sexta-feira, 18 de maio de 2012

Quem nos salvará dos super-heróis?

Na revista Carta Capital, "Blog do Eisenstein", de Vitor Knijnik, em seus “Blogs do Além”:



Nos seus primeiros anos de vida, logo após os irmãos Lumière o parirem, o cinema não passava de uma atração de feira e exposições. Ninguém via grande futuro naquela invenção. Porém, era uma curiosidade que fazia as pessoas literalmente caírem da cadeira. O olhar virgem da plateia não demandava que os protocineastas contassem histórias. Para causar sensação, bastava apenas registrar as coisas em movimento e depois exibir a película. Mais ou menos como são os filmes pornôs.

Mas o ser humano é um bicho enjoado e logo boceja quando não lhe apresentam novidades. Alguns pioneiros, então, decidiram contar histórias através do cinematógrafo para assim manter o interesse da audiência. Outros investiram no ramo da pipoca, apostando que no futuro ninguém conseguiria ficar duas horas sentado fazendo uma única coisa.

Uma das primeiras experiências narrativas relevantes aconteceu nos Estados Unidos, através das mãos de D.W Griffith. Ele introduziu novas formas de fazer cinema. Foi o primeiro a usar dramaticamente a montagem, alternando closes e movimentos de câmera. Por isso é conhecido como pai da linguagem cinematográfica. Da mãe sabe-se apenas que fugiu com um rico produtor de Hollywood.

Minha contribuição para a consolidação do cinema como expressão artística foi decisiva. Eu percebi que a montagem poderia ir além de uma mera ligação de imagens relacionadas. Acreditei que uma terceira ideia poderia ser gerada na cabeça do espectador com a justaposição de duas imagens independentes. Essas colisões de imagens permitiram manipular as emoções da audiência e libertaram a linguagem cinematográfica para a criação de metáforas, coisa que Stalin adorou.

Mas por que estou aqui a contar a história do cinema e a sublinhar minha importância? Ora, a intenção é justamente contrária. Sinto-me derrotado ao ver que o meu legado foi transformado. Imaginei que, com minhas descobertas, as narrativas se sofisticariam e a linguagem cinematográfica se expandiria sem limites. Nada disso. O cinema se desinteressou pelo mundo adulto. Virou uma indústria dedicada apenas a adular adolescentes ou a infantilizar os maiores. Veja o que está em cartaz neste momento (não importa qual). Cerca de 70% das salas estão tomadas por personagens que precisam salvar o mundo de uma grande ameaça. Das 30 maiores bilheterias de todos os tempos, 28 são dedicadas aos menores de 18 anos. Isso se você considerar que Avatar e Titanic têm temática adulta.

Há os que alegam que os filmes não precisam ser mais do que divertimento. Pode até ser. Mas, da mesma maneira que as primeiras plateias exigiram ver mais do que movimentos, as atuais pedem cada vez mais adrenalina. E os estúdios respondem fazendo filmes caricatos que se parecem com uma montanha-russa, só que sem aquela parte tranquila da primeira subida. As montagens estão tão frenéticas que, numa cena de luta ou perseguição, não sabemos quem é quem. Só sabemos que o herói vai sobreviver. É por isso que o balde de pipoca não para de aumentar.

Me despeço coerente com meus princípios. Deixo aqui três frases. Monte-as como quiser:

Heróis assassinos.

O cinema morreu.

Socorro, o 3D quer furar meu olho.

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