do Agreste:


Enquanto o Mercado financeiro avança predatoriamente sobre as magras condições de vida da grande maioria dos brasileiros, algo em torno de 180 milhões de indivíduos, continua a intensa polêmica entre os grupos que formam as “bolhas” de ativistas sociais do chamado campo Identitarista versus os grupos da nova direita conservadora, regressiva e intolerante.

O centro da luta política no País passou a ser, já há alguns anos, atingindo o ápice na última eleição presidencial, uma acirrada batalha cultural, cabendo ao presidente eleito, no caso atual o representante da “nova direita”, Jair Bolsonaro, ser um “fiscal de costumes”, como se esse fosse o problema do País.

A agenda cultural tem sido ditada pela grande mídia empresa, que por sua vez é também porta-voz dos interesses do Mercado financeiro, combinando uma pauta multiculturalista internacional com o neoliberalismo econômico mais reacionário e violento para com a população brasileira.

Essa grande mídia nacional, associada a uma agenda mundial ditada pelos grandes rentistas globais, esfrega as mãos de entusiasmo quando consegue pautar a “grande polêmica” na arena da política institucional, qual seja: “malucos” versus “cachaceiros”, entre o ex-presidente Lula, absurdamente preso, e o atual ocupante do palácio do Planalto Jair Bolsonaro. E assim, “La nave va” rumo ao desastre anunciado.

Em meio a disputas radicalizadas entre pautas Identitárias, excludentes, narcisistas e o seu oposto, conservadores, regressivos, passa ao largo das bolhas de ativistas sociais o extraordinário avanço dos neoliberais sobre o nosso patrimônio estatal, o rolo compressor com vistas à Reforma da Previdência, que, se aprovada, arrastará ainda mais à pobreza inominável a esmagadora maioria do povo brasileiro.

Os neoliberais daqui vão aplicando as velhas fórmulas dos economistas de Chicago que já não são usadas nem nos Estados Unidos, consideradas ultrapassadas e estúpidas pelas suas elites. O Brasil vive uma grave recessão econômica desde 2014 e tudo indica que vai se aprofundar bem mais.

Há um evidente descompasso entre o mundo digital das redes sociais, frequentado por ativistas sociais, tanto da autoproclamada esquerda como da chamada nova direita, e o mundo real onde as coisas, o destino de todos e da nação vai sendo decidido.

Já alertava o sociólogo Zygmunt Bauman, embora sejam irreversíveis, as redes sociais podem ser uma grande armadilha, porque o único som que se ouve é o eco das suas próprias vozes, onde a única cara que veem é o reflexo das suas próprias caras. As redes sociais são uma zona de conforto entre iguais, o mundo real fica lá fora.

E no mundo lá fora o desemprego bate recordes crescentes sob a lógica da estagnação econômica e a renda concentrada, em meio a oceanos de misérias e ilhas de alto consumo para menos de trinta milhões, ficando ao largo 180 milhões de brasileiros de terceira categoria.

Assim, temos os membros das redes sociais e os sem emprego, que são afinal, quase, os mesmos porque há um crescente contingente de milhões de desempregados que perambulam pelas ruas, sem perspectivas.

O único rumo para o País, o povo brasileiro, é a retomada do desenvolvimento, que gere emprego e renda, a união das grandes maiorias que formam a nação, com vistas a um projeto político e econômico soberano, de progresso social.

domingo, 21 de abril de 2019

Simples consumidores

Meu novo artigo, publicado também na Gazeta de Alagoas, Tribuna do Sertão e Tribuna do Agreste:


Como um rolo compressor os Estados Unidos alastram pelo mundo a estratégia Rumsfeld/Cebrowski, afirma o geógrafo Manlio Dinucci, a destruição das estruturas estatais dos Países não integrados, total ou em parte, na globalização econômica financeira mundial.

Tudo contra todos: é a imagem midiática do caos, o centro motor de uma estratégia que, ao demolir Estados inteiros, provoca uma reação em cadeia de conflitos, a serem utilizados de acordo com a velha máxima dividir para reinar.

Tendo saído vitoriosos da Guerra Fria, em 1991, os Estados Unidos autoproclamaram-se, continua Dinucci, “o único Estado com uma força, uma escala, e uma influência, em todas as dimensões, econômica, política e militar, verdadeiramente planetária, propondo-se impedir que qualquer poder hostil domine uma região”.

Na realidade, afirma Dinucci, Washington não é um aprendiz de feiticeiro incapaz de controlar as forças antagônicas postas em movimento, porque isso faz parte de uma estratégia, a do caos, em uma região ou nação.

Mas a verdade é que atualmente o domínio unipolar norte-americano passou a ser dividido com o grande salto econômico da China e o soerguimento da Rússia, como potências mundiais que hoje disputam em todas as esferas a liderança geopolítica internacional.

Disso tiramos duas conclusões: os Estados Unidos não abandonaram o campo de disputa pela hegemonia anterior, mas não mantêm a antiga supremacia solitária que exerciam ao final da Guerra Fria, e procuram assegurar o domínio político em regiões que consideram fundamentais ao seu projeto de protagonista global.

Os interesses de Estado hegemônico norte-americano não se submetem a ideologias, sobrepõem-se a elas.

Assim é que, de promotores de regimes autoritários na década de sessenta, na Guerra Fria, transformaram-se em paladinos dos Direitos Humanos na gestão do presidente Carter.

Depois promoveram, junto à primeira ministra inglesa Thatcher, a apologia do Estado Mínimo, os anos “gloriosos” do neoliberalismo.

Em seguida, as agendas Indentitárias, autocentradas, individualistas, excludentes, inclusive nos governos Obama, e lideram hoje uma espécie de fundamentalismo conservador, com traços de fanatismo religioso, no mandato de Donald Trump.

Em resumo, os Estados Unidos não se guiam por ideologias, estas são para os outros e suas populações desamparadas, o que prevalece são os interesses econômicos, o status de grande potência.

As ideologias são usadas, através da sua poderosa indústria do cinema, entretimento, redes sociais, associadas à grande mídia empresa global, junto ao Mercado financeiro, desde que elas sirvam aos projetos de criar cinturões de liderança e dominação globais.

O Brasil, potência continental de segunda linha, junto à Índia, precisa defender as suas instituições de Estado, os seus objetivos estratégicos que hoje são alvos de abertas agressões, numa virulenta Guerra Híbrida.

Sem as instituições do Estado fortalecidas, Executivo, Legislativo, Judiciário, não há cidadania política.

Sem ela as pessoas deixam de ser cidadãos, passam a ser simples consumidores. Este é o objetivo do Mercado, consumidores globais sem identidade nacional ou protagonismo político. Ao sabor de agendas periféricas da moda, difundidas por esse mesmo Mercado, senhor absoluto da sociedade, da nação e dos indivíduos.

quinta-feira, 18 de abril de 2019

O homem que inventou o Brasil

Prefácio de Aldo Rebelo para o livro O Homem que inventou o Brasil – Um retrato de José Bonifácio de Andrada e Silva, de Geraldo Luís Lino


Em 2022, o Brasil completará duzentos anos de sua emancipação política. A celebração do acontecimento realçará os seus construtores, entre os quais se eleva a figura grandiosa de José Bonifácio de Andrada e Silva, acertadamente cognominado de Patriarca da Independência.

A inteligência e sagacidade criadora de José Bonifácio tornaram possível o improvável, encurtaram a distância entre a estratégia e a tática, amalgamaram no mesmo objetivo vontades díspares e espíritos aparentemente indomáveis.

Radicais republicanos, vocações jacobinas que viam no modelo da Revolução Francesa o caminho para o Brasil, aceitaram a monarquia centralizada como a fórmula capaz de reunir as energias espirituais e materiais em torno do projeto da Independência.

A combinação magistral de requisitos aparentemente contraditórios, mas essenciais para as grandes empresas, estava condensada na personalidade gigantesca de José Bonifácio. A dosagem exata de audácia e prudência, a medida certa de paciência e iniciativa, a percepção acurada da correlação de forças no Brasil daqueles dias turbulentos, vis-à-vis com a análise correta dos grandes interesses na arena internacional.

Só um espírito superior arrostaria com ambição tão grandiosa: conservar a unidade territorial de um continente, a América Portuguesa, em uma época de fragmentações territoriais nos processos de descolonização; e ao mesmo tempo instalar uma monarquia constitucional, quando o mundo festejava o ideal republicano referenciado na mais promissora das repúblicas, os Estados Unidos da América. A genialidade de Bonifácio se afirmou na negação da cópia dos modelos da época e na busca de um caminho próprio, que preenchesse as condições e as necessidades do Brasil de seu tempo. O pensamento do Patriarca guarda grande atualidade, quando hoje, no Brasil, direita e esquerda nada mais fazem que tentar reproduzir, em diferentes planos, padrões ideológicos e culturais importados da grande nação do Norte.

Foi efêmero o tempo de Bonifácio no governo. A grandeza de sua presença reside mais no roteiro, no caminho, na agenda, nos apontamentos que deixou para um projeto nacional que tornasse o Brasil grande, respeitado, pacífico, amigo de seus vizinhos e cordial com todos os povos; politicamente democrático e socialmente avançado e justo.

A desorientação que preside o debate sobre os rumos do Brasil, na atualidade, quando a agenda do interesse nacional e coletivo foi secundarizada por quase todos os agentes políticos, em benefício do cosmopolitismo e do individualismo, requer como recurso emergente a restauração dos sonhos do Patriarca.

A grande Nação mestiça forjada por índios, europeus e africanos, e depois pela contribuição asiática, foi vista sempre com esperança por todo o mundo. Quando a Europa estremecia sob o impacto das guerras e da fome, os portos da América e do Brasil apareciam como promessas de uma vida renovada. Assim foi durante séculos. Stefan Zweig cunhou a expressão “Brasil País do Futuro”, para o livro generoso e verdadeiro que escreveu sobre o País.

Geraldo Luís Lino presta um relevante serviço, ao exaltar no perfil biográfico de José Bonifácio a sua qualidade maior de patriota extremoso e dedicado. Talvez, seja exatamente este, o patriotismo, o sentimento mais necessário e, quem sabe, o único com capacidade de reduzir o coeficiente de atrito entre classes, corporações e grupos sociais que se agitam em busca de objetivos próprios, desprezando os interesses comuns.

Leiamos o trabalho de Geraldo Luís Lino e que ele reavive em todos nós o respeito e a gratidão pela obra de José Bonifácio, e que façamos dele a referência segura e permanente de amor ao Brasil e ao povo brasileiro.

terça-feira, 9 de abril de 2019

Redes de arrasto

Meu novo artigo, publicado também na Gazeta de Alagoas, Tribuna do Sertão e Tribuna do Agreste:


A revolução tecnológica digital é um dos grandes fenômenos dos últimos tempos, associada aos aplicativos, que servem para qualquer coisa e função, o surgimento das redes sociais frequentadas por dezenas de milhões de pessoas, só no Brasil.

Ali interage uma espécie de sociedade que fala de tudo, opina, cidadãos em geral quando não “ativistas” conectados em escala global.

Se a dita revolução tecnológica é um fato irrefutável, a sua utilização para os fins de criar um clima social arejado e democrático não é apenas discutível, mas absolutamente falso.

Os seus efeitos são múltiplos, vários deles negativos. Relembro o Historiador, filólogo italiano Umberto Eco: as redes sociais deram voz à idiotia que não tem ideologia ou lado político partidário.

A sua capacidade de influência atinge, quase, toda a população brasileira. Mas os espaços de convivência é reduzido a “bolhas” de pessoas que possuem interesses ou afinidades em comum de trabalho, classe social, partidária ou ideologia.

No plano político, as famosas “revoluções coloridas árabes” forjaram a criação do mito de que os indivíduos teriam a mágica condição de mudar os rumos trocando mensagens e interagindo, contra governos e regimes, usando apenas os caracteres exigidos pelos aplicativos nas conversas.

Temos aqui uma incrível mentira produzida, em colaboração com a mídia hegemônica, sobre o uso dessas redes sociais. Porque as “revoluções árabes coloridas” foram milimetricamente articuladas via órgãos de Inteligência norte-americanos, e outros, com fins geopolíticos de desestabilização da região em prol de seus Países.

O nome disso chama-se Guerra Híbrida ou de Quarta Geração. Essa Guerra Híbrida é uma realidade comprovada em uso pelas potências globais.

As redes sociais são totalmente manipuladas, com a sofisticada vantagem de dar a impressão às pessoas que são atores da História, ou ativistas em uma certa conjuntura.

A capacidade de manipulação é tal que os serviços de Inteligência, o capital financeiro global, invariavelmente usam forças antagônicas em confronto, fomentam uma polarização, sempre odienta, fundamentalista, irreconciliável para criar impasses, divisões e fragmentar as sociedades.

Na verdade essas redes são dirigidas pelas grandes potências ou pelos interesses do Mercado financeiro, associados à mídia global, com objetivos definidos e específicos.

Exemplo em curso no Brasil é o conflito entre Políticas Identitárias autocentradas, narcisistas, fragmentárias, a criminalização das grandes maiorias versus uma contra revolução conservadora, medievalista, intolerante, inclusive com as minorias sexuais. Nada mais eficiente para dividir uma nação.

A revolução digital é irreversível, mas a consciência da sua ampla instrumentalização ainda não. Na verdade, as redes sociais mais parecem com redes de arrasto jogadas ao mar.

A eleição presidencial mostrou isso, um País conflagrado em uma guerra cultural, ideológica, quando as questões fundamentais e os rumos da sociedade ficaram à margem da campanha.

O País necessita de uma convivência razoavelmente democrática, um centro de poder, lideranças aceitas por todos, mesmo os da oposição, diálogos acima de “ideologismos” artificiais, em uma nação continental diversa, rica, complexa. E acima de tudo programas e rumos para o Brasil.

quarta-feira, 3 de abril de 2019

O ódio solto da jaula

Meu novo artigo, publicado também na Gazeta de Alagoas, Tribuna do Sertão e Tribuna do Agreste:


O nazismo alcançou o auge, na época de Adolf Hitler na Alemanha, com base em conceitos sobre o mundo absolutamente delirantes. Em Mein Kampf, Minha Vida em português, o líder nazista resolveu considerar que a derrocada econômica e financeira alemã devia-se a uma série de elementos descritos em seu livro.

É uma obra de apologia à pretensa “raça ariana”, uma enxurrada de responsáveis, e culpados, por ela não alcançar o papel de liderança mundial, porque era uma ‘Raça Superior” destinada a não apenas submeter os demais povos, mas a escravizá-los sob todas as formas, inclusive pelas armas.

O terrorista supremacista neozelandês que assassinou recentemente dezenas de pessoas, afirmou em manifesto que os dois maiores inimigos da raça branca “ariana” eram, literalmente: o Brasil e os Estados Unidos, porque são exemplos de nações misturadas, e o Brasil ainda mais pela sua mestiçagem.

O nazismo surgiu na verdade em decorrência de uma brutal debacle financeira mundial, e na Alemanha essa crise agravou-se como resultante dos tributos de guerra a serem pagos, em decorrência da derrota na Primeira Guerra Mundial.

Churchill, líder britânico contra o nazismo, disse que, em parte, o surgimento dessa besta fera deveu-se aos ressarcimentos cobrados pelos aliados contra a Alemanha. Chegou a falar que: nós ajudamos a criar esse monstro, referindo-se às nações líderes vitoriosas na Grande Guerra.

Ao contrário do que afirma o presidente Jair Bolsonaro, o nazismo não é de esquerda. Nem de centro, democrata liberal, conservador ou mesmo uma direita do tipo esclarecida que sempre existiu, como na própria Inglaterra.

O nazismo é consequência de vários fatores, sendo um dos principais a crise econômica e o desespero social.

Ele é típico, assim como uma planta venenosa, dos Países do primeiríssimo mundo, embora algumas mudas possam vicejar nos trópicos, mas nunca com a capacidade letal que acontece entre as nações que se arvoram falsamente em possuir raças não misturadas.

Para justificar um certo Destino de Superioridade, os nazistas constroem uma série de mitos como a raça pura, uma profusão de vitimizações, e os seus responsáveis, por não atingir seus objetivos purificadores que escondem interesses expansionistas e econômicos.

É a intolerância em estado bruto. Por isso justifica-se a perseguição aos “não puros”, às minorias sexuais, democratas, artistas, intelectuais, comunistas, nacionalistas que ousarem defender a pátria contra o seu avanço.

O nazismo é a criminalização total do “outro”. É a “razão de existir” onde já não há mais razões. É o limbo, o ódio solto da jaula, uma alcateia de lobos hidrófobos.

Como a humanidade nunca foi perfeita, o nazismo é a soma, diria Nelson Rodrigues, de todos os demônios interiores que habitam a raça humana, juntos e de uma só vez, potencializados com fortes catalisadores ideológicos.

No mundo, e no País, assistimos a fenômenos assemelhados ao nazismo, mas não exatamente idênticos. Eles proliferam nas pautas das grandes mídias e redes sociais. Incentivados pelo capital rentista.

Está certo o Historiador camaronês Achille Mbembe, ao afirmar que o grande confronto na primeira metade do século XXI não será entre religiões e civilizações, como tentam nos fazer crer, mas entre a via democrática, as nações, versus o capitalismo financeiro global. É também o caso do Brasil.