quinta-feira, 30 de junho de 2011

Desigualdade no Brasil diminuiu mais


Nosso amigo Américo Lima, o Lelé, nos enviou matéria publicada no jornal O Globo a respeito da diminuição da desigualdade no Brasil. A matéria informa que a Fundação Getúlio Vargas divulgou nesta segunda-feira, 27/06, o estudo “Os Emergentes dos Emergentes” que mostra que o Brasil é o país dos BRICS, grupo que reúne as maiores economias emergentes (Rússia, Índia, China e África do Sul, além do Brasil), que mais tem conseguido conciliar o crescimento econômico com redução das desigualdades sociais.

De acordo com o estudo, a renda per capita brasileira cresceu, entre 2003 e 2009, 1,8% acima da expansão do Produto Interno Bruto – PIB. Foi o melhor desempenho entre os grandes emergentes. O estudo mostra ainda que entre 2003 e 2007, a evolução da renda dos 20% mais pobres da população brasileira avançou em média 6,3% ao ano, único país do grupo no qual a renda dos mais pobres cresceu mais que a dos mais ricos, que teve um acréscimo de 1,7%.

O resultado da combinação de crescimento com redução das desigualdades aparece na mobilidade dos brasileiros na pirâmide social. De 2003 até este ano 48,7 milhões de brasileiros ascenderam para as classes A, B e C, uma quantidade de pessoas equivalente à população da Espanha. Somente entre 2009 e maio deste ano foram 13,08 milhões de brasileiros que ingressaram nas classes AB/C.

O estudo da FGV estima que, conforme dados de maio, 22,5 milhões de brasileiros integram as classes A e B (contra 13,3 milhões em 2003), 105,4 milhões estão na classe C (eram 65,8 milhões em 2003), e 63,5 milhões nas classes D e E (ante 96,2 milhões na mesma comparação).

Marcelo Neri, chefe do Centro de Políticas Sociais da FGV, que apresentou o estudo, afirmou: “Estamos falando de uma transformação de grande magnitude em curso no país. Não se sabe o quanto esse ritmo se sustenta, mas não há qualquer sinal de desaquecimento do aumento da renda até aqui”.

segunda-feira, 27 de junho de 2011

Afeganistão: tirando um pouquinho

Reproduzo aqui texto do jornalista e escritor Ivan Lessa, publicado em sua coluna no BBC Brasil. Ivan Lessa foi editor e um dos principais colaboradores do jornal O Pasquim que marcou época, em plena ditadura, como um instrumento de combate à censura utilizando muito humor.



Eu fiquei acordado na madrugada de quarta para quinta-feira ferozmente determinado a ouvir na íntegra o discurso do presidente Barack Obama a respeito da retirada de forças americanas no Afeganistão.

Estou mais acostumado às invasões americanas. Confiram nos tomos históricos, googleiem, vão de Wikipédia (está cada vez melhor) e verão a longa história de salvar os outros com bala de canhão, espingarda e baioneta.

Desde a salvação sanguinolenta da Nicarágua, em 1919, que amo ler a respeito, já que é mais sórdida e também a mais esquecida de todas inclusive as... Ora, basta citar um país, tribo, barraca de praia, o que for, que eles invadiram ou deram uma peitada na marra a fim de mudar regime destinado, instaurar a lendária pax americana ajudando, assim, as pessoas a verem, até quase à cegueira, a luz ofuscante da liberdade.

Aqui mesmo, entre nós, quando do golpe militar de 1964, eles já estavam passando cuspe na mira da carabina e navios bélicos (consta ser mais de um; como se fosse necessário) rondavam de longe nossos mares assustando cisnes brancos em noites de lua.

Pouquinho depois, em 1973, foi a vez do Chile. A verdade é que muita gente andou pagando o pato só porque os EUA perderam, mas perderam mesmo, a Guerra do Vietnã (1961-1975), uma bela iniciativa do saudoso presidente liberal John Fitzgerald Kennedy, ora sendo telebiografado em hilariantes episódios do History Chanell em debochado conluio com a BBC.

O History Chanel americano se recusou a levar. Passam documentário sobre disco voador, sim senhor, mas não perseguem, como quem invade Granada (ou terá sido Granada na Espanha?), em 1983, ou depõe, invadem, prendem, matam e esfolam o presidente General “El Piño” (tinha boa pele) Noriega, do Panamá em 1983, por consumo de drogas que fogem à média norte-americana.

O canal em questão, o só americano, frise-se, também já focalizou outras peraltices americanas: Camboja, Irã de Mossadegh, República Dominicana, Haiti de “Papa” Doc”, Guatemala e, mais de uma vez, a Coreia. Gozados os americanos, matam as cobras e depois interpretam como foi.

Mas em matéria de televisão, eu queria é falar do discurso eleitoral de Obama, que teve a duração de uns 13 minutos. De tarde, sempre pela televisão (é, eu não tenho, ou não posso ter, muito que fazer), acompanhei uma fala mais para a empolgada do que a eloquente primeira-dama, Monique, digo, Michelle Obama, na África do Sul, em companhia de Nelson Mandela e suas duas filhas (lá dela, não de Nérso), sendo enérgica e mostrando um poderoso arsenal discursivo. Espero que não seja prenúncio de uma tentativa de salvação da África do Sul, uma vez que os americanos têm a mania de construir nações a ferro e fogo amigo, a que dão o pitoresco nome de nation building,

Mas à mais que anunciada proposta eleitoral para as eleições gerais do ano que vem nos EUA. Obama revelou que, até julho do ano corrente, providenciará a pronta retirada de 5 mil soldados, e mais 5 mil até o Natal, para irem cantar White Christmas no hospital para neuroses de guerra, ou, como se diz agora, Transtornos de Stress Pós-Traumático.

Foi mais longe, o grande Obama, que o homem não brinca com distrito eleitoral (não se esqueçam que, no primeiro ano de seu mandato, 2009, enviou 33 mil soldados para o Afeganistão), seja no Maine ou em Kentucky: por volta de setembro do ano que vem, dois meses antes da realização do pleito presidencial, mais 23 mil voltarão ao que chamam, com uma das mãos, a que tiver sobrado, sobre o coração e desafinarão a patriótica canção My country tis of thee.

Lembremos que 56% da população americana e todo o Comando Militar americano são a favor da retirada total o mais rápido possível. Há, pois, votos paca aí nessa jogada.

Só tem uma coisinha. Continuarão no país amigão, onde altas autoridades americanas garantem não haver mais um único membro da Al-Quaeda, cerca de 70 mil soldadinhos armados até os dentes. Para ajudar no trânsito, transporte de papoulas, senhoras a empurrar o carrinho no supermercado, essas milicagens.

Os franceses, que não são bestas, seguiram o obamal exemplo e mandam de volta para casa seu contingente de 4 mil “soldados” (sempre em aspas, tratando-se de gauleses). E o vivaz e ricamente vestido presidente Karzai continuará a receber US$ 10 bilhões por mês. Para as verduras, na certa, conforme se dizia para certas senhoras ao deixar uma ou duas notas de 20 no criado-mudo.

Os ingleses, de presença reduzida no conflito (morreram apenas 374 rapazes) também irão se afastar da região. Há mais o que fazer por aqui. Cuidar dos grevistas e das bonificações dos banqueiros, por exemplo.

No meio disso tudo, o que me ficou mesmo na cabeça, pois gosto de prestar atenção nessas verbosidades, foi quando Obama disse que eles, os americanos, “são tão pragmáticos quanto passionais”. Estou até agora tentando decifrar o que é que o magnífico orador quis dizer com isso.

sábado, 25 de junho de 2011

O papel de Wall Street no narcotráfico

Artigo de Mike Whitney publicado no Carta Maior:

                                Memorial em homenagem a mulheres assassinadas em Ciudad Juaréz

Imagine qual seria sua reação se o governo mexicano decidisse pagar 1,4 milhões de dólares a Barack Obama para usar tropas norte-americanas e veículos blindados em operações militares em Nova York, Los Angeles e Chicago, estabelecendo postos de controle, e elas acabassem se envolvendo em tiroteios que resultassem na morte de 35 mil civis nas ruas de cidades norte-americanas. Se o governo mexicano tratasse assim os Estados Unidos, vocês o considerariam amigo ou inimigo? Pois é exatamente assim que os EUA vêm tratando o México desde 2006.

A política dos EUA para o México – a Iniciativa Mérida – é um pesadelo. Ela minou a soberania mexicana, corrompeu o sistema político e militarizou o país. Obteve também como resultado a morte violenta de milhares de civis, pobres em sua maioria. Mas Washington não está nem um pouco preocupado com os “danos colaterais”, desde que possa vender mais armas, fortalecer seu regime de livre comércio e lavar mais lucros das drogas em seus grandes bancos. É tudo muito lindo.

Há alguma razão para dignificar essa carnificina chamando-a de “Guerra contra as drogas”?

Não faz nenhum sentido. O que vemos é uma oportunidade descomunal de empoderamento por parte das grandes empresas, das altas finanças e dos serviços de inteligência norte-americanos. E Obama segue meramente fazendo seu leilão, razão pela qual – não é de surpreender – as coisas ficaram tão ruins sob sua administração. Obama não só incrementou o financiamento do Plano México (conhecido como Mérida), como deslocou mais agentes norte-americanos para trabalharem em segredo enquanto aviões não tripulados realizam trabalhos de vigilância. Deu para ter uma ideia do cenário?

Não se trata de uma pequena operação de apreensão de drogas, é outro capítulo da guerra norte-americana contra a civilização. Vale lembrar uma passagem de um artigo de Laura Carlsen, publicado no Counterpunch, que nos mostra um elemento de fundo:

“A guerra contra as drogas converteu-se no veículo principal de militarização da América Latina. Um veículo financiado e impulsionado pelo governo norte-americano e alimentado por uma combinação de falsa moral, hipocrisia e muito de temor duro e frio. A chamada “guerra contra as drogas” constitui, na realidade, uma guerra contra o povo, sobretudo contra os jovens, as mulheres, os povos indígenas e os dissidentes. A guerra contra as drogas se converteu na forma principal do Pentágono ocupar e controlar países à custa de sociedades inteiras e de muitas, muitas vidas”.

“A militarização em nome da guerra contra as drogas está ocorrendo mais rápida e conscienciosamente do que a maioria de nós provavelmente imaginou com a administração de Obama. O acordo para estabelecer bases na Colômbia, posteriormente suspenso, mostrou um dos sinais da estratégia. E já vimos a extensão indefinida da Iniciativa de Mérida no México e América Central, incluindo, tristemente, os navios de guerra enviados a Costa Rica, uma nação com uma história de paz e sem exército...”

“A Iniciativa de Mérida financia interesses norte-americanos para treinar forças de segurança, proporciona inteligência e tecnologia bélica, aconselha sobre as reformas do Judiciário, do sistema penal e a promoção dos direitos humanos, tudo isso no México” (“The Drug War Can’t Be Improved Only be Ended” – “A Guerra contra as drogas não pode ser melhorada, só terminada”, Laura Carlsen, Counterpunch)

A impressão que dá é que Obama está fazendo tudo o que pode para converter o México em uma ditadura militar, pois é exatamente isso o que ele está fazendo. O Plano México é uma farsa que esconde os verdadeiros motivos do governo, que consiste em assegurar-se de que os lucros do tráfico de drogas acabem nos bolsos das pessoas adequadas. É disso que se trata: de muitíssimo dinheiro. E é por isso que o número de vítimas disparou, enquanto a credibilidade do governo mexicano caiu como nunca em décadas. A política norteamericana converteu grandes extensões do país em campos de morte e a situação não para de piorar.

Esta entrevista com Charles Bowden descreve como é a vida das pessoas que vivem na Zona Zero da guerra das drogas no México, Ciudad Juárez:

“Isso ocorre em uma cidade onde muita gente vive em caixas de papelão. No último ano, dez mil negócios encerraram suas atividades. De 30 a 60 mil pessoas, sobretudo os ricos, mudaram-se para El Paso, no outro lado do rio, por razões de segurança. Entre eles, o prefeito de Juárez, que prefere ir dormir em El Paso. O editor do diário local também vive em El Paso. Entre 100 e 400 mil pessoas simplesmente saíram da cidade. Boa parte do problema é econômico. Não se trata simplesmente da violência. Durante esta recessão desapareceram pelo menos 100 mil empregos das empresas fronteiriças devido à competição asiática. As estimativas são de que há entre 500 e 900 bandos de delinquentes”.

Há 10 mil soldados das tropas federais e agentes da Polícia Federal vagando por ali. É uma cidade onde ninguém sai à noite, na qual todos os pequenos negócios pagam extorsão, onde foram roubados oficialmente 20 mil automóveis no ano passado e assassinadas 2.600 pessoas no mesmo período. É uma cidade onde ninguém segue o rastro das pessoas que foram sequestradas e não reaparecem, onde ninguém conta as pessoas enterradas em cemitérios secretos onde, de forma indecorosa, volta e meia aparecem alguns corpos em meio a alguma escavação. O que temos é um desastre e um milhão de pessoas que são muito pobres para poder ir embora. A cidade é isso”. (Charles Bowden, Democracy Now)

Isso não tem a ver com as drogas; trata-se de uma política externa louca que apoia exércitos por delegação para impor a ordem por meio da repressão e militarização do Estado policial. Trata-se de expandir o poder norte-americano e de engordar os lucros de Wall Street. Vejamos mais alguns dados de fundo proporcionados por Lawrence M. Vance, na Future of Freedom Foundation:

“Um número não revelado de agentes da lei norte-americanos trabalha no México (...) A DEA tem mais de 60 agentes no México. A esses se somam os 40 agentes de Imigração e Aduanas, 20 auxiliares do Serviço de Comissários de Polícia e 18 agentes da Agência de Álcool, Tabaco, Armas de Fogo e Explosivos, mais os agentes do FBI, do Serviço de Cidadãos e Imigração, Aduana e Proteção de Fronteiras, Serviço Secreto, guarda-costas e Agência de Segurança no Transporte. O Departamento de Estado mantém também uma Seção de Assuntos de Narcóticos. Os EUA também forneceram helicópteros, cães farejadores de drogas e unidades de polígrafos para examinar os candidatos a trabalhar em organismos de aplicação das leis”.

“Os aviões não tripulados norte-americanos espionam os esconderijos dos cartéis e os sinais rastreadores norte-americanos localizam com exatidão os carros e telefones dos suspeitos. Agentes norte-americanos seguem os rastros, localizam chamadas telefônicas, lêem correios eletrônicos, estudam padrões de comportamento, seguem rotas de contrabando e processam dados sobre traficantes de drogas, responsáveis pela lavagem de dinheiro e chefes dos cartéis. De acordo com um antigo agente anti-droga mexicano, os agentes norte-americanos não estão limitados em suas escutas no México pelas leis dos EUA, desde que não se encontrem em território norte-americano e não grampeiem cidadãos norte-americanos". (“Why Is the U.S. Fighting Mexico’s Drug War?”, “Por que os EUA travam a guerra contra as drogas no México?”, Laurence M. Vance, The Future of Freedom Foundation).

Isso não é política externa, mas sim outra ocupação norte-americana. E adivinhem quem enche os cofres com essa pequena fraude sórdida? Wall Street. Os grandes bancos ficam com sua parte como sempre fazem. Vejamos essa passagem de um artigo de James Petras intitulado “How Drug profits saved Capitalism” (“Como os lucros das drogas salvaram o capitalismo”, publicado em Global Research). É um estupendo resumo dos objetivos que estão configurando essa política:

Enquanto o Pentágono arma o governo mexicano e a DEA (Drug Enforcement Agency, a agência anti-droga dos EUA) põe em prática a “solução militar”, os maiores bancos dos EUA recebem, lavam e transferem centenas de bilhões de dólares nas contas dos senhores da droga que, com esse dinheiro, compram armas modernas, pagam exércitos privados de assassinos e corrompem um número indeterminado de funcionários encarregados de fazer cumprir a lei de ambos os lados da fronteira...”

Os lucros da droga, no sentido mais básico, são assegurados mediante a capacidade dos cartéis de lavar e transferir bilhões de dólares para o sistema bancário norte-americano. A escala e a envergadura da aliança entre a banca norte-americana e os cartéis da droga ultrapassa qualquer outra atividade do sistema financeiro privado norte-americano. De acordo com os registros do Departamento de Justiça dos EUA, só um banco, o Wachovia Bank (propriedade hoje de Wells Fargo), lavou 378.300 milhões de dólares entre 1° de maio de 2004 e 31 de maio de 2007 (The Guardian, 11 de maio de 2011). Todos os principais bancos dos EUA tornaram-se sócios financeiros ativos dos cartéis assassinos da droga”.

Se os principais bancos norte-americanos são os instrumentos financeiros que permitem os impérios multimilionários da droga operar, a Casa Branca, o Congresso dos EUA e os organismos de aplicação das leis são os protetores essenciais desses bancos (...) A lavagem de dinheiro da droga é uma das fontes mais lucrativas de lucros para Wall Street. Os bancos cobram gordas comissões pela transferência dos lucros da droga que, por sua vez, emprestam a instituições de crédito a taxas de juros muito superiores às que pagam – se é que pagam – aos depositantes dos traficantes de drogas. Inundados pelos lucros das drogas já desinfetados esses titãs norte-americanos das finanças mundiais podem comprar facilmente os funcionários eleitos para que perpetuem o sistema”. (“How Drug Profits saved Capitalism, James Petras, Global Research).

Vamos repetir: “Todos os principais bancos dos EUA se tornaram sócios financeiros ativos dos cartéis assassinos da droga”.

A guerra contra as drogas é uma fraude. Ela não tem a ver com proibição, mas sim com controle. Washington emprega a força para que os bancos possam garantir um bom lucro. Uma mão lava a outra, como ocorre com a Máfia.

(*) Mike Whitney é um analista político independente que vive no estado de Washington e colabora regularmente com a revista norte-americana CounterPunch.

Jandira Feghali: Repondo a verdade sobre a votação do novo Código Florestal


Para a deputada Jandira Feghali (PCdoB/RJ), a aprovação do novo Código Florestal causou uma avalanche de incorreções na interpretação de seu conteúdo. Ela nos envia seu artigo em que expõe sua opinião sobre a natureza da legislação aprovada e as consequências políticas derivadas desse processo.

O primeiro ponto que destaca é que esse Projeto de Lei foi uma proposição de iniciativa da própria Câmara – “um projeto de tamanha importância e abrangência ter origem na própria Câmara é um fato raro, senão inédito”.

Em segundo lugar, que esse projeto vem em resposta a um problema de dimensão nacional, que decorre de uma legislação ambiental construída com base na valorização absoluta dos objetivos do conservacionismo ambiental, desconsiderando, muitas vezes, o equilíbrio que deve resultar no desenvolvimento sustentável.

A seguir, parte do artigo de Jandira Feghali:

Repondo a verdade sobre a votação do novo Código Florestal

...

A atual regulação ambiental, que alterou o Código Florestal de 1965, foi feita de forma autoritária, pelo uso de medidas provisórias ou decretos, a exemplo da Medida Provisória 1.511, de 1996, reeditada e alterada mensalmente até 2001 (MP 2166-67), que continua vigendo sem nunca ter sido submetida a votos no Congresso Nacional. Esta MP – reeditada 67 vezes – transferiu poderes de regular a órgãos do Poder Executivo, como o Conselho Nacional de Meio Ambiente (Conama) e elevou as exigências de áreas de conservação obrigatória, inclusive ampliando a reserva legal de 50% para 80% nas propriedades rurais do bioma amazônico.

Sabemos que muitas dessas decisões são fruto de importantes e significativos encontros e acordos internacionais, inclusive a ECO92, mas algumas dessas regras vêm sendo exigidas de forma retroativa, desrespeitando a situação em vigor nas propriedades na data de sua publicação, mesmo quando essas propriedades estavam regulares em relação à obrigação até então em vigor.

A aplicação retroativa de novas regras é a responsável pela criação de um gigantesco passivo ambiental – traduzido em áreas de proteção permanentes (APPs) e Reservas Legais (RL) parcial ou totalmente utilizadas para produção agrícola ou de exploração florestal predatória ou sem manejo adequado, em especial nas regiões de agricultura consolidada. Esse processo terminou por criar uma grave situação de insegurança jurídica.

A impossibilidade de cumprir as crescentes exigências nos termos da legislação atual acabou por colocar na ilegalidade a maior parte dos proprietários rurais, em especial os pequenos para quem as APPs representam uma perda de área agricultável proporcionalmente maior do que para os grandes. Importante destacar que a produção de alimentos que vai para a mesa do povo decorre das atividades produtivas dos pequenos e da agricultura familiar.

A situação criada tornou-se insustentável, obrigando o governo a adiar, por meio do Decreto 6.514, de 2008, a cobrança das multas já exaradas, até 11 de junho de 2011. Este decreto foi reeditado, no último dia 10 de junho, uma vez que o anterior deixou de vigorar e a votação do Novo Código Florestal não foi concluída, restando a apreciação da matéria no Senado Federal. Neste momento eram esperados novos protestos alegando “Anistia” e eles não vieram de ninguém.

Segundo a CONTAG, entidade que representa os pequenos produtores, com esmagadora maioria de agricultores familiares, sem a reprodução deste texto no código e emergencialmente no decreto, 70% da agricultura familiar pararia de plantar e produzir alimentos.

Isso demonstra que o próprio governo reconhece a existência da lacuna legal criada, e a necessidade de um marco regulatório que estabeleça como lidar com este passivo, oferecendo uma solução justa e definitiva ao problema. Cabe ressalvar que tanto o decreto original, como a proposta aprovada pela Câmara e o atual decreto contêm os mesmos mecanismos. Esse decreto, cujo conteúdo vem sendo erroneamente caracterizado como anistia aos desmatadores, não provocou estímulo ao desmatamento que, ao contrário, teve drástica redução até agosto de 2010.

Neste sentindo, o objetivo da proposta para o novo Código Florestal, aprovado pela Câmara, é consolidar a legislação ambiental atual e, ao mesmo tempo, solucionar os problemas decorrentes de sua aplicação. Em relação às regras de conservação ambiental em vigor, a proposta deixa-as quase intocadas. As disposições inovadoras do Código tratam das obrigações a que as propriedades terão que se submeter a fim de recuperar as áreas de conservação que devem ser reconstituídas.

Para tanto, o Código prevê a criação de um Programa de Regularização Ambiental regionalizado, sob responsabilidade conjunta da União e dos Estados. Apenas para os proprietários que aderirem ao Programa ficará suspensa a cobrança das multas ambientais aplicadas, até que se cumpra a efetiva recuperação de áreas preservadas. Caso essa recuperação não se cumpra, todas as multas suspensas serão cobradas. Não se concede, portanto, nenhuma “anistia”.

Destaque-se que, mesmo nessa regra de suspensão temporária e condicional das multas, o novo Código não inovou, apenas repete as condições já estabelecidas pelo Decreto 6.514/2008, já citado.

Desse modo, e em síntese, podemos afirmar que o novo Código, relatado por Aldo Rebelo, não só mantém todas as áreas de conservação legal, como permitirá, no prazo estabelecido pelo Programa de Regularização Ambiental, a recuperação daquelas áreas hoje utilizadas para a produção agrícola.

Destacamos abaixo alguns dispositivos do projeto que vem ao encontro da importante e indispensável preservação ambiental, garantindo ao Brasil a referência mundial nesta matéria e o cumprimento das metas anunciadas para redução de emissão de gases.

Para ler o texto na íntegra, veja em: http://www.sigajandira.com.br/o-que-ha-de-politicamente-importante-na-elaboracao-e-aprovacao-do-novo-codigo-florestal/

sexta-feira, 24 de junho de 2011

O Brasil e a tragédia grega

Meu artigo publicado na Gazeta de Alagoas, no Vermelho, na Tribuna do Sertão e no Santana Oxente:


Não há mais como a grande mídia hegemônica global e brasileira possa esconder o caráter dramático da crise do sistema financeiro internacional. A situação da economia grega, por exemplo, representa uma verdadeira tragédia para a sua população vítima de um violento ataque especulativo que a levou à bancarrota total.

Essa situação crítica também vai atingindo a grande maioria dos Países da Comunidade Europeia sendo que ela se apresenta, na atualidade, de maneira mais explosiva entre as nações da considerada periferia da região do euro, Espanha, Portugal, Irlanda, Grécia, Bélgica etc.

Mas nada indica que também não alcance, em igual intensidade, os Estados do chamado centro econômico da Europa, em especial a França, o Reino Unido e a Alemanha.

Os barões das finanças e a elite política conservadora, já anunciam através dessa mesma grande mídia hegemônica global que a crise “atingiu uma fase política”, como se o ingrediente político estivesse ausente em algum momento dessa tempestade que se abate principalmente sobre os assalariados, classe média e aposentados do velho continente.

Portanto, essa crise econômica das finanças internacionais que se iniciou nos Estados Unidos em 2008 assume de novo uma fase aguda e severa.

O que vem por aí serão na verdade os brutais planos de cortes nas conquistas sociais, as privatizações em massa, projetos de desnacionalizações de empresas e bancos, reduções de salários etc.

Como os trabalhadores não estão aceitando passivamente o assalto à mão armada em curso, a tendência será de grandes explosões populares por toda a Europa. Na Inglaterra, por exemplo, já está programada uma greve geral dos servidores públicos para o dia 30 de junho.

Enquanto isso a CIA, prevê, ou articula mesmo, um golpe militar na Grécia com o objetivo de conter as crescentes ondas de indignação social contra as medidas draconianas receitadas pelo FMI e o Banco Central europeu como remédio desesperado à bancarrota financeira.

As economias das nações emergentes, muito especialmente aquelas que fazem parte dos BRICS, Brasil, Rússia, Índia, China e recentemente a África do Sul, resistem bravamente ao tsunami financeiro internacional, mesmo sofrendo ataques especulativos em suas moedas.

O Brasil terá que adotar, a médio ou mesmo em curto prazo, sérias medidas de políticas econômicas, visando a proteção da saúde financeira além da sua integridade soberana que vem sofrendo constantes açodamentos.

terça-feira, 21 de junho de 2011

Renato Rabelo: a batalha estratégica contra a mídia hegemônica

Reproduzimos aqui matéria de André Cintra publicada no Vermelho:

Apresentando-se “não como presidente do PCdoB, mas como blogueiro”, Renato Rabelo participou, neste sábado (18/06), da oficina mais concorrida do 2º Encontro Nacional de Blogueiros Progressistas, em Brasília. Ao lado do ex-ministro José Dirceu e do deputado federal Brizola Neto (PDT-RJ), o dirigente comunista debateu “Os partidos e a luta pela democratização da comunicação”.

Segundo Renato, após o regime militar (1964-1985), o Brasil viveu duas décadas de “crise de projetos”. Favorecido agora pelo ciclo democrático-progressista aberto pelo governo Lula (2003-2010) e renovado pela ascensão de Dilma Rousseff à presidência, o país precisa efetivar reformas estruturais básicas, de caráter democratizante, nos marcos de um novo projeto nacional de desenvolvimento.

"É sob essa perspectiva que devemos entender a luta pela democratização dos meios de comunicação. A reforma da mídia não é uma luta conjuntural, uma luta qualquer – mas, sim, uma mudança estratégica”, apontou Renato. “Vejo o fortalecimento da mídia alternativa como os passos iniciais desse processo. Estamos apenas começando essa luta, que vai durar até a concretização da verdadeira ruptura.”

Ao comentar as propostas do Ministério das Comunicações do governo Dilma – como o Plano Nacional de Banda Larga e o debate sobre um novo marco regulatório da mídia –, Renato relativizou o poder do Executivo. “Esses avanços não dependem de um ministro, por melhor que ele seja. O povo é que é a força motriz da mudança. Precisamos mobilizar mais pessoas em torno dessa consciência crescente, aglutinar o máximo de aliados, para transformar nossa luta em força concreta.”

O dirigente afirmou que a democratização do setor se tornou “um trabalho prioritário” para o PCdoB. “Somos o único partido do Brasil que, além de uma Secretaria de Comunicação, tem também uma Secretaria de Questões da Mídia, para dar consequência às batalhas. À frente dessa pasta está o Altamiro Borges, o Miro, que vocês todos conhecem e que é um ardoroso lutador.”

Renato acrescentou que a luta por uma nova mídia não se limita ao Brasil. “Os setores conservadores que querem manter o status quo no mundo têm um grande poder na comunicação – que, para eles, é uma pilastra estratégica. Afora a força coercitiva, as armas, o capitalismo utiliza sobretudo a mídia para exercer seu poder, seu predomínio político e ideológico pelo mundo.”

Transformar os meios de comunicação, nesse sentido, é impulsionar a nova ordem geopolítica. “O mundo está em transição, com uma profunda crise em seu centro e o ascenso rápido de novos atores vindos da periferia do sistema, como os Brics (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul). Mas é impossível consolidar esse processo se a mídia monopolista não for derrotada.”

sábado, 18 de junho de 2011

Chico Buarque, um artista brasileiro

Neste domingo, 19 de junho, Chico Buarque completa 67 anos. Suas músicas e toda sua obra fazem parte da vida dos brasileiros a quem sempre retratou e expressou com grande sensibilidade. Reproduzo aqui o texto publicado no Vermelho, de Marcos Aurélio Ruy, sobre esse artista brasileiro, como ele próprio se define em sua música “Para todos”.


Não é uma data redonda, mas é uma data de celebração da cultura nacional na pessoa de um de seus principais representantes. Chico Buarque busca a novidade, mas não o novo pelo novo.

Como ele mesmo disse, a música brasileira já traz em si a mudança. Acrescentou conhecimento para a arte, misturando o erudito e o popular, influenciado pela Bossa Nova. Toda a obra desse autor está permeada da alma do brasileiro e do sonho de um Brasil para todos, para todos os brasileiros.

Nos anos 1960 ele escreveu um artigo no jornal ”Última Hora“ intitulado “Nem toda loucura é genial, nem toda lucidez é velha”, justamente para mostrar a sua lucidez revolucionária, que é a mesma de quem acredita no socialismo brasileiro como futuro. Foi pioneiro ao imprimir as letras das canções, em 1967, mostrando a semelhante preocupação com letra e melodia.

Seguindo passos de Noel Rosa, que urbanizou o samba, Chico ajudou a politizar a MPB com temas de resistência à ditadura e de denúncia das mazelas do capitalismo dependente. E com isso chamou ainda mais a atenção da censura...

Tanto que em certo momento apenas o aparecimento de seu nome bastava para a obra ser censurada, justamente numa pressão econômica, para ver se o autor cedia. Não cedeu e ainda cutucava a onça com vara curta, às vezes curtíssima, como a canção “Cálice”, em parceria com Gilberto Gil, que, tendo sido proibida, eles tocaram e cantarolavam num show, quando tiveram os microfones cortados.

Em 1974, lançou um disco com canções de outros compositores tendo como faixa-título, muito apropriada, “Sinal Fechado”, de Paulinho da Viola. Nesse mesmo LP aparece a música “Acorda Amor”, sob os pseudônimos Leonel Paiva e Julinho da Adelaide, uma maneira para driblar a censura. Teve inúmeras músicas e peças de teatro censuradas.

O cale-se da ditadura

Avesso a badalações. Chico é a antítese do padrão elitista do artista isolado, excêntrico e, portanto, distante do povo. E como todo grande autor que faz opção pela temática popular, nacional, social, e política, passa a ser criticado por setores da elite, principalmente da direita raivosa, com olhos voltados para Miami. Taxado de modo jocoso de “unanimidade nacional”, nunca teve unanimidade.

A crítica conservadora sempre viu em Chico Buarque um “conservadorismo” musical, quando o oposto era a verdade justamente por ele respeitar as raízes populares da cultura e com essa temática trazer inovações para a música popular brasileira. Essa direita fala mal de Chico até hoje, com sempre falou mal de Lula, do PCdoB, do MST, enfim de tudo o que tem conteúdo contrário às suas propostas.

Apoiou-se nos ombros de grandes como Noel Rosa, Pixinguinha, Ismael Silva, Ataulfo Alves, Cartola, Dorival Caymmi, Vinicius de Moraes, João do Vale, mas principalmente João Gilberto, a quem Chico disse que procurava imitar, e o “maestro soberano” Tom Jobim, de quem virou parceiro e é homenageado na música “Paratodos”. Mas Chico tornou-se referência obrigatória em qualquer trabalho sobre a música popular brasileira e da literatura dos últimos anos. Talvez o nosso artista e escritor mais completo. Não se rendeu às facilidades do mercado e nem cedeu à ditadura - decidiu resistir. É certo que não foi único, mas esteve entre os principais com sua obra engajada politicamente e de uma qualidade sem parâmetros.

Apresenta pela primeira vez em 1964 num show no Colégio Santa Cruz, em São Paulo, a música “Tem Mais Samba”, onde já mostra ao que veio: ser a voz dos que não têm voz. Os versos dessa canção já diziam “Tem mais samba no homem que trabalha/Tem mais samba no som que vem da rua”.

No mesmo ano participa do Festival da Excelsior com a música “Sonho de um Carnaval”, interpretada por Geraldo Vandré. Nunca mais parou. Chico já demonstrava a preocupação com o cotidiano e com a vida do homem comum, dos trabalhadores, engajou-se na resistência à ditadura (1964-1985), como ele mesmo disse em entrevista “não poderia deixar de resistir”. A mídia o taxava de “velho”, “ultrapassado”, assim como sempre taxou os comunistas de “jurássicos”, simplesmente porque tudo o que significa defesa da cultura nacional e popular para a elite é antigo. Ao contrário, Chico disse ser “comunável”, ou seja, amigo dos comunistas, sempre buscou aproximar-se e valorizar a nossa cultura, o nosso país.

A Banda

O sucesso disparou com “A Banda” ao vencer o Festival da Record, em 1966. E no ano seguinte escreve a peça “Roda Viva”, que dá uma reviravolta em sua carreira. Passa a ser mais perseguido pela ditadura, a ponto de alguns anos mais tarde ser forçado a exilar-se na Itália, de onde voltou “fazendo barulho” como aconselhou Vinicius de Moraes.

Já denunciava a mercantilização da cultura. Chico tem a obra permeada pela moça da favela que desce o morro de blusa amarela, batendo a panela e vem para o asfalto proclamar seus direitos, como na canção “Pelas Tabelas”, onde o social e o individual caminham lado a lado para construir uma nova sociedade, com justiça social, liberdade, onde todos sejam iguais em direitos e a vida seja respeitada. Canta o pivete que “vende chiclete e se chama Mané” e a expressão da mãe do guri, que “trouxe uma penca de documentos para finalmente” ela se identificar, como cantou a mãe que lutava para ter o corpo de seu filho assassinado nos porões da ditadura na canção Angélica dedicada a Zuzu Angel.

Essa mistura de temas e sons e a fineza com que trabalhou os temas populares é que a elite não perdoa em Chico Buarque, como em “Construção”, onde escolhe terminar todos os versos em proparoxítonas (palavras mais raras em nossa língua) para falar da vida de um operário da construção e da opressão capitalista do trabalho alienado e, portanto, do trabalhador insatisfeito. Em “Cotidiano” diz “meio dia só penso em dizer não, depois penso na vida pra levar e me calo com a boca de feijão.” É o social com individual, da luta incessante de um povo para ter sua vida respeitada.

Chico nunca cedeu a facilidades. Brigou com os militares quando utilizaram “A Banda” num comercial para o serviço militar, rompeu com a Globo pela prática de censura que tomou conta da emissora. “Não concordo com o monopólio, com o tipo de censura que a Globo andou fazendo”, disse. Anos depois também afirmaria que “o fato de a Globo ser tão poderosa, isso sim eu acho nocivo”.

Com uma visão muito crítica disse que jornalistas têm certo poder e ele não está “para agradar poderosos”. Temática que sempre norteou sua obra. Ia a Cuba frequentemente com diversos artistas participar de festivais, quando Cuba e os cubanos eram proibidos no Brasil.

Há pouco tempo, o compositor carioca criticou a política econômica de FHC e o “príncipe” da sociologia, avesso à críticas contrárias, o chamou de “repetitivo”, justamente pelas conhecidas posições políticas de Chico em apoio ao ex-presidente Lula. Na eleição da presidenta Dilma, o ano passado, Chico havia dito que votaria nela por ser a candidata do Lula; no embate do segundo turno voltou à cena afirmando que com o governo Lula “o Brasil é um país que é ouvido em toda parte porque fala de igual pra igual com todos. Não fala fino com Washington, nem fala grosso com a Bolívia e o Paraguai.”

No fim do da ditadura compôs “Vai Passar”, um verdadeiro hino à liberdade e ao Brasil. Mas sempre com sua lucidez peculiar cantou uma “alegria fugaz, uma ofegante epidemia que se chamava carnaval”, com a clareza de que ainda há muito que fazer para chegarmos ao Brasil que tanto desejamos.

Não cedeu a modismos, fez o trabalho como acreditou que devia ser feito. Mesmo suas obras feitas para momentos específicos nunca perdem a atualidade, como “Apesar de Você”, que narrava a ditadura, mas também que pode ser o neoliberalismo com suas teses antinacionais.

Também enfrentou problemas com algumas músicas. A sua música em parceria com o teatrólogo Augusto Boal, “Mulheres de Atenas” criticada por setores feministas, quando o pretendido era justamente o contrário, era atacar a repressão sexual e a opressão machista. Mais grave ainda ocorreu com “Geni e o Zepelim”, quando as pessoas cantarolavam o refrão da música e jogavam areia em moças que praticavam topless nas praias, no Rio, num efeito totalmente adverso ao pretendido. Chico nunca mais cantou essa canção.

As críticas eram tantas que chegou um momento em que Chico parou de cantar e fazer shows, porque isso prejudicava a sua criação e por querer deixar suas músicas para serem interpretadas por “especialistas”, mas essa decisão não pode durar muito, o público exigiu Chico Buarque interpretando suas canções. A pérola “Meu Caro Amigo”, em parceria com Francis Hime, foi feita para Boal no exílio e tornou-se um hino da resistência, assim como “Apesar de Você” e tantas outras. Esse choro inovador denunciava que “a coisa aqui ta preta”.

Música, teatro, literatura

Chico partiu de sua música, já muito censurada para o teatro na tentativa de dissuadir um pouco essa tenaz censura a si. Suas peças desde “Roda Viva” também foram confrontadas. “Calabar”, em parceira com o moçambicano Ruy Guerra, foi inteiramente proibida e inclusive diversas canções e capa do disco censurados após terem sido liberados. Escreveu também “Gota D’Água”, “Ópera do Malandro”, “Os Saltimbancos”.

A guerra Chico x censura se acentuava. O primeiro livro escrito em 1974, a novela “Fazenda Modelo”, uma metáfora do Brasil. Escreveu o livro infantil “Chapeuzinho Amarelo” (1979), a menina que tinha tanto medo, mas que foi superando até que a palavra lobo virou bolo, o bolo da vida e da superação. A dedicação à literatura ficou marcante a partir de “Estorvo”, publicado em 1991, aí vieram “Benjamim” (1995), “Budapeste” (2003) e “Leite Derramado” (2009). Isso mostra que a sua criatividade e inventividade nunca parou de crescer. Aliás, o próprio Chico afirma que com o avanço de tempo tem ficado cada vez mais exigente.

Chico Buarque representa a cultura do Brasil para todos, do Brasil para os brasileiros. E se o objetivo do artista, do escritor, do intelectual é atingir o infinito, ninguém mais do que Chico atingiu essa meta, como na canção “Tempo e Artista”, cujos versos afirmam que “num relance, o tempo alcança a glória e o artista o infinito.”

E mesmo antes de John Lennon afirmar com razão que “a mulher é o negro do mundo”, Chico já cantava a alma feminina como ninguém. "Cavalo de sambistas, alquimistas, menestréis, mundanas, olhos roucos, suspiros nômades, a alma à deriva. Inventado porque necessário, vital, sem o qual o Brasil seria mais pobre, estaria mais vazio, sem semana, sem tijolo, sem desenho, sem construção", disse Ruy Guerra sobre o amigo Chico.

Recentemente ele disse gostar de rap, "o tipo de música que uma vez foi feita, por mim e por outros, com uma temática social, eles fazem isso melhor, porque vêm de lá. Eles falam para sua gente, vêm das favelas e são ouvidos por todos os tipos de pessoas. Eles têm algo a dizer, muito sério." Esse é o Chico das ruas, do carnaval, do samba, da valsa, do choro, da vida, do povo brasileiro. Como disse o cubano Pablo Milanés no programa “Chico & Caetano” (Globo) “Chico Buarque não é de Itália é de Hollanda, mas é do Brasil”.

Pela sua arte e por sua trajetória parabéns Francisco Buarque de Hollanda pelo seu 67º aniversário e obrigado por ser o nosso Chico Buarque.

sexta-feira, 17 de junho de 2011

A síndrome de Weimar

Meu artigo publicado na Gazeta de Alagoas, no Vermelho, na Tribuna do Sertão e no Santana Oxente:


A situação da Grécia vai ficando cada vez mais insustentável, principalmente no cenário social. Já são diárias as manifestações populares contra as violentas políticas de cortes nos direitos sociais, receituário do FMI, para tentar conter a queda desembestada, ladeira abaixo, de uma economia na UTI e sem os sinais vitais de recuperação.

O governo grego procura jogar nas costas dos trabalhadores, classe média, e até setores intermediários da burguesia, o ônus de uma crise cujos verdadeiros responsáveis são os chamados bancos de investimentos.

Um eufemismo para o capital rentista e parasitário que através de sucessivos ataques especulativos detonaram literalmente a sofrível economia da Grécia que tem como uma das principais pilastras de sustentação um volumoso turismo internacional.

A Grécia não tem nenhuma condição de saldar os empréstimos recebidos da União Europeia para a recuperação de uma derrocada econômica total, cuja dívida pública já ultrapassa mais de 140% do seu PIB, o produto interno bruto.

Mas a questão é que esse quadro poderá levar de roldão todas as economias da União Europeia onde várias nações também caminham a passos largos para a inadimplência total a exemplo de Portugal, Irlanda, Espanha, Itália etc. A velha Europa vai mergulhar na recessão generalizada.

Portanto o que está em jogo é a dissolução da União Europeia e do Euro como moeda. Assim a gravidade da realidade ultrapassa o plano técnico ou simplesmente monetário, como desejam fazer crer a grande mídia monopolista global e brasileira, e assume o contexto de uma seríssima encruzilhada política.

As medidas tomadas pelos governos europeus contra a epidemia da crise financeira, cuja origem se encontra na recessão da economia norte-americana, na orgia promovida pelos seus bancos de investimentos, são contra o povo europeu, os trabalhadores, aposentados etc.

O resultado são as taxas de desemprego que assolam o continente, onde só na Espanha, mais de 40% dos trabalhadores jovens estão desempregados. Mas a resposta das elites da Europa à crise tem sido mais arrocho e mais repressão.

Por isso, os analistas políticos começam a fazer analogias dessa situação atual com a república de Weimar na Alemanha, ante-sala da Segunda Guerra mundial. Porque os sintomas se assemelham, o pavor às lutas sociais, o colapso econômico, o desemprego geral e uma tendência ao fascismo.

sexta-feira, 10 de junho de 2011

A epopeia da soberania nacional

Meu artigo publicado na Gazeta de Alagoas, no Vermelho, na Tribuna do Sertão e no Santana Oxente:


Os embates que estão sendo travados em torno do Código Florestal brasileiro demonstram a dimensão e o caráter estratégico da luta em defesa da soberania nacional. Aprovada por ampla maioria na Câmara dos Deputados a matéria segue para o Senado Federal.

No entanto, ela não se restringe aos espaços do Congresso Nacional. Estende-se por todos os cantos do cenário brasileiro. Há uma intensa disputa de ideias contra a mídia hegemonia global e indisfarçáveis interesses foraneos, que se espalha no mundo acadêmico, na juventude, nas organizações sindicais, entre os agricultores, no âmbito dos movimentos populares, no mundo jurídico, em meio aos partidos políticos etc.

É uma polêmica apaixonada, muitas das vezes áspera e também exigente de informações e discussões sobre diversos conteúdos científicos e sem dúvida carregada de posições ideológicas Na luta política, as circunstâncias às vezes surpreendem o traçado que é pensado nos compêndios das ciências sociais ou nos livros de História.

É difícil acreditar, por exemplo, que alguém fosse supor, à época, que os confrontos decisivos contra os vinte e um anos de ditadura no Brasil fossem travados no Congresso Nacional, mobilizando toda a sociedade nacional em extraordinárias manifestações populares de centenas de milhares de pessoas, algumas delas ultrapassando mais de um milhão de manifestantes, como foram os comícios pelas eleições diretas para presidente da República.

Todas as esperanças de uma nação amordaçada pelo regime foram depositadas em uma improvável emenda constitucional à Carta redigida pelo arbítrio onde dizia que se aprovada, o presidente da República voltaria a ser eleito pelo voto popular universal e secreto.

Vencida a chamada emenda Dante de Oliveira no Congresso Nacional pela pressão sufocante do regime discricionário, a luta democrática e popular tomou o caminho da eleição indireta para presidente através do Colégio Eleitoral instituído pela ditadura, derrotando-a finalmente em seu próprio terreno. O rumo da História foi traçado, mais uma vez, através de acontecimentos imponderáveis.

Tudo isso nos faz refletir sobre a premente luta pela soberania nacional plena e o desenvolvimento efetivo do País, que pressupõe a indeclinável emancipação social. Por ser exigência e necessidade histórica ela continua tecendo como um estratagema o seu roteiro. É como o enredo de uma epopeia clássica onde cada capítulo nos reserva situações excepcionais.

O Código Florestal e a Rio+20

Artigo publicado no Vermelho, de Luciano Rezende, engenheiro agrônomo, professor do Instituto Federal de Alagoas - IFAL em Piranhas, onde é membro da direção municipal do PCdoB:


Na última terça-feira (7) ocorreu um evento em Brasília referente aos preparativos para a Conferência das Nações Unidas sobre o Desenvolvimento Sustentável, chamada de Rio+20 (em alusão aos vinte anos da Eco-92, realizada na cidade do Rio de Janeiro). Na oportunidade, o discurso com foco no meio ambiente feito pela presidente Dilma Roussef chamou atenção pelas constantes afirmativas de que não haverá negociação com desmatadores, em menção contrária a alguns dispositivos do novo Código Florestal aprovado na Câmara dos Deputados.

É no mínimo preocupante tal declaração, pois caso Dilma venha cumprir sua promessa, jamais poderá se reunir com líderes de países importantes como Estados Unidos, Japão, Alemanha, Itália, China, entre outros. Ficará isolada já no meio do mandato. É preciso ter cautela com o que se fala.

Também ficará sem dialogar com milhões de pequenos agricultores. Desde a pequena Maués no Amazonas, capital nacional do guaraná, passando por Rio Verde e Jataí em Goiás, capital dos grãos, até chegar aos “cinturões verdes” que margeiam as grandes metrópoles, a interlocução da presidente com importantes segmentos produtivos da sociedade será abalada se se apostar na criminalização de agricultores como melhor opção.

De todos os países que participarão da Rio+20 é de se perguntar se algum deles tem um Código Florestal que imobiliza mais da metade de seus territórios exigindo proteção de 80% da vegetação nativa local. Ou, quais desses países dispõem de alguma regra mínima que impeça o desmatamento das matas ciliares dos rios, represas ou lagos? Por acaso tem algum país, afora o Brasil, que trabalha com o conceito de Reserva Legal ou Área de Preservação Permanente?

Caso contrário, soa no mínimo imoral levantar em riste seus dedos para acusar nossos agricultores de desmatadores. O grande mérito do novo Código Florestal brasileiro é justamente o de dialogar com amplos setores da sociedade e integrar os interesses nacionais com a preservação do meio-ambiente.

Em recente artigo, o professor Osvaldo Ferreira Valente, do departamento de Engenharia Florestal da Universidade Federal de Viçosa, faz referência aos dados do Serviço Florestal Brasileiro (SFB), braço institucional do insuspeito Ministério do Meio Ambiente, publicados ano passado na obra “Florestas do Brasil”.

O documento de 152 páginas está disponível em www.florestal.gov.br e traz com riqueza de detalhes e ilustrações sobre os nossos biomas. Trata-se, assim, de dados oficiais de um órgão público ligado ao principal agente ambiental brasileiro.

O professor chama atenção ao fato de que as florestas naturais existentes no país, após séculos de uma suposta destruição desenfreada, corresponderem ainda a 60% da superfície do território nacional. Qual país de dimensões continentais preserva tal patrimônio? Será que temos que tornar intocável mais do que isso? Talvez seja chegada a hora de se olhar mais para a poluição que assola os grandes centros urbanos e que passa despercebida aos olhares quase sempre atentos das ONGs ambientalistas internacionais ao invés de apenas enxergar a Amazônia como santuário ecológico.

Portanto, a mandatária maior da República não precisa ficar na defensiva. Muito pelo contrário, tem toda a autoridade do mundo para, de cabeça erguida, exigir que os outros países marchem junto com o Brasil na proteção do meio ambiente, sem a truculência de romper diálogos com quem quer que seja. Essa, aliás, não era a prática de seu antecessor e nem pertence à tradição democrática brasileira, mais assemelhando com o discurso oficial imperialista.

De repente, plantadores de soja, reflorestadores de eucalipto e pecuaristas passaram a integrar o “eixo do mal” ambiental. Será necessário que Lula volte a disputar a Presidência da República tendo como candidato a vice um representante do agronegócio para os esquerdistas perderem o medo, tal como aprenderam a estimar o ex-diabólico industrial capitalista José Alencar?

Na discussão sobre desmatamento, não é de bom alvitre colocar todos no mesmo saco, com o risco de sobrar até para quem se acha acima do bem e do mal.

Vera Romariz: Vida Boa

Crônica da poetisa e escritora Vera Romariz:


Vida Boa

Se sentia cana de açúcar virando bagaço, espremida no moinho. A contragosto. O pai negro e bonito namorando na praça da cidade pequena, exibindo como troféu a mulher mais jovem. E a mãe branca em casa, no espaço desocupado de afeto. Ele brandia a nova situação como uma espada, na frente da filha, fingindo esconder o óbvio. Queria que ela contasse. Mas ela queria apenas vida boa. Direito de menina.

Ela queria comer pipoca, sorrir com amigas, soltar balões desajeitados, ficar em cena como as pastoras dos folguedos de Natal na cidade. Não conto, pai, não conto. Que você conte. A mãe reclamava das ausências. Não para em casa. Que coisa! E ela no moinho, apertada, perdendo o suco precioso da infância. Vida boa. Direito de menina. Queria... Podia?

A cidade cochichava, falava, gritava. Quem mandou casar com um negro? A menina negra, bagaço de cana, entreviu na situação doída um desejo de cumplicidade. Ficar ao lado do pai, pele negra como a dela, bonito como ela. Podia? E a casa desocupada? Boniteza da pele do pai. Milho tostado e corado nas fogueiras de São João. Gostava de ver-se nele. Mas ele queria que ela contasse. E ela só queria vida boa, direito de menina.

Amanheceu e não anoiteceu, diziam as línguas agitadas como lança de cavalhada. A cidade cochichava, falava, gritava. Cruel. Quem mandou casar com negro? Deixou os filhos, a mulher esvaziada de afetos, e fugiu com o novo brinquedo. Susto passado, a menina ficou feliz por não ter contado. Olhou a própria pele, se sentiu estranha. Voltou à praça, ao Pastoril, às pipocas, e teceu com maldade de adulto a própria vingança. Costurou com tecido de pele negra uma vida boa. Direito de menina.

sexta-feira, 3 de junho de 2011

A batalha das redes sociais

Meu artigo publicado na Gazeta de Alagoas, no Vermelho, na Tribuna do Sertão e no Santana Oxente:


Com o surgimento das revoltas árabes, quando centenas de milhares de manifestantes tomaram as ruas do Cairo e das principais cidades de outros Países da região, consolida-se o fenômeno da geração das redes sociais que se espalhou pela Europa através do movimento dos indignados.

De lá para cá são crescentes as tentativas de interpretações dessa onda de concentrações coletivas que devem se espalhar pelos diversos continentes. Algumas delas atribuem a esse novo despertar das massas às revoluções tecnológicas contemporâneas associadas a uma espécie de militância de novo tipo.

Na verdade as multidões que vão sacudindo o velho continente estão se rebelando mesmo é contra as consequências da crise da nova ordem liberal que vai fazendo água por todos os lados inclusive onde os partidos socialistas governam e que também adotaram cortes no setor social e ajustes fiscais penalizando terrivelmente o mundo do trabalho e segmentos da classe média.

A taxa de desemprego, só na Espanha, já ultrapassa a faixa de 20% da população economicamente ativa e entre os jovens esse índice atinge o alarmante número de 40%. Assim, o Partido Socialista Espanhol foi massacrado nas recentes eleições porque sofreu a defecção do eleitor de esquerda justamente revoltado contra as medidas econômicas do governo socialista de Zapatero.

No Brasil, como que se antecipando à possibilidade dessas manifestações onde as redes sociais jogam destacado papel de convocação, o maior jornal conservador do País disparou um ensaio sobre o conteúdo ideológico dessas ferramentas e de um hipotético novo tipo de ativista, o anarquista cibernético, que é contra os sindicatos, os partidos e qualquer tipo de política. Foi o que tentou promover os EUA nas revoltas árabes.

Porém as redes sociais são ferramentas de comunicação, assim como o telefone, a Internet, e até como foi o telégrafo, à época. Todos foram ao seu tempo revoluções tecnológicas, e ponto. O decisivo mesmo são as idéias que se divulgam seja ao telefone, nas redes sociais, o que sai na Internet, nos jornais ou na TV etc.

Sem alternativas à falência da nova ordem mundial e a uma crise de civilização por ela mesmo erigida, os conservadores buscam uma saída contra a crescente insubordinação popular diante do desastre econômico e social provocado pelas políticas neoliberais. Para isso, tentam divulgar uma ideologia de escapismo desprovida de toda consciência política.

quinta-feira, 2 de junho de 2011

Alagoas: o clamor das ruas

              Manifestação contra o governo estadual, em foto do jornalista Bruno Soriano, publicada na Gazetaweb

Mais uma vez nas ruas, diversas categorias do funcionalismo de Alagoas, em luta pelo reajuste de seus salários e melhorias tanto dos serviços quanto das condições de trabalho, numa grande manifestação contra o governo do Estado, com a participação de estudantes, saíram em passeata pelas ruas do Centro de Maceió e concentraram-se em frente à sede da Assembleia Legislativa de Alagoas, na Praça D. Pedro II, nesta quarta-feira, 01/06.

Participaram do ato os sindicatos dos servidores públicos, as Centrais Sindicais CTB, CUT, CGTB e CSP, partidos políticos, dentre os quais o PCdoB, as entidades estudantis UNE e UBES, lideranças de várias faculdades particulares, além dos DCE´s da UFAL, da UNEAL e da UNCISAL, e organizações da juventude.

A presença dos estudantes, além da solidariedade com os servidores, reflete a situação dos cada vez mais graves problemas estruturais no Estado de Alagoas, em especial na educação, saúde e segurança, que têm afetado seriamente a população alagoana.

quarta-feira, 1 de junho de 2011

Aldo Rebelo: O Código Florestal e a quinta coluna

Artigo de Aldo Rebelo, relator do projeto de lei do Novo Código Florestal Brasileiro aprovado pela Câmara dos Deputados, publicado no Vermelho:


Conta a lenda que ao cercar Madri durante a Guerra Civil Espanhola o general Emilio Mola Vidal ao ser questionado sobre qual das quatro colunas que comandava entraria primeiro na cidade sitiada, respondeu: a quinta coluna. Mola referia-se aos seus agentes, que de dentro sabotavam a resistência republicana.

Durante a Segunda Guerra Mundial a expressão tornou-se sinônimo de ações contra o esforço aliado na luta para derrotar o eixo nazi-fascista. A quinta coluna disseminava boatos, procurava enfraquecer e neutralizar a vontade da resistência e desmoralizar a reação contra o inimigo.

Após a votação do Código Florestal, no último dia 24, um restaurante de Brasília acolheu os principais "cabeças" das ONGs internacionais para um jantar que avançou madrugada adentro. A Câmara acabara aprovar por 410 x 63 votos o relatório do Código Florestal e derrotara de forma avassaladora a tentativa do grupo de pressão externo de impedir a decisão sobre a matéria. O ambiente era de consternação pela derrota, mas ali nascia a tática da quinta coluna moderna para pressionar o Senado e o governo contra a agricultura e os agricultores brasileiros. Os agentes internacionais recorreriam à mídia estrangeira e espalhariam internamente a ideia de que o Código "anistia" desmatadores e permite novos desmatamentos.

A sucessão dos fatos ilumina o caminho trilhado pelos conspiradores de botequim. No último domingo o Estado de São Paulo abriu uma página para reportagem assinada pelas jornalistas Afra Balazina e Andrea Vialli com a seguinte manchete: Novo Código permite desmatar mata nativa em área equivalente ao Paraná. Não há, no próprio texto da reportagem, uma informação sequer que confirme o título da matéria. É evidente que o projeto votado na Câmara não autoriza desmatamento algum. O que se discute é se dois milhões de proprietários que ocupam áreas de preservação permanente (margem de rio, encostas, morros) devem ser expulsos de suas terras ou em que proporção podem continuar cultivando como fazem há séculos no Brasil, à semelhança de seus congêneres em todo mundo.

No jornal O Globo, texto assinado por Cleide Carvalho, procura associar o desmatamento no Mato Grosso ao debate sobre o Código Florestal e as ONGs espalham por seus contatos na mídia a existência de relação entre o assassínio de camponeses na Amazônia e a votação da lei na Câmara dos Deputados. O Guardian de Londres publica artigo de um dos chefetes do Greenpeace com ameaças ao Brasil pela votação do Código Florestal. Tratam-nos como um enclave colonial carente das lições civilizatórias do império.

As ONGs internacionais consideram toda a área ocupada pela agropecuária no Brasil, passivo ambiental que deve ser convertido em floresta. Acham razoável que milhões de agricultores sejam obrigados a arrancar lavoura e capim e plantar vegetação nativa em seu lugar, em um país que mantém mais de 60% de seu território de áreas verdes.

A "anistia" atribuída ao relatório não é explicada pelos que a denunciam, nem a explicação é cobrada pela imprensa. Apenas divulgam que estão "anistiados" os que desmataram até 2008. Quem desmatou até 2008? Os que plantaram as primeiras mudas de cana no Nordeste e em São Paulo na época das capitanias hereditárias? Os primeiros cafeicultores do Pará, Rio de Janeiro e São Paulo no século XVIII? Os colonos convocados pelo governo de Getúlio Vargas para cultivar o Mato Grosso? Os gaúchos e nordestinos levados pelos governos militares para expandir a fronteira agrícola na Amazônia? Os assentados do Incra que receberam suas terras e só tinham acesso ao título de propriedade depois do desmatamento?

É importante destacar que pela legislação em vigor são todos "criminosos" ambientais submetidos ao vexame das multas e autuações do Ministério Público e dos órgãos de fiscalização. Envolvidos na teia de "ilegalidade" estão quase 100% dos agricultores do País por não terem a Reserva Legal que a lei não previa ou mata ciliar que a legislação de 1965 estabelecia de cinco a 100 metros e na década de 1980 foi alterada para 30 até 500 metros.

Reconhecendo o absurdo da situação, o próprio governo em decreto assinado pelo presidente Lula e pelo ministro Carlos Minc suspendeu as multas em decorrência da exigência "legal", cujo prazo expira em 11 de junho e que provavelmente será re-editado pela presidente Dilma.

O governo e o País estão sob intensa pressão da desinformação e da mentira. A agricultura e os agricultores brasileiros tornaram-se invisíveis no Palácio do Planalto. Não sei se quando incorporou à delegação da viagem à China os suinocultores brasileiros em busca de mercado no gigante asiático a presidente tinha consciência de que quase toda a produção de suínos no Rio Grande do Sul, Santa Catarina e Paraná está na ilegalidade por encontrar-se em área de preservação permanente.

A Câmara dos Deputados, por grande maioria, mostrou estar atenta aos interesses da preservação ambiental e da agricultura, votando uma proposta que foi aceita por um dos lados, mas rejeitada por aqueles que desconhecem ou precisam desconhecer a realidade do campo brasileiro. O Senado tem agora grande responsabilidade e o governo brasileiro precisa decidir se protege a agricultura do País ou se capitulará diante das pressões externas que em nome do meio ambiente sabotam o bem-estar do nosso povo e a economia nacional.