sexta-feira, 15 de novembro de 2019

Encruzilhada



O Grito, de Edvard Munch, de 1883

Mesmo ameaçadas, a democracia, e a Constituição, que completa trinta e um anos desde a sua promulgação, estão conseguindo resistir bravamente a todos os tipos de ataques e destemperos. Os tempos atuais não estão sendo fáceis em grande parte do planeta.

Os discursos “ultristas” vão ganhando espaços em várias nações, porque a crise global, de feição multilateral, se alastra velozmente e as insatisfações sociais adquirem enormes dimensões em um período em que o dissenso é a marca na vida política.

Se a História fosse um círculo contínuo e eterno poderíamos afirmar que estamos de volta aos contornos econômicos, sociais, geopolíticos que antecederam às grandes tormentas que desembocaram na tremenda carnificina da Segunda Guerra mundial.

O declínio da hegemonia mundial absoluta dos Estados Unidos, após a debacle da extinta União Soviética, vem provocando grandes tensões internacionais assemelhadas à agonia do grande império britânico, onde se dizia, e era verdade, que o sol nunca se punha.

Naquela época a disputa por domínios internacionais no comércio e nas finanças, especialmente através da Alemanha nazista, Japão, Itália, Estados Unidos, União Soviética, sem alternativas diplomáticas, desembocaram no mais terrível conflito bélico da História da humanidade com dezenas de milhões de mortos, sem falar nos mutilados, órfãos de guerra etc.

Atualmente vivemos uma acelerada transição para outra ordem global com o protagonismo mais destacado da China, Rússia (o Brasil e a Índia em menor escala), e a ação reativa dos EUA em defesa de uma realidade já em plena transformação. Aqui está o centro dos principais conflitos comerciais, militares e geopolíticos que estão abalando o mundo.

Assim é que hoje Ideologias fundamentalistas, à esquerda e à direita, como nas décadas de vinte e trinta do século passado, proliferam e demarcam terreno, com ativistas em cruzadas muitas vezes dogmáticas que mais se parecem com a Inquisição na Idade Média, onde pessoas como Galileu e Giordano Bruno pagaram caro tributo, tanto como a ciência, a filosofia e a liberdade de pensamento crítico.

Nesse jogo atual onde o vencedor tem sido o grande capital especulativo, a mídia globalizada associada a esse rentismo predador tem feito a sua parte ajudando a semear o confronto, fomentando a dissenção, a fragmentação do tecido social, e fundamentalmente escondendo as verdadeiras causas das angústias dos povos, que advêm de uma brutal crise, decorrente de uma concentração de renda estratosférica.

Marion Jansen associa o atual estágio da globalização financeira ao famoso quadro O Grito do pintor norueguês Edvard Munch, de 1883, a imagem de uma pessoa disforme, transmitindo desespero em um cenário tortuoso e angustiante. Nesse quadro “nós vemos o grito mas não o ouvimos”.

As polarizações entre ideologias sectárias tomam conta do discurso político e se retroalimentam, muitas vezes conscientemente, em uma espécie de jogo macabro. Uma espiral que parece nunca ter fim. A máxima prevalecente hoje é: se você não concorda comigo, então você é um inimigo.

As novas tecnologias de comunicação, as mídias sociais, representam um avanço irreversível, mas elas não substituem a concertação e o entendimento só possível pela vida política democrática. O que pressupõe a necessidade de um projeto de nação amplamente inclusivo, jamais excludente das grandes maiorias sociais.

A atual realidade política nacional, óbvio, também padece desse veneno letal já há algum tempo.

No Brasil, muitos falam em democracia e respeito à Constituição. Mas quem viveu os tempos da ditadura, da lei de segurança nacional, do AI5, dos tribunais de exceção para julgar e prender adversários políticos, cassar parlamentares, demitir sumariamente trabalhadores ou servidores públicos suspeitos de fazer oposição ao regime, da total censura à imprensa, do decreto 477 para expulsar das escolas lideranças estudantis, quem viveu tudo isso sabe muito bem que o arbítrio só foi superado através da “união de todos os democratas e patriotas em defesa da democracia e do Brasil”, para ser redundante com documentos valiosos da época.

Não será em uma nação fraturada, sectária, intolerante, dividida, odienta, que vamos conseguir superar o atual estágio de desorientação generalizada que ora vivemos. Isso só serve às “bolhas” em perpétuo confronto que presenciamos.

E mesmo assim é útil até um certo ponto, porque ninguém é capaz de adivinhar até onde a democracia, a Constituição e o Brasil, podem suportar essa espiral de furor e da “não política” onde estamos metidos.

O País, apesar de novo, tem larga tradição Histórica de encontrar soluções para os seus conflitos, para os seus demônios interiores, até para as guerras civis sangrentas mesmo, e seguir em frente como nação unificada na diversidade de opiniões. Aquilo que chamamos convivência política democrática sem adjetivações.

Tudo indica que será necessário, cedo ou tarde, um novo pacto democrático, mais uma vez através da via política e da participação de toda a sociedade, que seja representativo de todos segmentos nacionais. Sem esse amplo entendimento político e social não vamos conseguir sair dessa encruzilhada Histórica que vivemos.

segunda-feira, 28 de outubro de 2019

O Chile em luta pela segunda independência, por Aldo Rebelo


Texto de Aldo Rebelo, publicado no portal Bonifácio.

Batalha de Maipú, confraternização entre Bernardo O'Higgins e San Martin - Pedro León Subercaseaux (1880-1956).

No último dia 10 de outubro, o presidente do Chile, Sebastian Piñera, em entrevista à televisão, aclamava seu país como um “oásis” de crescimento econômico, geração de empregos e estabilidade democrática na América Latina, cercado de crises, no Brasil, no México, na Argentina, no Paraguai, na Bolívia e Peru.

No dia 20, Piñera voltava à televisão, desta vez acompanhado de seu ministro da Defesa, para atacar “um inimigo poderoso, implacável, que não respeita nada nem ninguém, e que está disposto a usar a violência e a delinquência sem nenhum limite”. Esse inimigo era o próprio povo chileno, que desencadeava uma inédita onda de mobilizações contra o aumento das tarifas de transporte e de denúncia das desigualdades sociais.

As autoridades chilenas convocaram as forças de segurança para reprimir as manifestações e a violência se espalhou pelas ruas de Santiago, resultando em mais de uma dezena de mortos.

Três dias depois, no dia 23, Piñera retornava mais uma vez às redes de televisão para pedir perdão à população por ter compreendido tardiamente suas reivindicações. Prometeu reformar a Previdência, a educação e a saúde, elevar o salário mínimo e reduzir as tarifas de energia.

Depois, pelo Twitter, Piñera elogiou as manifestações como “caminhos para o futuro e esperança”. No esforço para conter a crise, pediu a todos os seus ministros que colocassem seus cargos à disposição, ou seja, que renunciassem. Sebastian Piñera, finalmente, dobrava-se à força dos acontecimentos.

O que se passa com o Chile? Visto por seu presidente como o “oásis” latino-americano, elogiado pelo ministro da Fazenda do Brasil, Paulo Guedes, como a “Suíça” da América do Sul, a ebulição social caiu sobre o país como um raio em céu azul.

A verdade é que o laboratório chileno de crescimento econômico apoiado na concentração de renda e privatizações dos serviços públicos explodiu. Sem renda, sem Previdência e sem serviços públicos o modelo chileno exibia as deformidades que esgotaram a paciência popular. Os rancores acumulados pelas frustrações da vida difícil da classe média e do povo desencadearam as mais vigorosas manifestações da história recente do país.

Os chilenos travam nas ruas de Santiago a sua segunda Batalha de Maipú. Na primeira, em 1818, conquistaram a independência ao Império colonial espanhol. Agora tratam de emancipar o Chile, sua classe média e seu povo do modelo excludente imposto pela elite rentista.

quarta-feira, 16 de outubro de 2019

A nação ou a tribo



A Balsa da Medusa, de Jean Louis Théodore Géricault, 1818-1819, Museu do Louvre

Os fenômenos que afloraram a partir da extremada concentração do capital especulativo em nível global fizeram com que um reduzido grupo de bilionários compusessem uma espécie de governança mundial.

Aplicando verdadeiras fortunas em mídias de abrangências globais, incentivando movimentos e líderes internacionais de ativistas através, inclusive, da rede mundial de computadores. Mudaram, continuam mudando, as agendas, “introduzindo” novos paradigmas às sociedades, todos eles sob a gerência e interesse do capital rentista.

Sem a revolução tecnológica, o domínio das agendas globais através do capital rentista predador seria menos avassalador e rápido que como está acontecendo no novo milênio.

A globalização financeira com essa nova cara é um fato irreversível, e só quem faz contenção aos seus interesses, ou deles se aproveitam, são as grandes potências mundiais, nomeadamente os Estados Unidos, China, Rússia, e em menor escala determinados Países da Europa Ocidental, como a Alemanha, e algumas nações nórdicas.

Como já se disse, as esperanças de satisfazer as necessidades de autoafirmação individual e ao mesmo tempo desarticular o sentimento de identidade comum de um povo, pela facilidade, velocidade da comunicação individual, e da mídia globalizada, via os instrumentos da revolução digital, revelaram-se eficazes, criando-se, inclusive, novas “ideologias” para essa finalidade.

Mas, por outro lado, a brutal concentração da renda, o veloz empobrecimento das grandes maiorias sociais, têm provocado uma generalizada frustração e desesperança entre as populações do mundo, com raras exceções.

A rede mundial de computadores, as redes sociais, passaram a exigir a simplificação das mensagens. De tal forma que as mais acessíveis e vistas por todos, são aquelas mais abreviadas, desprovidas de conteúdos, argumentos minimamente elaborados.

Método plenamente consagrado, tanto nos “aplicativos das redes sociais”, como através da cadeia da grande mídia globalizada.

Em suma, cada vez menos conteúdos, mais fatos rasos, logo ultrapassados por outros iguais.

E menos informações que possibilitem algum tipo de sentido aos reais fenômenos que estão acontecendo em sua região ou no mundo. É a produção incessante do presente contínuo, sem passado ou futuro.

Porém, a realidade é mais implacável que a péssima utilização da revolução digital em proveito da acumulação das finanças especulativas e predadoras.

A queda na produção industrial, o desemprego em massa e por outro lado ilhotas de bem aventurados, a óbvia ausência de razões e sentidos no presente contínuo, chegaram ao ponto em que, por exemplo, no Brasil os pensadores, nem digo filósofos, acadêmicos e políticos, são os novos atores de ideias vazias da mídia global, que substituem os verdadeiros jornalistas, os atores de verdade, ou os que possam contribuir em ideias com algo relevante à sociedade e à nação.

A constante iniciativa de combate ao contínuo Histórico, passado, presente com rumos ao futuro, vem sendo substituída pelo entendimento nada casual, porque proposital, da desconstrução do sentido em comum de pertencimento a uma nação, como no Brasil, e em seu lugar “impor” a fragmentação das agendas identitárias.

E nessa guerra híbrida de quarta geração, surge o seu contrário que se expressa como no discurso do presidente Bolsonaro, em uma agenda obscurantista, messiânica, isolacionista, primária, dependente da visão do excepcionalismo norte-americano, como a “salvação” do mundo ocidental anglo-saxônico, do qual nós nunca fizemos parte e nunca faremos. Tentando fazer retroceder o nosso protagonismo internacional como Estado, nação continental, liderança regional hemisférica, cuja característica central é a mediação diplomática não beligerante.

Em uma divisão da sociedade, via uma espécie de polarização ideológica e política que se retroalimenta em benefício próprio, sem no entanto apresentar rumos à crise geral que se abate sobre o Brasil.

O que pretendem essas forças de política rasa, assim como o capital financeiro rentista, com esse tipo de iniciativas e “ideologias”, tanto uma como outra, é a desorientação generalizada da sociedade.

Em um mundo globalizado como o nosso, é preciso entender que só há duas opções: a nação ou o tribalismo, a canibalização ideológica desenfreada.

Nós devemos continuar com a nossa persistência em buscarmos erguer uma nação democrática, construída por forças heterogêneas, justa e progressista.

sexta-feira, 4 de outubro de 2019

Capitalismo predatório ameaça a democracia, por Andre Motta Araujo




Capitalismo predatório ameaça a democracia
por Andre Motta Araujo


Quem diz é o mais importante jornalista do mais importante jornal econômico do planeta, o FINANCIAL TIMES em artigo de Martin Wolff de 18 de setembro.

O colunista do jornal britânico demonstra que a CONCENTRAÇÃO DE RENDA está liquidando com sólidas sociedades de classe média, como Estados Unidos e Reino Unido. As gerações do pós-guerra tinham certeza de que os filhos teriam maior renda que os pais, durante as décadas de 40, 50 e 60. A partir da década de 70 a curva se inverteu, os filhos passaram a ter renda menor que os pais, e o processo se agravou enormemente a partir de 1990, chegando a um anticlímax após a crise de 2008, quando hoje 1% de bilionários detém 54% da riqueza mundial e um CEO (executivo chefe) hoje ganha 300 vezes mais que um operário, nos anos de pós guerra a relação era de 40 para 1.

A concentração de renda se tornou avassaladora e está produzindo oceanos de miséria pelo mundo. Mas a crise do capitalismo financeiro predatório não é a que vem de baixo, ela é entrópica porque ela é autodestrutiva, seus próprios métodos a levarão à sua implosão sistêmica. A concentração TRAVA O CRESCIMENTO e o crescimento é essencial para a própria existência desse capitalismo que não pode parar.

A crise tem elementos distintos e vou tentar dissecá-los. É minha análise e não do Financial Times:

1.ELIMINAÇÃO DE BARREIRAS ÀS FUSÕES E AQUISIÇÕES

A partir das políticas Thatcher-Reagan no coração do capitalismo anglo-saxão, foram eliminadas quase completamente as barreiras para empresas comprarem outras ao infinito. A cada compra há desemprego de milhares de trabalhadores e centenas de executivos de escalão médio. Fusões absurdas, como a DOW CHEMICAL e a DUPONT, dois gigantes que concorriam entre si há um século, ou BAYER e MONSANTO, dois competidores globais em defensivos agrícolas, eliminando competição, que é uma das bases do capitalismo de mercado, permitindo oligopólios em preços e patentes. As economias de escala são apropriadas pelas empresas e não trazem vantagem alguma a consumidores e países.

2.DIMINUIÇÃO EM PAGAMENTO DE IMPOSTOS

As megaempresas resultantes de fusões têm como um dos seus principais objetivos a REDUÇÃO DE IMPOSTOS e a própria fusão gera créditos fiscais que farão a nova empresa fusionada pagar menos imposto de renda, tornando vantajoso, pelo tamanho, transferir lucros para PARAÍSOS FISCAIS. Hoje as corporações americanas têm 6 vezes mais lucros “parqueados” em paraísos fiscais do que no seu próprio País. Com isso prejudicam tanto seu país-sede como os países onde operam. A desoneração fiscal significa que essas empresas USUFRUEM dos serviços públicos nos países hospedeiros, MAS não pagam seus custos, onerando os demais cidadãos que têm que pagar mais impostos para aliviar as megacorporações de sua cota na manutenção do Estado.

3.TRANSFERÊNCIA DE FÁBRICAS PARA PAÍSES DE BAIXOS SALÁRIOS

Processo largamente usado pelas corporações multinacionais e que criou oceanos de desempregados em países centrais e mesmo em países emergentes de industrialização tardia. O benefício pela economia em salários e impostos beneficiou especialmente o ACIONISTA e, em menor escala, o consumidor. Mas ao criar desemprego em um processo contínuo, ao fim faz empobrecer mercados consumidores, que ficam sem renda para comprar seus produtos. No uso de cadeias produtivas globais as empresas fazem LEILÃO FISCAL E DE VANTAGENS ENTRE PAÍSES, mudam a fábrica para o País que dá terreno de graça, créditos, vantagens, treinamento, infraestrutura e isenções fiscais. Mas ao empobrecer regiões e países, com isso aumentando seus lucros, vão no caminho reduzindo a renda de onde saem e, às vezes, de seus próprios países de origem, tudo beneficiando a empresa do ponto de vista micro. No outro lado a desidratação do mercado consumidor se dá como efeito macro, CADA EMPRESA ganha nos seus custos, mas o conjunto das empresas perde consumidores, fenômeno que acontece gradualmente à medida que se cria desemprego em países que perderam fábricas, como Reino Unido, Brasil e Argentina. Desempregados não compram roupas feitas na China porque não têm renda.

4.PODER EXCESSIVO SOBRE CONSUMIDORES E FORNECEDORES

Quanto mais concentrado o mercado em cada vez menos empresas, menor a margem de liberdade do consumidor e do fornecedor dessas empresas. Quando a NESTLÉ comprou a Chocolates Garoto, cerca de metade das marcas de chocolates do País ficou sob controle de uma só empresa, transação que jamais deveria ter sido aprovada pelo CADE e foi. A AMBEV tem 600 marcas de cerveja pelo mundo, uma absurda concentração de mercado. A mesma NESTLÉ controla marcas de águas minerais pelo mundo, Perrier, San Pellegrino, São Lourenço no Brasil e em quase todos os grandes mercados domina o setor. Esse processo empareda consumidores e fornecedores. Isso só é bom para o acionista e para ninguém mais, é um processo autofágico e destrutivo, a competição é da essência do capitalismo e sua eliminação é perigosa para o próprio sistema.

5.CONTROLE POLÍTICO DE GOVERNOS E CONGRESSOS

Aumentando o poder das corporações multinacionais, o processo se dá reduzindo o poder dos Estados para taxar e regular essas empresas, um processo danoso às sociedades em geral, confrontacionista com os Estados que perdem poder de controle.

6.TUDO PARA O ACIONISTA E NADA PARA A SOCIEDADE

A lógica do atual sistema é dar TUDO AO ACIONISTA contra os direitos dos trabalhadores, dos consumidores e dos Estados, é uma IDEOLOGIA que vem dos anos Thatcher-Reagan, não existiu tal conceito entre 1900 e 1970, quando o grupo Standard Oil foi, por decisão do Presidente Theodore Roosevelt, DIVIDIDO em 6 partes, a concentração numa só empresa era vista como perigosa ao Pais e à sociedade. A Divisão Antitruste do Departamento de Justiça dos EUA, entre sua criação em 1903 e 1978, barrou cerca de 6.700 fusões, por serem contra o interesse público. Bancos nos EUA só podiam existir em um Estado, em certos Estados só em uma cidade. Tampouco bancos poderiam controlar corretoras de bolsa, seguradoras e fundos de investimento. A partir do Governo Reagan essas barreiras foram eliminadas e permitiu-se uma concentração livre no mercado financeiro, o que resultou na crise de 2008, salva pelo Tesouro, ou seja, pelo Governo dos EUA, a desregulamentação gerou a crise de 2008.

A etapa final desse capitalismo será o patrocínio de GOVERNOS NEOFASCISTAS para controlar as massas miseráveis geradas pelo processo. A partir desse ponto, já atingido em alguns países, serão eleitos governos populistas de direita para permitir a CONTINUIDADE DA CONCENTRAÇÃO e o desmonte dos serviços sociais e de amparo às populações pobres, para que o CORTE DE GASTOS permita aliviar ainda mais a carga fiscal das empresas e de seus acionistas. TUDO PARA QUE A PARTE DO CAPITAL NA RENDA NACIONAL AUMENTE, ao mesmo tempo que se enfraquece o Estado para que ele NÃO TENHA FORÇA PARA REGULAR AS EMPRESAS e fique dependente dos “mercados” para seu financiamento através da dívida pública.

Com esse processo atinge-se o objetivo maior do CAPITALISMO PREDATÓRIO, qual seja, controlar a POLÍTICA MONETÁRIA através do Banco Central dominado pelos “mercados”, a POLÍTICA ECONÔMICA pelo seu comando por um executivo do “mercado” e através disso controle do Estado por um preposto, político de direita apenas para fazer o papel de polícia das massas miseráveis para que não se revoltem, o controle real do Estado e do CAPITALISMO PREDATÓRIO.

POR QUE O CAPITALISMO PREDATÓRIO NÃO CONSEGUE ENXERGAR RISCOS?

Porque é de sua própria natureza operar SEM AUTO CONTENÇÃO, SEM LIMITES. As escolas de negócios pelo mundo, cuja expansão se deu em grande escala a partir dos anos 70, são “madrassas”* de lavagem cerebral que moldam executivos na religião do “corte de custos”, não importa o risco que tal processo possa gerar. O CASO VALE mostra onde essa “religião” leva, corta-se custos ao máximo limite não importa o risco, mesmo de morte de centenas de pessoas, é DA NATUREZA DO SISTEMA não conhecer limites para o lucro. Os bancos brasileiros poderiam ser altamente lucrativos com juros mais baixos, MAS eles jamais serão razoáveis por autodeterminação, os robôs humanos MBA são programados para o lucro máximo, mesmo que pelo caminho destruam sociedades. Só o ESTADO pode conter esse tipo de sistema predatório que, deixado às suas próprias razões, destruirá o equilíbrio social, o meio ambiente e trará, em larga escala, o aumento da criminalidade, das doenças mentais, do uso de álcool e drogas, das rupturas sociais e da Humanidade.

Essa é, na essência, a conclusão de MARTIN WOLFF no jornal FINANCIAL TIMES em artigo magistral publicado em 18 de Setembro de 2019.

*A palavra deriva do árabe madrsa, por vezes transliterada como madrassa ou madrasa, palavra que em árabe originalmente designava qualquer tipo de escola, secular ou religiosa (de qualquer religião), pública ou privada.

domingo, 15 de setembro de 2019

A velha ordem e o governo Bolsonaro




As conflagrações “culturais” e sociais em várias regiões do mundo, como os violentos conflitos sociais na França, que já duram meses, indicam o esgotamento da Ordem Mundial vigente, pari passu ao agravamento da crise econômica global, provocada pela concentração do capital financeiro especulativo, o capital rentista predador.

O que estamos vendo é a fadiga de material, a exaustão, da ordem global que surgiu após a debacle da extinta União Soviética, da qual a China nunca foi aliada, salvo em curto período, no início da revolução em 1949.

Em consequência emergiu essa “Nova Ordem” mundial, com a total hegemonia política, midiática, cultural, militar, geopolítica dos Estados Unidos, de tal forma que George Bush, o pai, declarou que os EUA passariam a ser os policiais do planeta.

Ao final do século XX, e no novo milênio, a humanidade nunca viu tantas guerras regionais, morticínios, em toda a História contemporânea. Era a expansão dos objetivos econômicos e geomilitares da chamada Pax Americana.

Com tal contundência que levou intelectuais, acadêmicos, como o nipo-americano Francis Fukuyama, a proclamar solenemente em seu livro homônimo, o fim da História.

Ao tempo em que a desregulamentação dos fluxos financeiros, auxiliada pela revolução tecnológica, fazia expandir e concentrar em escalas inimagináveis, a acumulação das riquezas em ínfimas mãos, especialmente através do capital parasitário, predador.

Por certo tempo essa visão, impulsionada, financiada por megaespeculadores financeiros parecia imutável.

A grande mídia, também globalizada e concentrada, fazia as vezes de transformar o jornalismo, mesmo que parcial, em uma formidável máquina ideológica desses conceitos sobre o fim da História, procurando desarmar as reinvindicações dos povos, as agendas pela autodeterminação das nações, consignas que estão, inclusive, inscritas na carta fundadora das Nações Unidas, a ONU.

Adveio, porém, uma brutal crise social, a queda na produção industrial, o estancamento da economia global, à exceção, pela média anual, da China, fazendo crescer a níveis estratosféricos o desemprego, a criminalidade, tornando, inclusive, o narcotráfico um dinâmico e poderoso setor econômico internacional.

As sociedades mergulharam em uma situação catastrófica generalizada, à exceção de minúsculas ilhas de privilegiados, para quem o consumo e as agendas da pós-verdade são dirigidas.

Mas o capital financeiro é insaciável e, para tanto, avocou a tese de que para solucionar tal situação aberrante a saída é vender tudo que pertence ao patrimônio nacional dos Países e abater a pauladas os direitos trabalhistas.

A resultante é óbvia, miséria galopante e precarização da vida dos cidadãos, daí a Reforma da Previdência, uma brutal espoliação no presente e futuro, especialmente para as novas gerações.

Dessa forma, como a História teria chegado ao fim, dizia Fukuyama e outros, seria necessário por no lugar da luta por um mundo melhor, uma nova agenda que tivesse em sua gênese questões também pertinentes, como a defesa das minorias, contra o racismo etc.

Associada a essa agenda “identitária” introduziu-se uma outra: o combate à corrupção, que também é justa, mas que na verdade vem servindo aos propósitos de criminalizar a vida política democrática e substituí-la por corporações estatais messiânicas, como falsos guardiões da ética, com olhos que não enxergam e ouvidos surdos para a venda das riquezas estatais do País, o assalto aos direitos trabalhistas.

Nada disso é específico ao País. Trata-se de um discurso global e que também serve aos propósitos da hegemonia absoluta do capital financeiro especulativo.

O objetivo é que essa agenda contorne a realidade de um abismo profundo, cada vez maior, separando as grandes maiorias sociais e um seleto clube de bilionários favorecidos pela globalização financeira. No Brasil de hoje essa política vem sendo aplicada há, mais ou menos, vinte anos, e de forma extremamente radicalizada no governo Bolsonaro.

Trata-se de um governo raso com traços reacionários, estapafúrdios. Sua marca central é um falso nacionalismo, já que é entreguista, associado a uma política econômica baseada em um neoliberalismo radical, extremado, cujas metas são a venda de todas riquezas nacionais, a privatização, o desmantelamento dos direitos trabalhistas, conquistas que datam, inclusive, da Revolução de 1930, sob a liderança de Getúlio Vargas.

Hoje vivemos sob um processo de desorientação generalizada no campo das forças democráticas, progressistas, já que parte delas assimilou acriticamente as chamadas pautas identitárias, utilizadas por Bolsonaro com fins de polarização midiática e nas redes sociais, para que seus propósitos antinacionais e antissociais passem ao largo das polêmicas centrais. O capital financeiro rentista também agradece.

É fundamental que forças democráticas e progressistas olhem para além dos “horizontes identitários”, que as mantêm ilhadas e distantes das maiorias sociais, e passem a construir um projeto em defesa do Brasil brutalmente espoliado, pela geração de empregos, a retomada do desenvolvimento econômico. Que possibilite unir as grandes maiorias nacionais em torno do bem comum, da plena cidadania para todos.

segunda-feira, 2 de setembro de 2019

Brasil deve ampliar presença militar e cooperação internacional na Amazônia, por Aldo Rebelo

Texto de Aldo Rebelo, publicado no portal Bonifácio.


O mal-estar diplomático em torno da Amazônia envolvendo o Brasil, a França, a Alemanha, a Noruega e outros países europeus não surpreende quem conhece um pouco da história do nosso País e das ambições coloniais europeias.

A Amazônia brasileira foi colhida no epicentro da sensível agenda mundial do aquecimento global e da questão climática. O problema é que legítimas preocupações ambientais estão entrelaçadas com ambições geopolíticas, interesses comerciais e graves deficiências do Estado brasileiro em administrar o desafio diplomático, ambiental, econômico e social da Amazônia.

Rigorosamente, a disputa pela Amazônia antecede o próprio conhecimento de sua existência. Quando em 1494 Portugal e Espanha celebraram o Tratado de Tordesilhas, dividindo o mundo conhecido e ainda a conhecer em áreas de influência das duas potências coloniais, deram início à corrida pelo domínio da grande bacia hidrográfica.

Portugal empenhou-se em jornada penosa e heroica para conquistar território que seria naturalmente espanhol. Sucessivas epopeias de notáveis varões lusitanos consolidaram o domínio Português.

Pedro Teixeira, em 1637, liderou a expedição de 70 soldados portugueses e 1200 índios flecheiros a bordo de uma verdadeira esquadra de canoas, que saindo de Gurupá, próximo a Belém, varou as águas do Amazonas e chegou a Quito, para espanto dos governantes espanhóis. Aí Pedro Teixeira estabeleceu os marcos da presença portuguesa ao longo da calha do grande rio.

Pouco depois, entre 1648 e 1651, provavelmente cumprindo missão em caráter secreto de Portugal, Antônio Raposo Tavares liderou a chamada Bandeira dos Limites, que saindo de São Paulo desbravou os sertões desconhecidos do Mato Grosso até o Peru, descendo pelo rio Amazonas até Manaus e Belém, de onde retornou a São Paulo. Em sua celebre biografia do grande bandeirante, o historiador português Jaime Cortesão qualifica a bandeira de Raposo Tavares como o maior feito na construção do Brasil.

Quem contempla antigo mapa pátrio e se depara com a presença das três guianas na nossa fronteira setentrional, defronta ali a memória da cobiça de três grandes impérios coloniais sobre a bacia amazônica.

As pretensões territoriais arrastaram-se até o Século XX. Em 1907, na questão do Pirara, o Brasil perdeu 20 mil quilômetros quadrados para a Inglaterra no que hoje é o estado de Roraima. Um pouco antes, em 1903, o Tratado de Petrópolis encerrava a questão do Acre com a aquisição desse antigo território boliviano, que passou perto de tornar-se um enclave norte-americano em pleno coração da Amazônia.

A questão é que o Brasil precisa ir além de confrontar interferências e ameaças como a do presidente francês Emmanuel Macron. O desafio é combinar ações de desenvolvimento econômico e social da Amazônia e de sua população, com iniciativas militares de dissuasão, ao lado de medidas de proteção do vasto patrimônio natural da região.

O Estado brasileiro e a sociedade não podem simplesmente condenar a economia existente na Amazônia como predatória sem oferecer alternativa de vida aos milhões de brasileiros que ali vivem, muitos dos quais ali chegaram incentivados pelo próprio Estado, quando o lema era “integrar para não entregar” ou “terra sem homens para homens sem-terra”. A questão é que governos nacionais e estrangeiros e ONGs resolveram tornar absoluta a proteção ambiental e criminalizar a população da Amazônia. Sem alternativa de sobrevivência para os habitantes locais as políticas ambientais têm gerado ilegalidades e conflitos.

Observando o conselho latino si vis pacem, parabélum, o Brasil deveria iniciar imediatamente a construção da base naval para a Segunda Esquadra no norte do Brasil. O lugar já foi escolhido pelo Comando da Marinha e visitado por mim e pelos comandantes da Marinha e do Exército na época em que fui ministro da Defesa.

O terreno junto ao porto de Itaqui, no Maranhão, seria transferido pelo Exército para a Marinha que ali localizaria a sua Segunda Esquadra, antiga aspiração da Força Naval.

O almirante Leal Ferreira e o general Eduardo Villas Boas concertaram durante a visita promover a transferência da titularidade da área. O então governador do Maranhão, Flávio Dino, acompanhou a visita e pôs o estado do Maranhão à disposição do Ministério da Defesa e do Comando da Marinha para apoiar o empreendimento.

Outra iniciativa seria transformar a Base Aérea de Boa Vista na principal Base Aeroespacial do País. Além de acompanhar a tendência mundial de conversão das forças aéreas em forças aeroespaciais, a mudança de status da Base de Roraima sinalizaria a reafirmação da centralidade da Amazônia na política de defesa do Brasil.

O Exército deveria ampliar a oferta de vagas para militares no Centro de Instrução de Guerra na Selva (CIGS) e estender a voluntários civis da Amazônia e de outras regiões do Brasil a possibilidade de frequentar os cursos de formação.

Para as populações indígenas da Amazônia, o Exército deveria ampliar a oferta de vagas para conscritos e engajados e criar em áreas de densidade populacional indígena acentuada Núcleos de Preparação de Oficiais da Reserva (NPORs) voltados para a guerra na selva e dirigido para formar oficiais de origem indígena.

Combinando a ampliação da presença econômica, social e militar na região, o Estado brasileiro teria condições de abrir a possibilidade de cooperação com o mundo no provimento de meios para a pesquisa da rica biodiversidade local em benefício do Brasil e da humanidade.

Poderíamos integrar centros de pesquisa e universidades do Brasil e do mundo com os centros de pesquisa e as universidades da Amazônia e dos países vizinhos, deixando claro que a indiscutível soberania do Brasil sobre o território não exclui a cooperação internacional em torno de objetivos comuns.

domingo, 1 de setembro de 2019

Economia brasileira, terra arrasada, por Andre Motta Araujo


No caminho que hoje segue, sem uma política econômica, o Brasil está rumando para o desastre social e financeiro, com ou sem recessão mundial.


Economia brasileira, terra arrasada
por Andre Motta Araujo

Antes das eleições de 2018 o programa CENTRAL DAS ELEIÇÕES da GLOBONEWS entrevistou o então banqueiro de investimentos Paulo Guedes como pré-ministro do candidato Bolsonaro. O “Posto Ipiranga” disse, aos berros e não aceitando questionamentos, que “nos primeiros seis meses de governo vou privatizar empresas e vender bens da União, arrecadando 2 TRILHÕES DE REAIS”. A afirmação era completamente estapafúrdia, alucinada, maluca, mas Guedes rispidamente NÃO ACEITOU ponderações e questionamentos da equipe de jornalistas do programa, era essa sua verdade impositiva.

MACROECONOMIA

Para gerir a política econômica de um País, especialmente de um País grande e complexo, requer-se um profissional experiente em QUESTÕES DE ESTADO. Se for economista, tem que ser versado em MACROECONOMA, o que é muito diferente de conhecer bolsa, ações, compra e venda de empresas.

No mundo dos “economistas de mercado”, aqueles que seguem o hoje desmoralizado neoliberalismo de Hayek, Thatcher e Reagan, que provocou o empobrecimento do Reino Unido e a mega crise financeira de 2008 nos EUA, mesmo entre o clube da “Casa das Garças”, o fechado círculo do neoliberalismo carioca, há nomes muito mais preparados que Paulo Guedes, elemento do baixo clero do neoliberalismo do Leblon, de pouco ou nenhum prestígio nesse círculo. Nomes como Armínio Fraga e Gustavo Franco são infinitamente mais experientes que Guedes para pilotar a economia de um País, abstraindo a minha completa discordância com o pensamento neoliberal esgotado da PUC-Rio, escrevi até um livro crítico sobre isso.

A relação entre MACRO E MICROECONOMIA é a mesma que existe entre veterinário, enfermeiro e cardiologista. Todos lidam com sangue, agulhas e termômetros, mas suas funções são completamente diferentes. O MACROECONOMISTA tem a visão do todo, dos conjuntos, dos problemas da produção, é um profundo conhecedor de POLÍTICAS PÚBLICAS, daquelas que dependem das funções de Estado e não de mercado. Este é parte, e não o fim, de uma política econômica, onde há conflito de interesses permanente, e cabe ao Ministro arbitrar o conflito distributivo, com atenção ao social.

Já o MICROECONOMISTA tem um campo bem mais restrito que não serve para dirigir a política econômica de um grande País. É o caso de Guedes.

A AUSÊNCIA DE POLÍTICA ECONÔMICA

Pela primeira vez, desde 1930, o governo brasileiro não tem nenhuma política econômica para o semestre, para o ano, para o mandato até 2022.

Não há nenhum plano coerente, com medidas que se inter-relacionam, com providências coordenadas, com uma visão de conjunto que tenha um objetivo definido, com meios e metas. Cortar gastos, e muito mal cortados, apenas no lado dos mais fracos e desassistidos, vender todos os bens da União, isso não é um plano econômico, não chega a nenhum lugar que faça alguma lógica para um País com um terço da população desocupada e sem renda.

Reformas por si só não são um plano econômico, mesmo porque seus resultados só emergem no longo prazo e não tem o condão de, isoladamente, promover crescimento. Reformas são, ao fim, reajustes e redistribuição de renda produzida, e não geram renda nova, falta o motor do crescimento.

Acreditar que o mercado, por si só, resolva o problema do desemprego e do crescimento é uma fantasia. TODOS os grandes emergentes têm planos governamentais macroeconômicos através de políticas públicas e a política monetária é parte desse plano macro. Nenhum grande País, mesmo rico, confia cegamente no mercado para puxar a economia, nem os EUA e nem a União Europeia, muito menos China, Índia e Russia.

As políticas monetárias de quantitative easing na Europa, Japão e EUA são a fórmula proativa que se pratica para estimular o crescimento e evitar a recessão.

AUTOMÓVEL NÃO SAI DO LUGAR SEM COMBUSTÍVEL, ECONOMIA NÃO SAI DO LUGAR SEM DINHEIRO

Criar DEMANDA, algo que Keynes já sabia há 100 anos, é o único caminho para sair da recessão. Reformas não têm essa função.

Há espaço no Brasil para um plano de infraestrutura financiado pela emissão de R$2 trilhões de moeda, sem causar inflação, desde que espaçado em 4 anos, com gestão dia a dia. Há capacidade ociosa em ativos de produção e mão de obra para absorver demanda nova criada por moeda nova.

Mas para operar uma política de estímulos monetários é fundamental o MAESTRO para calibrar gota a gota o estímulo, um processo de ajuste diário entre a moeda estimulante, câmbio, produção e inflação, aquilo que Alan Greenspan fez no FED por duas décadas, não é por acaso que sua maior biografia tem o título de MAESTRO, é o controle do ajuste fino hora a hora entre moeda, produção e emprego, política fiscal e câmbio.

A FORMAÇÃO DO CONSENSO

Nos anos do regime militar de 1964, com poderosos Ministros da área economia, NUNCA UM SÓ, havia um mecanismo para gerar consenso e minimizar erros, o CONSELHO MONETÁRIO NACIONAL, com representação da produção, do sistema financeiro e do Governo, para se ter um olhar múltiplo sobre a política econômica, para evitar que um comandante sozinho afunde o navio porque ninguém lhe contesta. Nos EUA, igualmente, há um COUNCIL OF ECONOMIC ADVISERS, o Conselho dos Assessores Econômicos da Presidência para ter uma visão ALÉM do Secretário do Tesouro e do banco central, são economistas independentes de primeira linha que não fazem parte do Governo. Mesmo no Sistema da Reserva Federal, seu Conselho (Board) é composto por sete professores de economia de escolas diversas, para um só não errar sozinho, todos sistemas para evitar o comandante maluco afundando o navio por falta de contraponto, exatamente o erro que hoje estamos cometendo no Brasil com APOIO DO MERCADO e da MÍDIA.

Não há nessa não política um fiapo de olhar para os 180 milhões de pobres, miseráveis, desempregados. Ao contrário, todas as medidas levam a deles exigir mais sacrifícios do que já suportam, poupando os 30 milhões que estão razoavelmente bem no rentismo estatal de juros ou supersalários.

Na CRISE FISCAL HÁ UM MAR DE DESPERDÍCIOS, título de meu próximo artigo, corta-se para baixo e não para cima.

TERRA ARRASADA

No caminho que hoje segue, sem uma política econômica, o Brasil está rumando para o desastre social e financeiro, com ou sem recessão mundial. O debate econômico está suspenso pelos “economistas de mercado”, cuja bíblia, o BOLETIM FOCUS, é campeão mundial de erros de previsão, sempre erram para cima, na semana seguinte a realidade corrige o erro sem fim, gente correndo às cegas sem achar a porta de saída.

sexta-feira, 30 de agosto de 2019

Paris está em chamas




Na Segunda Guerra mundial, a França que era considerada o maior exército do mundo, foi derrotada e ocupada em tempo recorde, seja porque o exército nazista tinha desenvolvido uma técnica militar relâmpago, as famosas blitzkrieg, mas também por fatores internos.

Parte considerável das elites francesas da época, civis e militares, eram abertamente pró germânicas. De tal forma que, segundo historiadores, dividida, a capitulação do seu exército foi inevitável.

Sobrou a resistência contra a ocupação que se resumia a alguns poucos milhares de combatentes em território francês, clandestinos, imortalizados em livros e filmes, como o excelente “O exército das sombras”, e o documentário “A tristeza e a piedade”, formado por nacionalistas e comunistas.

O colaboracionismo das elites francesas foi tão explícito que Hitler “concedeu” à França um governo autônomo, o governo de Vichy, cuja capital ficava no sul do País.

Parece inacreditável, mas esse governo tinha inclusive um embaixador em Paris, ocupada militarmente pelas tropas nazistas. O Marquês de Brinon, um germanófilo incontestável.

No entanto, o general De Gaulle, com a nação derrotada, de forma humilhante, recusou-se a participar de tamanha farsa e fugiu, com algumas poucas divisões, para a Inglaterra e formou outra resistência que denominou o “governo francês no exílio”.

O que provocou constante irritação ao primeiro-ministro Churchill, porque ele desejava que os soldados franceses, e o seu general, fossem apenas mais uma legião de lutadores contra o nazismo, que vinham de todas as nações europeias ocupadas para a Inglaterra, que lutava bravamente contra a expansão militar de Hitler sob a liderança formidável do dirigente inglês, apesar de ser um conservador.

Se a Grã-Bretanha não estivesse sob o comando político de Churchill teria capitulado à ofensiva nazista. Sua bravura, coragem pessoal, capacidade política e oratória, fizeram com que o povo inglês, sob a sua liderança, aguentasse as maiores provações, com uma Londres submetida a bombardeios diuturnos, literalmente ardendo em chamas com dezenas de milhares de civis mortos sob as bombas da força aérea alemã.

Mas de Gaulle usava diariamente a rádio BBC de Londres, em nome do governo francês no exílio, contrariando o líder inglês, porque sabia que a França estava humilhada pela capitulação vergonhosa, e considerava que com a vitória dos Aliados o destino do seu País era imprevisível, poderia ser fatiado em, no mínimo, duas nações sob a supervisão dos Aliados vitoriosos.

Com a derrota do exército de ocupação alemão na França, e a libertação de Paris, exigida por De Gaulle, porque a capital francesa era um objetivo militar secundário na marcha para Berlim, o líder francês teve outra escaramuça com os comandantes aliados, e exigiu que as tropas francesas entrassem primeiro na capital e ele pessoalmente marchasse sob o Arco do Triunfo nos Campos Elísios, há exatos 75 anos, mostrando que, de colaboracionista, a França passava a libertar Paris ao lado dos aliados vitoriosos.

Finda a guerra com a derrota da Alemanha nazista, De Gaulle viu-se diante de uma França espatifada. Os resistentes que foram massacrados, torturados e mortos em grande número. Começou a revanche contra as centenas de milhares de colaboracionistas pró-nazistas. Era quase iminente uma guerra civil.

De Gaulle, com a autoridade conquistada, e pensando na França, declarou: todos foram resistentes, à exceção de minorias, as aberrações. Ele sabia que isso não era verdade, mas tinha que unir o povo francês e não o dividir irreversivelmente.

Com o “governo no exílio”, a entrada triunfal em Paris com suas tropas à frente nos Campos Elísios, e o mito de que “todos foram resistentes, à exceção de uma minoria”, de Gaulle praticamente refundou a França, que estava fraturada, humilhada, envergonhada ao mais baixo nível.

Foram três grandes gestos e iniciativas que o elevaram à condição de grande Estadista.

Por um acaso do destino, várias décadas após, anos 90, eu estava em Paris quando acompanhei pela televisão a mais alta condecoração francesa ao então comandante de ocupação alemão de Paris, general Von Choltitz, já muito velho.

Durante a retirada das tropas nazistas da capital francesa, frente ao avanço dos aliados, Hitler ordenou-lhe que implodisse totalmente Paris. O general alemão, mesmo com um telefonema de Hitler: “Paris está em chamas?”, disse que sim, mentindo.

De Gaulle, Estadista, refundou literalmente a grande nação francesa e a humanidade hoje deve a existência de Paris como patrimônio arquitetônico da humanidade, a um general alemão que desobedeceu a Hitler, assim como aos bravos combatentes da resistência francesa. A História nos ensina muitas coisas.

segunda-feira, 26 de agosto de 2019

Binarismo ideológico




Não é segredo para ninguém que o mundo, e o Brasil, vai mergulhando de cabeça em uma época de grande convulsão, que acarreta uma desorientação generalizada entre as pessoas, jamais vista na humanidade.

Essa onda de perplexidades, falta de rumos e projetos, reflete por um lado a existência de novos paradigmas nas sociedades a serem codificados, assim como situações manipuladas, a serviço de grandes potências globais, associadas aos interesses do capital financeiro especulativo global.

Dessa forma, o maniqueísmo no campo das ideias nada de braçadas, ditando o que é certo e o que é errado na grande mídia, redes sociais, fomentando polarizações furibundas, ondas inconciliáveis de grupos ativistas extremamente radicalizados, cujas ideias antagônicas encontram-se distantes da análise concreta da realidade concreta. São batalhas entre dogmas.

Conversando com uma lúcida, dileta amiga, ela me disse que não se contrapunha a certas formulações ou visões sobre os acontecimentos em curso, em grupos nas redes sociais, “para não causar rusgas” entre velhos conhecidos.

Chegamos à conclusão que na verdade não se tratavam de “rusgas” mas, o que existe é uma espécie de chantagem moral, beirando ao inquisitorial, já que o ponderador ou discordante, corre o risco de uma condenação, expurgo ou isolamento, seja a sua opinião correta ou não.

Muitos que lerem esse artigo vão concordar, silenciosamente, com essa afirmação, mas não vão externá-la em seus devidos aplicativos, nas redes sociais, por óbvias razões.

Grande parte, ou o total, dessa intolerância extremada vem das cadeias de mídias globais, associadas ao capital rentista internacional, cuja máxima é a quebra do sentido de unidade dos povos, de um clima saudável de convivência democrática, no confronto das ideias sob o prisma da tolerância na troca de opiniões.

Porque não pode, e não deve haver, cotejamento de opiniões, muito menos sociabilidade, razoavelmente cordial. Trata-se de um fenômeno mundial, não só no Brasil.

E na ausência de projetos, rumos, muitas forças políticas, grupos de ativistas, preferem adequar seus discursos ao que prevalece na grande mídia, abdicando do raciocínio crítico sobre os fenômenos em curso, seja por receio de execração, ou por esperteza com vistas a ser acolhido pelas “bolhas” decorrentes dessa guerra de cibernética de Quinta Geração, em pleno vigor.

Uma Guerra de Quinta Geração, que é bastante real, que vem servindo aos desígnios e interesses estratégicos das grandes potências, do capital financeiro especulativo, assim como a própria globalização financeira não é um fenômeno “neutro”, encontra-se associado a esses mesmos interesses.

O binarismo ideológico imposto ao Brasil, que se encontra muito extremado, serve a idênticos objetivos, e prolifera, especialmente, em meio aos estratos da classe média e entre os grupos sociais mais instruídos das elites urbanas, promove a fratura do tecido nacional, deixa à margem as grandes maiorias nativas, que procuram uma forma de sobrevivência em meio a uma onda de desemprego galopante.

Assim como desvia-se das mais graves ações do governo Bolsonaro, tais como as privatizações em massa do valioso patrimônio estatal brasileiro, a reforma da Previdência, cujas consequências serão dramáticas para a sociedade, para os segmentos médios, os trabalhadores, ou seja, a maioria dos 210 milhões dos brasileiros, além da sistemática e brutal criminalização da vida política etc.

É como diz o ditado popular: enquanto se agridem de um lado e do outro da rua, a exemplo dos identitaristas versus os conservadores fanáticos, a caravana do neoliberalismo radical da escola de Chicago, do governo, de Paulo Guedes, passa, quase, incólume. Com a nação dividida, fraturada, movida a fake news, ou notícias propositalmente parciais, com intenções óbvias e palpáveis.

Nesse quadro, é fundamental a união do povo brasileiro em torno de seus objetivos fundamentais, buscar com determinação aquilo que una as grandes maiorias, não o que as dividem.

Promover um projeto de nação para esse novo milênio conturbado e ameaçador, defender a nossa soberania, física e econômica, em um mundo globalizado, absolutamente sem regras, ferozmente competitivo.

Nunca foi tão atual a frase de Albert Einstein: “nenhum problema pode ser resolvido pelo mesmo estado de consciência que o criou. Para poder encontrar novas respostas, é necessário aprender a ver o mundo de uma maneira nova. É preciso ir mais longe”. Estamos diante dessa grave encruzilhada.

quarta-feira, 21 de agosto de 2019

O alvará da manicure e outras irrelevâncias do plano econômico inexistente, por Andre Motta Araujo

É uma loucura completa em qualquer País, rico ou pobre, achar que o mercado resolve todos os problemas econômicos, isso é uma fantasia louca.



O alvará da manicure e outras irrelevâncias do plano econômico inexistente
por Andre Motta Araujo


O neoliberalismo é uma máquina de transferência de renda dos mais pobres aos mais ricos. O neoliberalismo NUNCA FOI UM PLANO ECONÔMICO DE GOVERNO. O mercado é apenas um espaço que o Estado estabelece para atuação de agentes privados na troca de mercadorias e serviços, mas esse espaço não tem por obrigação criar um projeto de País, é apenas um espaço de trocas. É impossível um Governo atuar sem políticas públicas que coordenem o CONJUNTO das necessidades da população. O mercado não tem nem a obrigação e nem a capacidade de administrar essas necessidades e carências.

É uma loucura completa em qualquer País, rico ou pobre, achar que o mercado resolve todos os problemas econômicos, isso é uma fantasia louca.

Nos EUA, exemplo para tantos idiotas neoliberais, o Estado é o mais forte do mundo e opera por políticas públicas fortíssimas, O ESTADO GUIA A ECONOMIA.

Há um enorme Departamento do Trabalho, de nível ministerial, criado em 1913, com orçamento de 14 bilhões de dólares e 19.000 funcionários, algo que no Brasil extinguimos irresponsavelmente. Um Departamento de Energia que traça TODA A ESTRATÉGIA de petróleo dos EUA, criou o fracking, o projeto de exploração da rocha betuminosa, criou do zero uma política de etanol de milho com mega subsídios. Um poderoso e tradicional Departamento de Comércio, algo que também extinguimos no Brasil, com políticas de turismo, um banco para pequenas e médias empresas (Small Business Administration). O Escritório de Comércio Exterior (USTR) que cuida de tarifas e acordos comerciais.

São ESTATAIS nos EUA aeroportos, portos, rodovias, água e esgoto, usinas hidroelétricas (porque envolve água), trens de passageiros, metrôs, ônibus coletivos nas metrópoles, seguro rural, muito mais amplo que no Brasil, seguros de hipotecas para moradias (duas companhias), o banco de exportações (Eximbank), o banco para indústria naval (Maritime Commission), o banco para exportação de armas (Defense Security Cooperation Agency). Os Estados Unidos são administrados por POLÍTICAS PÚBLICAS e não pelo mercado, como pretendem os toscos ultra neoliberais brasileiros, o time da “PUC-Rio” e Casa das Garças.

Na crise de 2008, que desmontou o mercado e ameaçava quebrar os maiores bancos e seguradoras americanos, assim como a General Motors, foi o Tesouro que emitiu o cheque de US$ 708 bilhões que salvou todos.

O ESCAPISMO DO PLANO GUEDES

Agora os neoliberais cariocas (com raras exceções, os que comandam a economia são todos do Rio, o Estado mais falido do Brasil) apresentam como projeto de País providências ridículas, como dispensar de alvará cabeleireiros, manicures e botecos. Isso não tem nada a ver com crescimento. O Brasil teve o maior crescimento do mundo entre 1950 e 1980 com todos os alvarás e burocracias. Tudo pode ser melhorado, mas não é isso que faz crescer.

O mais poderoso automóvel não sai do lugar sem motor de arranque e este é o Estado, aqui, em Washington, em Berlim, em Pequim, em Nova Delhi.

A manicure que poder fazer as unhas sem alvará precisa, antes de mais nada, de CLIENTES e esses só existirão quando voltarem os empregos.

Os empregos dependem de indústria e infraestrutura, grandes compradores de indústria eram as ESTATAIS, uma vez vendidas tudo vai ser comprado nos países donos das empresas, é da lógica, o Brasil chegou a ser o maior fabricante de hidrogeradores do mundo (Siemens e Voith) para o grupo Eletrobras e de motores elétricos a prova de explosão para refinarias e plataformas de petróleo para a Petrobras (minha firma foi a primeira), as estatais PUXARAM o crescimento, agora 100% dos navios sonda e navios petroleiros são comprados na Ásia, para alegria dos neoliberais cariocas, fecharam os estaleiros nacionais e, por baixo, 60.000 empregos. Os EUA não cometeram esse erro, parte dos navios que compõe a frota americana tem que ser fabricados nos EUA.

OS NEOLIBERAIS NÃO TÊM A MINÍMA IDEIA SOBRE O FUTURO DA ECONOMIA BRASILEIRA

Não têm ideia, não têm projeto, não têm visão, não têm a mínima preocupação da URGÊNCIA das famílias sem renda, não se comovem com as 23.000 fábricas que fecharam nos últimos dois anos, das 270.000 lojas que enterraram sonhos de pequenos empresários, não são economistas de País, são operadores de mesa de câmbio e juros, e seu único tema é ”BRASIL VENDE TUDO”. Esse pessoal vai enterrar o futuro do Brasil.

quarta-feira, 31 de julho de 2019

A autocrítica




Em recente discurso publicado pelo La Vanguardia, o presidente da França Emmanuel Macron surpreendeu o mundo com as suas declarações, já que o atual principal mandatário francês foi um executivo, e apadrinhado nas eleições presidenciais pela Casa Rothschild, da banca financeira internacional (MSIA, junho 2019).

Disse Macron: se os graves desequilíbrios da globalização financeira não forem corrigidos, a atual fase do capitalismo não puser fim aos seus excessos, a responsabilidade social não voltar a ser prioridade, as democracias correrão sérios riscos, até mesmo de uma nova guerra.

E prossegue: creio que a crise que vivemos pode conduzir à guerra e à decomposição das democracias. O liberalismo econômico e a “economia social de Mercado” experimentam uma crise profunda.

Para ele, com a globalização e as mudanças tecnológicas, se impôs um modelo neoliberal e um capitalismo de acumulação que perverteu o sistema anterior, surgido após a Segunda Guerra mundial, e o funcionamento das sociedades.

Reconhece que os ajustes brutais na Europa incidiram sobre os assalariados que experimentam retrocessos jamais conhecidos em tempos de paz. E que “os nossos fracassos são os que alimentam os extremismos”. Porque “temos um sistema em que o progresso macroeconômico se constrói sobre desequilíbrios regionais”.

Segundo o presidente francês, tal sistema é cada vez menos liberal (ou seja, menos democrático) e menos social, quer dizer, alimenta-se das desigualdades nas sociedades, devido à primazia da acumulação de renda e do corporativismo, que é o do sistema financeiro, lembramos.

Segundo ele, as consequências políticas e sociais desse quadro são muito preocupantes, porque os cidadãos, ao não se sentirem partícipes do progresso, passam a questionar o sistema e rechaçá-lo abertamente, abrindo caminho para ideologias radicais, no caso, de extrema direita, e acrescentamos “aos demagogos”.

E alerta sobre a realidade francesa: está em vias de desmantelar-se o consenso profundo sobre o que a democracia, o progresso e as liberdades individuais construíram desde o século XVII no País. Podemos acrescentar, com segurança, em boa parte do mundo.

Macron está sentindo os efeitos da profunda e multilateral crise política, social que se abate sobre a França, onde multidões saem semanalmente às ruas com fúria, transformando a nação e Paris, em um verdadeiro palco de violentos confrontos sociais.

De qualquer maneira, por lucidez, esperteza ou estratégia política, Macron disse verdades incontornáveis, que refletem um sentimento geral que se alastra, sobre a perda de rumos da globalização dominada pela alta finança especulativa, compartilhada, inclusive, pelas elites institucionais, em boa parte do mundo.

No Brasil, seria fundamental que os que se batem pela defesa da nação e do povo brasileiro, os democratas, os progressistas, também fizessem um esforço conjunto em repensar um autêntico projeto de País.

Repelissem a polarização de ódios difusos que só fraturam a nação, que tem levado a política em modo contínuo irracional e induzido, inclusive através de vias externas ao País.

Que auxiliam o domínio do capital financeiro global rentista, facilitam a agenda obscurantista do governo Bolsonaro, a sua política neoliberal radical e privatista, o desmantelamento do Estado brasileiro.

domingo, 21 de julho de 2019

O Mundo Pós-Ocidental

Resenha do livro "O Mundo Pós-ocidental - Potências emergentes e a nova ordem global", de Oliver Stuenkel:

Por Eduardo Bomfim


O livro de Oliver Stuenkel, O mundo pós-ocidental, potências emergentes e a nova ordem global, é uma valiosa fonte de consultas e um convite ao exercício da reflexão sobre as atuais transformações em curso na geopolítica internacional, onde o Brasil se encontra objetivamente inserido.

Em meio a um turbilhão de contradições e conflitos políticos em que estamos metidos, sempre carregados de temor e desorientação generalizados, Oliver nos aponta as causas das transições globais que estão envolvendo o mundo e procura descrever o rumo estratégico dos fenômenos que dizem respeito às sociedades e aos indivíduos, mesmo que eles não tenham a necessária clareza daquilo em que estão envolvidos, e isso inclui os dirigentes dos Estados nacionais, como tem sido o caso do Brasil. Seja no presente ou no passado recente.

Porque, praticamente quase todos os estudos acadêmicos, políticos, culturais, em vigor, baseiam-se numa tradição ocidentocrêntica dominante, e imposta há muito tempo, o que nos impede de refletir, até mesmo sob o ângulo dos nossos próprios interesses nacionais, sobre quais seriam os caminhos indicados em uma nova ordem global, em plena transição multipolar.

Assim, estamos raciocinando sob a linha de pensamento anglófilo, ocidentocêntrico, europeu, norte-americano, até mesmo quando, em alguns momentos da nossa diplomacia e economia externa resolvemos agir pensando no protagonismo nacional, inclusive em décadas anteriores.

Especialmente hoje, na linha dogmática, quase religiosa, da política externa do atual governo do presidente Bolsonaro, que se incorpora plenamente na visão do excepcionalismo excludente norte-americano, do mundo ocidental, em uma espécie de visão ideológica salvacionista, messiânica.

Onde qualquer outro método de análise da realidade, e estratégias, seria incorrer em uma espécie de ameaça à ordem mundial pré-estabelecida, em suas próprias mentes, quando essa realidade em movimento já vem ultrapassando galopantemente o credo que o governo professa, mesmo quando essa alteração, objetivamente em curso, nos seja amplamente favorável como Estado e nação.

Em primeiro lugar, para Oliver Stuenkel, sempre houve o mito de que o mundo teve a primazia do pensamento, da economia e da diplomacia puramente ocidentais, negando, ou desconhecendo as interpenetrações de outras culturas que agiram no desenvolvimento, inclusive científico, das grandes ondas e transformações nas sociedades.

Nos últimos mil anos, a difusão das ideias ao longo da História foi muito mais dinâmica, pluridirecional e descentralizada do que costumamos imaginar. Mas o que prevalece é uma visão anglófila da História, as relativizações das contribuições de outros povos, ou mesmo a negação, o desconhecimento das contribuições globais de outras civilizações.

Por exemplo, inúmeros conhecimentos importantes, fundamentais adquiridos, surgiram de normas, tecnologias, ideias, de outras fontes estrangeiras, não ocidentocêntricas, como da China, Índia, África e do mundo muçulmano, para se desenvolver, para florescer econômica e politicamente.

No entanto, é verdade que o idealismo e o excepcionalismo norte-americano foram fundamentais na construção da atual nova ordem internacional. Mas, os principais pensadores e acadêmicos nas relações internacionais, estabelecidos nos Estados Unidos, imaginam que o mundo entregou voluntariamente as rédeas do poder a Washington, negligenciando a distinção entre legitimidade e coerção, como fatores na consolidação da atual ordem liberal, exatamente como em qualquer sistema anterior.

Esse processo, de construção da Ordem liberal internacional, envolveu estacionar tropas norte-americanas nas potências derrotadas do Eixo na Segunda Guerra mundial; ameaças contra comunistas na França e na Itália, derrubada de governos recalcitrantes na América Latina, na África e na Ásia, esforços sistemáticos para impor as preferências políticas, ideológicas, culturais e econômicas em todo o mundo, nos lembra Oliver.

A leitura ocidentrocêntica e seletiva da História leva a uma superenfatização em agendas e atratividade cultural ocidentais, e minimiza o papel decisivo do poderio militar na criação e manutenção dessa Ordem global, afirma Oliver.

Muitos acontecimentos importantes ocorreram fora da Europa ao longo de toda História, como aqueles que ergueram e sustentaram o império Chinês, o Otomano e o Mongol. Assim como as regras de tolerância religiosa construídas na Índia no século XVI, sob a liderança do imperador mogol Akbar. A rebelião anticolonial haitiana no começo do século XIX, que inspirou escravos em todas as Américas, foi o evento mais importante na História dos Direitos Humanos, pois defendeu, diferentemente da Revolução Francesa, direitos iguais para toda a população, afirma Oliver.

Na verdade, o ocidentrocentrismo avoca para si vários fenômenos, episódios e valores que aconteceram em outros lugares, ou simultaneamente em muitas regiões.

É com esse viés receoso, oblíquo, que alguns estudiosos, acadêmicos, geopolíticos consideram a emergência de um mundo pós-ocidental, as relações Sul-Sul, a ascensão estratégica dos BRICS. Como se essa fosse uma Ordem Global caótica, desorientadora e perigosa.

Em primeiro lugar, porque ela sucede à hegemonia unipolar dos Estados Unidos após a Guerra Fria.

Depois, porque incorpora ao mundo ocidentocêntrico, novas e multilaterais formas de abordagens econômicas, sociais, comerciais, culturais e políticas, que já estão convivendo, lado a lado, com o pensamento ocidental anglo-europeu.

Stuenkel se aprofunda nesses fenômenos com densa análise acadêmica e geopolítica. Considera os BRICS como um fato estratégico, não um arranjo casual, ou uma sopa de letrinhas na moda, a China como uma potência econômica, comercial irreversível e preponderante, que veio para ficar.

É bem diferente do liberalismo global ocidentocêntrico com suas duas faces; nacionalismo liberal quando se trata dos seus interesses, e internacionalista imperial quando às expensas dos não ocidentais. Uma contradição endógena que sempre carrega ao longo dos tempos.

Um argumento que a práxis do cosmopolitismo liberal, convencida de que o espaço internacional é deles, e que precisa convencer as poucas sociedades atrasadas remanescentes no mundo, mas que, no entanto, se apoia na distribuição desigual, e não poucas vezes utiliza-se das práticas depredatórias do imperialismo do século XIX. Isso é o que se chama de Governança Global na atualidade.

Diz Oliver: todos os povos desenvolvem e sustentam seus próprios mitos sobre a história fundadora da sua tribo, nação ou civilização. Um dos elementos importantes desse mito diz respeito ao porquê de o grupo ser único e porque merece um lugar especial na História global. Como qualquer outra civilização, o Ocidente também incorreu no espírito forte de um excepcionalismo, nesse caso, excludente.

O sucesso econômico e militar da Europa fez com que os intelectuais europeus não esperassem nada menos que o domínio permanente do mundo, incluindo aí “uma missão civilizadora e cultural do resto da humanidade”.

A observação crítica no livro de Oliver Stuenkel não exclui também os teóricos marxistas europeus: como Marx, Hegel chamava a China de “semicivilização em putrefação” e, a não ser que o Ocidente lhes levasse o progresso, a Índia e a China estavam condenadas a permanecer numa “existência vegetativa perpétua e natural”.

Com efeito, o advento da Revolução Industrial e os primórdios do colonialismo europeu na Ásia pareceram criar uma narrativa tão irresistível que a maioria dos intelectuais se deixou seduzir pela noção de que o Ocidente havia fundado uma verdade universal e uma obrigação moral de guiar o resto do mundo, afirma Oliver.

Desenvolveu-se um sentido exacerbado de singularidade. Nesse processo Histórico, o pensamento liberal foi basicamente moldado pela relação desigual entre a Europa e o resto do mundo. O desejo de diálogo construtivo entre civilizações e de aprendizado mútuo, tão apreciado por pensadores anteriores, foi eclipsado pela soberba.

Assim, o ocidentocentrismo contribuiu para uma compreensão muito particular da História global, que Blaut chamou de “História tutelada”. Isso é comum hoje na América Latina, na África e em muitas partes da Ásia, onde a História da Europa é vista como muito mais importante que a de outras partes do Sul global. Uma dinâmica que Amartya Sen chamou de “a dialética da mente colonizada”.

Foi precisamente este padrão global que levou à situação extraordinária de hoje, na qual Países no Sul Global não sabem praticamente nada uns sobre os outros e, se o sabem, o conhecimento que possuem vem de brasileiros e sul-africanos que querem aprender mais sobre a China, por exemplo.

Mas o sentimento dominante atual quanto à ascensão protagonista da China, na Europa como nos Estados Unidos, é de medo, e os analistas costumam advertir que o avanço da China “eclipsará” o sol do iluminismo ocidental, que será apagado pela dominação econômica da China e por uma sombra que irá cobrir o mundo ocidental.

Um fenômeno semelhante pôde ser observado: o fim da Guerra fria levou pensadores nos Estados Unidos a se perguntarem se o fim da História tinha chegado, convenientemente, justo no momento da inigualada hegemonia dos Estados Unidos.

Mas Oliver considera que a ascensão do multilateralismo global competitivo, no lugar de um mundo unipolar, como um fenômeno objetivo, especialmente com as novas fronteiras comerciais e econômicas que vão sendo abertas pela China, veio para ficar. Onde as relações Sul-Sul vão compartilhar a nova geopolítica junto aos demais atores globais, já existentes.

Não se pode afirmar que essa nova realidade em curso, e suas decorrências, não vão ocorrer sem a ausência de conflitos ou confrontos de intensidade razoável.

Mas os fatos estão a indicar que o crescente aumento da geopolítica multilateralista, o protagonismo Sul-Sul, não estão se dando pela política da canhoneira, como ocorreu, ainda continua ocorrendo, com a hegemonia ocidentrocêntrica, e em particular com o sol poente do excepcionalismo estadunidense.

Ao contrário, a marca do multilateralismo vem se constituindo através do crescimento econômico, comercial e diplomático. Não lhe apraz, ou lhe é contraproducente, a via do confronto aberto, da hostilidade afrontosa, da guerra militar de conquista.

A verdade é que o mundo caminha a passos largos para o multilateralismo geopolítico. E se não se avizinha um mar de rosas, com certeza não será mais um capítulo da supremacia cultural, econômica, política, imposta através da intimidação militar, ou da hegemonia ideológica, do mito supremacista dos tempos atuais. Vale a pena conferir o livro de Oliver Stuenkel: O mundo pós-ocidental, potências emergentes e a nova ordem global.

sexta-feira, 19 de julho de 2019

O Marquês de Brinon, Embaixador da França em Paris, por Andre Motta Araujo

O Embaixador de Brinon se encaixava no modelo de um embaixador que se amoldava aos interesses do governo onde era acreditado e não servia ao interesse do governo que teoricamente representava.


O Marquês de Brinon, Embaixador da França em Paris
por Andre Motta Araujo


Com a derrota da França em Junho de 1940, a rendição formalizou-se pelo Segundo Armistício de Compiegne, pelo qual o território francês foi dividido em dois: o Norte sob protetorado alemão, chamado de ADMINISTRAÇÃO MILITAR ALEMÃ EM FRANÇA com sede em Paris, e o Sul como ESTADO FRANCÊS, com sede na cidade de Vichy, sem presença de tropas alemãs e todos os atributos de um Estado soberano.

O Chefe de Estado era o Marechal Petain e o Primeiro Ministro Pierre Laval. A Marinha de Vichy era a segunda da Europa, após a britânica, a rendição não incluiu a Marinha, que continuou sob controle do Governo de Vichy e sob comando do mítico Almirante Darlan. Continuaram sob controle do Governo de Vichy as colônias francesas na África, Argélia, Marrocos, Tunísia, Senegal, Costa do Marfim e Chade.

O Governo de Vichy recebia embaixadores de outros países, os Estados Unidos tinham em Vichy seu Embaixador até 1944, o Almirante Lehay, amigo pessoal do Presidente Roosevelt, por sua vez o Governo de Vichy tinha embaixadores em outros países, como o Brasil. Vichy, até a invasão americana da África do Norte francesa em 1942, era um Estado ficcional, mas legal, com os aparatos de um Estado soberano em seu território.

Nada mais ficcional, mas protocolarmente legal, que a nomeação por Vichy de um Embaixador junto ao um Governo estrangeiro, a Administração Militar Alemã em Paris, entidade governamental separada do Terceiro Reich, cujo titular era o General Otto von Stulpnagel. Petain e Laval selecionaram um nome especial para representar Vichy em Paris, cujas credenciais eram ser muito amigo dos alemães, o Marques de Brinon, personagem que, desde 1937, circulava na corte do fulgurante Embaixador da Alemanha nazista, Otto Abetz. Já publiquei aqui no blog artigo sobre Otto Abetz, figura chave na preparação do colaboracionismo prévio à invasão alemã e que explica a fácil vitória militar nazista em 1940.

Fernand de Brinon era apenas uma das figuras sinistras que vendiam a França aos nazistas, um ciclo que a história da França tenta esquecer.

O Embaixador de Brinon se encaixava no modelo de um embaixador que se amoldava aos interesses do governo onde era acreditado e não servia ao interesse do governo que teoricamente representava. Ele era “amigo dos alemães” e não fiel à França. Ora, ser “amigo” do governo onde deveria representar o interesse francês não era uma qualidade para um Embaixador, era uma desqualificação. Um Embaixador deve ser só fiel ao Estado que representa e não “amigo” do poder onde serve, seria como um advogado ser amigo da parte contraria, perante a qual deve ser oponente.

De Brinon não era o único personagem das trevas nesse cenário confuso preparatório da Segunda Guerra Mundial, ambiente propício aos crimes de lesa pátria quando as lealdades se confundem com “amizades suspeitas”.

Outros traidores a seus países apareceram como personagens das trevas.

Vidkun Quisling na Noruega virou Primeiro Ministro a serviço dos alemães, Leon Degrelle na Bélgica, Anton Pavlic na Croácia, traidores apareceram na Ucrânia e na Hungria, mas a França foi especial pela extensão e pluralidade de um colaboracionismo vergonhoso a serviço do ocupante, um processo que envolveu parte considerável da elite francesa.

Sir Neville Henderson, Embaixador britânico em Berlin até a declaração de guerra de 3 de setembro de 1939, era amigo demais dos nazistas, a tal ponto que contribuiu para a eclosão da guerra, ao viciar seus relatórios com informes enganosos sobre as intenções nazistas, era mais amigo dos alemães do que do Foreing Office onde reinava seu protetor, o também germanófilo Lord Halifax. Por suas amizades perigosas com os nazistas, Churchill carimbou Henderson com a expressão precisa “um homem nefasto”. Ser muito amigo do governo onde está acreditado não é uma vantagem para um Embaixador, é uma desqualificação, porque no limite esse diplomata vai mais ser útil ao governo anfitrião do que ao seu próprio governo. A diplomacia tem como premissa a defesa intransigente dos interesses do Estado representado e não a simpatia pelo País anfitrião, porque os interesses podem ser e são conflitantes, cada qual defende o seu.

De Brinon, como Quisling, Degrelle e os demais pró-nazistas traidores de seus países foram condenados depois da guerra à pena de morte por crime de lesa pátria a serviço de uma potência estrangeira, pena capital universal.

De Brinon foi executado por fuzilamento na prisão de Fresnes em Paris em 15 de abril de 1947 após sentença inapelável de um tribunal francês.

Mesmo nos grandes conflitos o mundo funciona por códigos atemporais, os Estados tem interesses geopolíticos a longo prazo ao correr da História, aliados em um ciclo podem ser adversários no ciclo seguinte e as lealdades se dão por raízes profundas que nada tem a ver com ideologia ou simpatia amizades ou camaradagem, Estados são entes atemporais e vida própria destacada de seus “governos de ocasião”, expressão clássica citada pelo General De Gaulle para se referir ao governo de Vichy no seu primeiro discurso após a espetacular fuga do solo francês para estabelecer um governo no exílio em Londres sob o nome de França Livre.

De Brinon e o colaboracionismo são desvios que a História coloca no arquivo morto, mas que devem ser lembrados como registro da complexidade que o tempo político pode produzir.

sexta-feira, 5 de julho de 2019

Desemprego é o fracasso cruel do neoliberalismo brasileiro, por André Motta Araújo

O neoliberalismo vai destruir o próprio Estado onde esses economistas ganham dinheiro, embora boa parte não more mais no Brasil.


Desemprego é o fracasso cruel do neoliberalismo brasileiro
por André Motta Araújo

Política econômica se avalia pelo saldo entre custos e resultados. Por esse critério, a política econômica neoliberal que veio no pacote do PLANO REAL foi um desastre histórico na trajetória do Brasil como nação. Nunca antes se viram tantos pobres, miseráveis, desassistidos e desesperados no conjunto da população, como se vê hoje nas ruas das grandes, médias e pequenas cidades brasileiras, milhões de jovens cujo único futuro é ser entregador de pizza ou bandido, sem que a parcela da população que se isola em ilhas de vida confortável se perturbe com os miseráveis à sua volta.

A política econômica neoliberal com epicentro no Rio de Janeiro trouxe no seu conjunto as seguintes consequências:

1.DOMÍNIO DO BANCO CENTRAL PELO MERCADO FINANCEIRO

Domínio explícito demonstrado pela sistemática indicação de personagens do mercado financeiro para suas diretorias. Para confirmar o domínio do chamado BOLETIM FOCUS, onde a autoridade monetária recolhe a média das previsões dos economistas do mercado financeiro para orientar suas políticas.

A consequência é de que o Banco Central NÃO LIDERA O MERCADO, É LIDERADO POR ELE e todas as suas políticas não se endereçam aos interesses do País e do Estado nacional e sim aos interesses do mercado financeiro, desde a taxa Selic, à política cambial, à política de crédito, ao estimulo à concentração bancária.

2.PROTEÇÃO DOS ATIVOS FINANCEIROS À CUSTA DO CRESCIMENTO

O instrumento é o mecanismo de "METAS DE INFLAÇÃO” onde se privilegia A QUALQUER CUSTO SEM CRESCIMENTO a manutenção do valor dos ativos financeiros que consomem a maior parte do Orçamento da União, em pagamento de juros e seguros cambiais, variáveis que mantém constante em dólar os ativos do sistema financeiro em Reais, algo como R$ 8 trilhões, para o que o PAÍS NÃO DEVE CRESCER, porque o crescimento necessita de moeda nova e pode trazer o risco de desvalorizar a moeda velha detida pelo sistema financeiro. Para tal roteiro o Estado deve liquidar o BNDES e privatizar o que resta de suas estatais, a qualquer preço, no todo ou vendendo aos pedaços, como se faz hoje com a PETROBRAS, empobrecendo o Estado e o País e transferindo para o estrangeiro o controle da política nacional de energia e infraestrutura, criando o paradoxo de ser hoje de capital estrangeiro grande parte da indústria, energia, infraestrutura e mineração do País, enquanto os ricos brasileiros investem no exterior seus recursos, hoje brasileiros tem US$400 bilhões de dólares fora do País, recursos gerados no Brasil e transferidos para o exterior, um contrassenso que mostra ao que o neoliberalismo pode levar.

3.A PARALISIA DO CRESCIMENTO FEZ ESTAGNAR A ARRECADAÇÃO E COM ISSO A DETERIORAÇÃO DOS SERVIÇOS PÚBLICOS

Os serviços públicos essenciais de SAÚDE, EDUCAÇÃO, SANEAMENTO E APOIO SOCIAL AOS MUITO POBRES estão em fase acelerada de desmonte por falta de recursos, porque sem crescimento cai a arrecadação de impostos e continuam crescendo os custos de funcionamento da União, Estados e Municípios.

O sistema público de saúde está se arruinando em velocidade acelerada, as filas do SUS aumentaram muito, o nível de educação nunca foi tão baixo.

4.DESMONTE DAS POLÍTICAS PÚBLICAS PARA INDÚSTRIA, INFRAESTRUTURA, MEIO AMBIENTE, ENERGIA, TRABALHO, DEFESA, PESQUISA E CULTURA

Na visão neoliberal, políticas públicas nem devem existir porque o mercado tudo resolve. O raciocínio é falso. Nos EUA, centro da ideia de economia de mercado, o Estado tem fortíssima presença em todas as políticas públicas, os Departamentos de Trabalho e de Energia tem vastos orçamentos, a pesquisa é fortemente incentivada pelo Estado, há 11.000 estatais sob formas e denominações diversas como AUTHORITY ou BOARD que cuidam de saneamento, aeroportos, portos, rodovias, metrôs, ônibus municipais, seguros de hipotecas para moradias populares, trens de passageiros, rodovias, tudo ESTATAL.

Na Europa os sistemas de seguro saúde, educação, meio ambiente, energia, cultura, são largamente estatais, o Estado assistencial é fortemente presente, mesmo em países de economias ricas como Alemanha, países nórdicos, França, Suíça e Reino Unido.

O “neoliberalismo de exportação” que o Brasil assumiu, MESMO NOS GOVERNOS PETISTAS, foi repudiado em todo o mundo civilizado mais avançado, os países emergentes que mais crescem, como China e Índia, têm economias de planejamento sob Estados fortes e não Estados desmontados como no Brasil, onde apesar da carga fiscal ser altíssima, não tem Estado forte, o grosso da arrecadação de impostos se destina a juros da dívida pública e largos benefícios a corporações de funcionários públicos, que consomem salários e vantagens irreais e incompatíveis com a economia do País.

Não existe NENHUMA POSSIBILIDADE do Brasil voltar a crescer com um neoliberalismo tosco, provinciano, sem visão de Estado, voltado exclusivamente para o rentismo de pequena parte da população, enquanto 90% dos brasileiros veem sua qualidade de vida, e até de sobrevivência, se deteriorar ano a ano.

É impressionante que boa parte da elite brasileira não perceba o desastre visível, a olho nu, de uma política neoliberal para País pobre como algo inviável historicamente. Vargas, Juscelino, os governos militares perceberam isso, o governo FHC desprezou essa noção da realidade e criou a democracia dos banqueiros como se isso fosse o futuro do Brasil, hoje a REPÚBLICA DO FINANCISMO empobrece o País como um todo, embora alguns se saiam bem, hoje o Estado brasileiro e o conjunto da população brasileira é MAIS POBRE DO QUE HÁ DEZ ANOS, o País está empobrecendo sob o neoliberalismo.

UMA ESCOLA PRIMITIVA DE PENSAMENTO ECONÔMICO

A “Escola do Rio”, nome que dei ao pensamento neoliberal brasileiro da década de 90 (e título de meu livro sobre esse tema) é uma escola POBRE E SIMPLISTA de pensamento econômico, sem elaboração, sem renovação, sem imaginação, mera importação de meia dúzia de mantras de Madame Thatcher, que já foi post mortem suficientemente demolida no seu próprio País.

Hoje, o neoliberalismo de Mrs.Thatcher é algo maldito no Reino Unido, nas suas raízes estão a decadência industrial da Inglaterra, que levaram o País ao BREXIT. Mas, no Brasil dos “economistas de mercado”, esses dogmas continuam vivos por falta de inimigos naturais sem que seus propagandistas percebam que SEM ESTADO NÃO HÁ PAÍS SÓLIDO e, ao fim, o neoliberalismo vai destruir o próprio Estado onde esses economistas ganham dinheiro, embora boa parte não more mais no Brasil.

Um pais convulsionado pela miséria que o neoliberalismo criou vai tornar inviável os negócios dos neoliberais. Um País é um conjunto de pessoas e coletividades, não é só um mercado de câmbio e ações.

quinta-feira, 20 de junho de 2019

O progressista de ontem e o do amanhã

Resenha do livro "O progressista de ontem e o do amanhã", de Mark Lilla, publicada no portal Bonifácio, www.bonifacio.net.br:




Lutas identitárias trocam projeto político geral por evangelização de grupos

Eduardo Bomfim - 18/06/2019

Ao se ler o livro O progressista de ontem e o do amanhã do cientista político Mark Lilla, escrito após a vitória de Donald Trump, tem-se a certeza de que os seus argumentos e análises referem-se igualmente ao recente processo eleitoral realizado no Brasil, quase que literalmente.

Assim é que por aqui também parece existir a polarização entre os partidos Democrata e Republicano dos Estados Unidos, especialmente o confronto das políticas identitárias fomentadas desde os anos 80, sob a hegemonia do clã dos Clintons, apoiadas pelas estratégias dos grandes especuladores financeiros do tipo George Soros e outros, versus uma outra casta de financistas aliada ao presidente Trump.

Os democratas norte-americanos, afirma Mark Lilla, teriam abandonado as grandes linhas de administração e políticas que falavam para o conjunto da nação e assumiram a orientação multiculturalista de parcelas da sociedade, que passaram a condenar as grandes maiorias sociais por injustiças cometidas às chamadas minorias.

Abandonaram “a ideia e a visão central da nação, do sentimento de solidariedade, do espírito de oportunidade para todos e do dever público, perdendo o sentido do que compartilhamos como cidadãos e do que nos une como nação”, afirma Lilla.

Nos anos 60, prossegue, a luta pelos Direitos Civis significava a batalha de grandes grupos de pessoas em defesa dos direitos das mulheres, contra o racismo, pelo reconhecimento efetivo das minorias, que tinha a simpatia e adesão entusiasmada das grandes maiorias sociais.

Mas nos anos 80, continua o cientista político norte-americano, essa política cedeu lugar a uma pseudopolítica de autoestima e de autodefinição cada vez mais estreita, autocentrada e excludente, promovendo sucessivas fragmentações internas, visões tribais, e, por óbvio, a condenação das grandes maiorias que não pertenciam às especificidades classificadas, que seriam responsáveis pelas alegadas injustiças históricas, fazendo voltar-se a juventude para a própria interioridade e praticamente condenando o mundo exterior não pertencente aos grupos identitários.

Assim, o identitarismo passou a ser visto pelas maiorias sociais como uma doutrina professada basicamente por determinados setores das elites urbanas instruídas, sem contato com o resto do país, cujos esforços se resumem em zelar e alimentar movimentos hipersensíveis, que dissipam, em vez de concentrar, as energias da sociedade como um todo.

O identitarismo, ao contrário de negar as agendas do neoliberalismo radical, reforça-o, afirma Lilla, porque reduz o espírito da comunidade nacional ao indivíduo, ao grupo. Em consequência, o identitarismo deixou de ser um projeto político relevante e se metamorfoseou num programa de evangelização.

Espertamente, Donald Trump tirou proveito da crise estrutural, da desindustrialização que vivem os EUA e pôs a culpa nos democratas, sob a orientação do estrategista e marqueteiro Steve Bannon. O mesmo que atuou nas eleições no Brasil.

As políticas identitárias atuais dos democratas e o discurso demagógico, chauvinista da ala direita republicana de Donald Trump representam um dos tempos mais medíocres da história dos Estados Unidos.

De tal forma é a influência dessas duas correntes em disputa nos EUA, aqui no Brasil, que jornalistas e analistas afirmam que os blogs, portais, a grande mídia e o mundo da política nativa encontram-se cada vez mais alinhados e semelhantes à linha dos democratas e republicanos norte-americanos.

Exatamente nas coisas eivadas de uma carga ideologizada fora da realidade, que serve a interesses que promovem a desunião do povo brasileiro tais como uma antropologia binária, que não é a nossa formação histórica policrômica, mestiça, a nossa visão de um Estado laico, a tradição do culto de sincretismos religiosos tradicionais celebrados em muitas manifestações populares como as afro-católicas, por exemplo.

Assim como o alinhamento a um neoliberalismo extremado da Escola de Chicago que já não é praticado nem nos EUA, onde se pauta a independência do Banco Central, mas não o dos EUA, eufemismo para doação do nosso BC às finanças globais, uma reforma da Previdência Social que privilegia o sistema financeiro, penaliza a classe média e os pobres, privatização de empresas estatais estratégicas, etc., etc.

A política externa é alinhada, com as tintas de religiosidade puritana, à visão supremacista do governo Trump.

Desvia-se da tradição multilateralista do Itamaraty na mediação diplomática e dos nossos objetivos nacionais, abrindo mão da liderança regional hemisférica, cujas consequências têm sido a crescente presença geomilitar da Rússia, a comercial da China, na região perigosamente conflituosa como a Venezuela.

Resultado do vácuo que vai sendo deixado pela ausência de uma diplomacia estratégica eficiente, mediadora e propositiva.

Essas potências estão jogando o jogo delas, o Brasil é que está abrindo mão do seu papel histórico.

Já setores de “esquerda” insistem nesse discurso identitário, que a levou a uma derrota eleitoral “acachapante” e plebiscitária, cuja matriz é patrocinada por megaespeculadores como George Soros e ONGs que atuam no mundo visando desestabilizar, fraturar os povos.

É surreal a existência de 800 mil ONGs atuando alegremente no País, muitas delas contrárias à nossa soberania, desenvolvimento econômico, associadas a países que sabotam o nosso protagonismo internacional.

São pertinentes várias observações feitas por Mark Lilla. E diante desse caldo tóxico de ódios, intolerâncias mil, “guerras ideológicas”, da pós-verdade onde o que menos vale é a análise concreta da realidade concreta, a racionalidade, é aconselhável ficar com os princípios indeclináveis em defesa da nação, do espírito progressista, das liberdades democráticas.