terça-feira, 4 de dezembro de 2018

Demônios da carnificina

Meu novo artigo:


As grandes conflagrações de massas que estão acontecendo por várias partes do mundo, como os violentos conflitos sociais atuais na França, indicam o esgotamento da Ordem Mundial vigente, com o agravamento da crise financeira iniciada em 2008, antecedida pela hegemonia unipolar norte-americana, após a extinção da antiga União Soviética, ao final da década de noventa.

A História pode não se repetir, mas os acontecimentos, às vezes, se parecem em muitos aspectos.

As crises geopolíticas, a grande depressão econômica, que antecederam às duas grandes guerras mundiais em 1914 e 1939, mostram que os fatores econômicos e a panela de pressão que tamponam a necessidade de novos rearranjos no teatro das nações, em virtude de realidades emergentes, podem impulsionar os Países e as sociedades no rumo de conflitos perigosos ou até militares de proporções catastróficas.

A atual Ordem Mundial surgiu com base na total desregulamentação dos fluxos dos capitais financeiros, especialmente especulativos e predadores, provocando o estancamento da economia global com as suas consequências, tais como o refluxo das economias produtivas, que passaram a crescer a níveis mínimos ou ridículos, quando não negativos.

Daí cresce a crise social, a queda na produção industrial que aumenta enormemente o desemprego, a informalidade no trabalho. O crime organizado torna-se um setor econômico cada vez mais dinâmico e poderoso, especialmente o narcotráfico.

Ele associa o seu processo de acumulação de fortunas à lavagem do dinheiro em paraísos fiscais e absorve também considerável parcela da mão de obra dos assalariados dispensados, especialmente as populações das periferias, abandonados à própria sorte.

Para a solução dessa monumental crise multilateral, o liberalismo econômico radical indica a redução do papel dos Estados em áreas estratégicas e o famoso ajuste fiscal. E se as medidas tomadas não derem certo, a saída será mais ajustes fiscais e venda de patrimônios estatais, naturais, e assim infinitamente. Essa é a lógica da escola neoliberal de Chicago.

A de que o mercado tudo resolve e o Estado só atrapalha. Mas a verdade é que em canto algum do mundo isso comprovou-se verdadeiro.

O Estado tem papel central como indutor, regulador e promotor do desenvolvimento econômico, inclusive nos Estados Unidos durante a crise de 2008, que salvou os superbancos americanos na época e em consequência, a indústria e a própria economia norte-americana de uma catástrofe generalizada, embora a sua sociedade ainda sofra dos efeitos dessa crise até hoje.

Mais que uma fórmula dogmática, o neoliberalismo, e suas variadas denominações, representam uma ideologia sem bases na análise da realidade, que além de não enfrentar as consequências de uma crise econômica, leva ao seu agravamento.

Por outro lado, e em paralelo, para justificar o novo status gerado pela crise nas sociedades, o capital financeiro invoca novas teses como as Agendas Identitárias e do Politicamente Correto, com o objetivo de fragmentar, tribalizar e atomizar o tecido social, aumentando a desorientação que já é generalizada.

Além do mais, com a crise social atingindo enorme escala, setores da sociedade ficam reféns de alternativas políticas autoritárias internas e isolacionistas na política externa.

Assim, assistimos hoje a uma contenda entre neoliberais multiculturalistas versus neoliberais antimulticulturalistas como falsas alternativas a uma crise global sem precedentes na economia.

Obstaculizam a vida política, essencial aos rumos das nações, por um conflito ideologizado, enrijecido, intolerante, distante das propostas e alternativas às sociedades e aos Países.

Exatamente como no período que antecedeu às duas guerras mundiais, hoje parte das grandes potências do planeta refluem para uma linha econômica e geopolítica isolacionista, vejam os EUA, tratando de, na defensiva, assegurar a hegemonia global.

Essa estratégia levou à sanguinolenta primeira guerra mundial e lançou as bases para a brutal carnificina que foi a segunda guerra mundial.

O outro fator importante é a negativa, da parte das grandes potências, em reconhecer a reconfiguração da geopolítica global com o surgimento de novos atores mundiais a exemplo dos BRICS.

É uma fixação da ideia do domínio incontestável e imutável de uma hegemonia anglo-americana, desconhecendo, portanto, uma realidade em curso e em evolução, que pode beneficiar todos os Países, inclusive a essas mesmas potências atuais.

Para sustentar suas premissas ressuscitam-se velhos fantasmas, buscam atrair para as suas áreas de influências parceiros sob argumentos ideológicos e alguns até místicos.

É preciso que os Países construam alternativas à supremacia do capital especulativo predador, definam novas linhas partilhadas, cooperadas, de desenvolvimento econômico, defendam uma geopolítica global multilateral, o direito à autodeterminação das nações e das suas riquezas. Porque o mundo dá sinais de rápida deterioração das soberanias nacionais, das liberdades democráticas e individuais.

O perigo atual não são os velhos fantasmas que saem das catacumbas, mas os Demônios das Carnificinas que resultaram nas guerras mundiais de 1914 e em 1939 com centenas de milhões de mortos e mutilados. O Brasil precisa defender o seu protagonismo econômico e geopolítico regional. Propositivo, cooperativo e rejeitar qualquer política externa xenófoba, isolacionista.

Nenhum comentário:

Postar um comentário