sábado, 27 de outubro de 2012

Como um bom vinho

Meu artigo publicado na Gazeta de Alagoas, no Vermelho, na Tribuna do Sertão, no Almanaque Alagoas, no Tribuna do Agreste e no Santana Oxente:


A Era dos Extremos é um clássico de Eric Hobsbawm, em meio a uma extraordinária produção intelectual, que a distância temporal de quase vinte anos longe de esmaecer as suas principais conclusões fortalece-as, mesmo que se possa ter, aqui e ali, diferenças com suas análises.

Trata-se de um balanço multilateral, ricamente detalhado do século XX, apresenta sinalizações sobre o início do terceiro milênio ou ao menos acerca da sua primeira década que todos nós vivenciamos.

De formação marxista Hobsbawm tornou-se intelectual respeitado, com a sua erudição, profundidade, sobriedade e estilo elegante, para além daqueles que não se incorporam à sua corrente de pensamento.

Sua obra ultrapassa o sentido da História formal, tem fundamentos na economia, na sociologia, nos fenômenos estruturais, ideológicos, da humanidade.

Em O Breve Século XX o falecido autor tece várias conclusões, entre elas "que essa foi, paradoxalmente, uma época que se assentava na defesa dos benefícios para a humanidade, do progresso material sustentado pelos avanços da ciência e tecnologia", mas o seu ocaso revelou "a rejeição desse progresso por correntes que se pretendem representantes do pensamento ocidental como os apologistas do crescimento zero ou quase zero, em solução à crise ambiental".

Afirmou que essa seria uma das contradições do século XXI (além do mundo unipolar, a persistente centralização, concentração do capital, o monopólio, controle planetário da informação) especialmente entre setores abastados e médios do primeiro mundo, empresários do florescente capitalismo verde e os contingentes populacionais do terceiro mundo onde reside a grande maioria dos habitantes do planeta.

Ao refletir sobre o início do novo milênio, o historiador indica o surgimento de "estranhos apelos em favor de uma sociedade civil e de grupos, inespecíficos, não restando por aí outra maneira de entender as identidades das sociedades e grupos, senão através da exclusão" das demais pessoas, tornando irrelevantes os conceitos de classes sociais.

Como cientista Hobsbawm não era pessimista nem otimista, fundava seus estudos na análise rigorosa da realidade, utilizando sempre a dialética marxista, que ele entendia ser o instrumental para a abordagem dos fenômenos sociais, históricos. A vida demonstrou que as suas observações são como um bom vinho, quanto mais o tempo passa, melhores.

sábado, 20 de outubro de 2012

O avesso

Meu artigo publicado na Gazeta de Alagoas, no Vermelho, na Tribuna do Sertão, no Almanaque Alagoas, no Tribuna do Agreste e no Santana Oxente:


Nunca é demais retornar ao tema sobre a desordem financeira mundial, o controle sobre a informação, o monopólio ideológico do capital globalizado através de um poderoso aparato midiático internacional, a cooptação de organismos internacionais, antes instituições razoavelmente representativas para dirimir conflitos, desavenças entre a comunidade das nações.

Mesmo com o surgimento de uma outra geopolítica mundial através de novos atores como os BRICS, Brasil, Rússia, China, Índia e África do Sul, o que permanece determinante, por enquanto, é mesmo a velha "nova ordem mundial" substrato de um poder mundial unipolar resultante da desintegração da URSS lá pelos idos do final da década de oitenta.

O que existe é uma resistência ascendente em contraponto às condições onde ainda predomina o mando desse capital financeiro globalizado cujo braço armado encontra-se sob a chancela da máquina de guerra norte-americana e aliados satélites.

Produzindo agressões contra a autodeterminação das nações, contabilizando em poucos anos centenas de milhares de mortos, outro tanto igual de feridos, mutilados, milhões de refugiados, muitos deles vegetando em acampamentos fétidos.

Assim o neoliberalismo fecundou uma anarquia planetária, a insegurança coletiva, individual, uma espiral de violência, medo, ódio, caos, reação, barbárie, um tipo de civilização claramente regressiva.

Já as lutas históricas das sociedades pelos direitos humanos, meio ambiente, liberdades democráticas, de religião etc, são espoliadas pelo ubíquo controle ideológico do capital financeiro e EUA, usadas como pretextos às intervenções armadas, anexações territoriais.

Eles ressurgem, inescrupulosamente, como paladinos desses imprescritíveis reclamos da humanidade ao tempo que buscam destruir formas universais de lutas das organizações populares, decisivas aos combates pela soberania, emancipação social, travados sob condições trágicas em muitos Países, absolutamente incontornáveis em outros, como o Brasil.

Desejam assim inverter a equação, pondo-a de cabeça para baixo, uma espécie do avesso do que realmente pretendem, impor ao Brasil sua própria agenda política, exigindo muita lucidez das várias correntes em luta para, junto ao trato da diversidade nas questões sociais, erguer bem alto a defesa da unidade popular, fundamental em um País que ainda é muito desigual, com a soberania sob ameaças.

sexta-feira, 12 de outubro de 2012

Ideologia da nova ordem

Meu artigo publicado na Gazeta de Alagoas, no Vermelho, na Tribuna do Sertão, no Almanaque Alagoas, no Tribuna do Agreste e no Santana Oxente:

Insubordinação do povo grego contra a desordem econômica mundial

Nesses últimos anos tem havido uma intensificação de opiniões, manifestações e de repulsa à atividade política em escala mundial, uma tendência agressiva, virulenta mesmo, com o objetivo de afastar o cidadão comum do engajamento nas causas transformadoras da realidade em que ele vive.

Um discurso falso - a política sempre determinou os rumos das sociedades em todas as épocas -, doloso porque está associado aos interesses de impedir a participação popular através de restrições democráticas, consolidando mais ainda o monopólio político, ideológico, nas mãos de reduzidos, poderosos grupos com capacidade decisória de abrangência global.

A perda relativa de autonomia dos Estados Nacionais submetidos às regras de organismos internacionais, antes razoavelmente representativas do equilíbrio internacional entre os Países, age como complemento a essa hegemonia e tem o mesmo fim, ou seja, a extraordinária concentração, centralização do capital financeiro a nível internacional.

Esse monopólio do poder, intimidação, dissuasão e intervenção, encontra-se associado à maior máquina de guerra que a humanidade já conheceu, coordenada pelos Estados Unidos da América, além de um fabuloso aparato midiático que controla a informação mundial, dissemina comportamentos, criminaliza opositores.

Assim, como em uma alquimia ideológica maligna, reivindicações generosas, auto-justificáveis, que sempre representaram anseios dos povos, nações, agora são usadas como justificativas de intervenção militar, estratégias para ambicionadas anexações territoriais como é o caso da Amazônia brasileira.

Por outro lado, a desconstrução da atividade política através da ideia de que "acreditar em mudar a vida da sociedade, e dos outros, não possui qualquer relevância para a sua própria vida", é um dos maiores venenos inoculados pela hegemonia neoliberal global.

Produzindo um individualismo doentio, enfraquecimento da solidariedade social, apostasia ideológica, o consumismo patológico, o incentivo ao aventureirismo político, caldo de cultura em todas as épocas às ambições totalitárias de tipo fascista.

As dramáticas consequências sociais da ordem neoliberal global, a crise da civilização por ela gerada, a sua aversão à humanidade, estão provocando a resistência das nações, sociedades, em defesa da liberdade, dignidade humana e até mesmo da sua própria existência.

sexta-feira, 5 de outubro de 2012

Civilização em impasse

Meu artigo publicado na Gazeta de Alagoas, no Vermelho, na Tribuna do Sertão, no Almanaque Alagoas, no Tribuna do Agreste e no Santana Oxente:


Se a prática da atividade política, como de resto na maioria dos ramos da atividade humana, baseia-se na análise concreta da realidade concreta, também não é menos verdadeiro que essa mesma humanidade é movida por esperanças fundadas nas causas, projetos, programas, que são formulados pelas correntes de pensamentos em todos os tempos, seja no passado, presente ou no futuro.

O historiador Eric Hobsbawm, falecido dias atrás, afirmou em recente entrevista, com a clareza dialética e visão universal dos fenômenos sociais, que a globalização, desregulamentação radical dos mercados mundiais, o fundamentalismo econômico da nova ordem mundial desses últimos vinte anos, levaram as sociedades ao grave impasse que estamos vivenciando, tendo como responsáveis os mesmos autores das grandes tragédias do século XX.

A crise financeira que tem jogado ao pântano social os Países da União Europeia e os Estados Unidos da América mas que se espalhou por todos os continentes atingindo as nações emergentes inclusive os denominados BRICS, dos quais o Brasil faz parte, é o ponto de inflexão e de estrangulamento do liberalismo ortodoxo capitalista responsável pelos fundamentos globais da economia assim como pela cara dessa atual civilização.

Os beneficiários desse processo foram os EUA que se tornaram, em virtude de circunstâncias históricas determinadas, a maior potência político-militar-cultural-ideológica que a humanidade já conheceu.

Ditando os rumos das estratégias financeiras globais, as diretrizes da geopolítica mundial, as informações centralizadas através de um complexo midiático planetário totalitário, fabricando em pouco tempo uma civilização à imagem desse império, condizente com os interesses do mercado desregulado.

Uma "sociedade volátil, de ligações frouxas e preceitos revogáveis" reduzida à tresloucada roda viva do consumo transformado em ideologia oficial, civilização de desigualdades, tensões, inquietações, medos coletivos e individuais, rejeição dos Estados nacionais, das identidades culturais e negação dos grandes valores humanistas, mergulhada na instabilidade crônica.

Mas essa civilização forjada a fogo e bala, do cidadão reduzido a um consumidor alienável está em colapso, num beco sem saída, recusada pela humanidade. Afinal, tinha razão Victor Hugo, gigante do pensamento universal: O homem, quando pensa, é um ser alado.