domingo, 28 de novembro de 2010

Conjuntura impõe mudança na política econômica

                                      Renato Rabelo na abertura da reunião do Comitê Central do PCdoB 



Estive neste fim de semana (26 a 28/11) participando da reunião da direção nacional do PCdoB, realizada em São Paulo, onde foram tratadas questões bastante relevantes – o balanço das últimas eleições, a transição do governo federal, a crise econômica internacional do capitalismo, a guerra cambial, a conjuntura atual e a necessidade de mudança da política econômica pelo próximo governo.

O presidente nacional do PCdoB, Renato Rabelo, em seu pronunciamento ao encerrar na tarde deste domingo a reunião, referindo-se à política econômica que tem sido praticada e às primeiras declarações da equipe indicada por Dilma para tratar do tema, sustentou que “a atual política está se esgotando porque a situação externa mudou”. A nova conjuntura, marcada pelo agravamento da crise do capitalismo e pelo acirramento da concorrência internacional, impõe o redirecionamento da política econômica.

As tarefas mais imediatas neste terreno, sugeridas pelo Comitê Central, são defender a economia e a moeda nacional como um imperativo de soberania em face da guerra cambial e comercial deflagrada pelos EUA, cuja política monetária é um risco mundial.

Renato Rabelo, em relação ao governo de Dilma Roussef, destacou que “o partido vai se esforçar pelo êxito do governo, procurando impulsionar mudanças. Para nós o êxito do governo significa avançar nas mudanças”.

O texto integral da intervenção feita por Renato Rabelo na abertura da reunião pode ser encontrada no endereço:

http://renatorabelobr.blogspot.com/2010/11/terceira-grande-vitoria-do-povo-com.html

sexta-feira, 26 de novembro de 2010

Centralidades

Volto a escrever artigos para a Gazeta de Alagoas, Tribuna do Sertão e Vermelho.org; segue, como de costume, o texto na íntegra:

De volta a este espaço semanal após um breve intervalo decorrente da campanha eleitoral passo a reencontrar-me com o leitor regularmente todas as semanas. Desde logo, agradeço publicamente os quase 140 mil votos ao Senado da República nessas eleições passadas.
O que faz aumentar imensamente a responsabilidade sobre as minhas convicções porque durante o período eleitoral expressei exatamente aquilo em que acredito e se não fui mais claro sobre as minhas ideias talvez tenha sido por insuficiências próprias no diálogo com os alagoanos durante o guia eleitoral e no contanto direto com os cidadãos e cidadãs da minha terra.
Mas devo dizer que essa campanha foi de um lado uma das mais acirradas e agressivas desses últimos tempos e por outro lado transformou-se em uma batalha campal de agressões pessoais e estereótipos de toda a ordem.
A ausência de um real embate programático, com propostas e soluções, praticamente determinou o rumo e o ritmo do processo eleitoral que foi pautado pela difusão de preconceitos e baixarias de todos os tipos. E tal fenômeno explicitou-se em todos os níveis, principalmente em âmbito nacional.
A consequência da difusão de ideias retrógradas no pleito, como instrumento para desqualificar adversários, foi tão intensa que os seus efeitos colaterais se fazem sentir até os dias atuais e creio que perdurarão ainda por um bom período de tempo.
A nível nacional a abordagem de temas complexos como o aborto, por exemplo, não foi conduzido com a grandeza e a seriedade que efetivamente merecem. O resultado foi um festival de hipocrisia e falso moralismo dignos dos piores tempos obscurantistas.
Outra sequela resultante de um clima intolerante e dogmático tem sido a difusão do ódio regional como há muito não se via no Brasil.
Os nordestinos e nortistas foram e têm sido alvos de estúpidos ataques nitidamente segregacionistas e racistas por parte de uma minoritária e arrivista elite, mais especificamente a paulista.
O que transparece é que ela, mais uma vez ao longo da nossa recente História nacional, sente-se incomodada em pertencer à condição de ser brasileira. Ora, essa é uma antiga e recorrente manifestação dos quatrocentões da paulicéia.
Por isso é que se impõe a necessidade da abordagem teórica e política da unidade nacional e a sua centralidade, como algo indeclinável à sobrevivência da nossa integridade cultural e territorial enquanto nação.

PCdoB homenageia Aurélio Peres e seus líderes na Câmara dos Deputados

                                      Renato Rabelo e Aurélio Peres ladeados por parlamentares do PCdoB


                                                        Nosso abraço no amigo Aurélio Peres 

Participei de uma emocionante homenagem ao nosso amigo Aurélio Peres nesta quarta-feira, 24/11, na Câmara dos Deputados em Brasília. O PCdoB, por meio de sua Liderança na Câmara, prestou uma homenagem a Aurélio Peres, primeiro deputado federal metalúrgico do Brasil, incluindo o seu retrato na galeria de líderes do PCdoB na Câmara.

Para mim, Aurélio Peres sempre foi uma referência e motivo de respeito e admiração. Operário, comunista, eleito em 1978 exerceu seu mandato em plena ditadura. Foi eleito deputado federal pelo MDB porque na época o Partido Comunista do Brasil estava na clandestinidade. Sua eleição marcou a história do PCdoB na Câmara.

Eleito deputado federal constituinte em 1986, não me esqueço das palavras de Aurélio Peres para mim: “Saí do mandato a mesma pessoa de quando o iniciei, não se deixe transformar pelas formalidades e aparências do poder”.

Aurélio Peres, que há mais de 20 anos não visitava o Congresso, emocionou-se com a homenagem. O histórico comunista estava acompanhado de sua mulher, Maria da Conceição Peres, e dos filhos. Aurélio Peres falou de seu mandato: “Foi muito dolorido, o que eu sabia de bancada era a bancada de fazer ferramenta. Eu era um operário, (...) mas fui até o fim porque amei e sempre amarei este Partido”.

Os retratos dos dois últimos líderes, Daniel Almeida (BA) e Vanessa Grazziotin (AM), também foram incluídos na galeria. A deputada Vanessa, atual líder, foi eleita senadora nas eleições de outubro.

                                                        Aurélio Peres e o deputado Aldo Rebelo 

Participaram do evento o presidente nacional do partido, Renato Rabelo, os deputados Aldo Rebelo (SP), Daniel Almeida (BA), Osmar Júnior (PI), Flávio Dino (MA), Vanessa Grazziotin (AM), Manuela d'Ávila (RS), Chico Lopes (CE), Jô Moraes (MG), Perpétua Almeida (AC), Edmilson Valentim (RJ), os deputados eleitos em outubro Assis Melo (RS), Luciana Santos (PE) e Protógenes (SP), o prefeito de Olinda, Renildo Calheiros.

Coube ao presidente do PCdoB, Renato Rabelo, estender os elogios a todos os deputados, a quem definiu como cartão de visita do Partido. “É através da atuação deles que a sociedade conhece o que pensa e como age o PCdoB”, afirmou o líder comunista.

Ele disse que a galeria de fotos conta a história de atuação dos comunistas na Câmara, desde o tempo em que os representantes do Partido estavam abrigados no antigo MDB, porque a legenda estava na clandestinidade, perseguida pela ditadura militar.

Rabelo lembrou a história de vida e militância do homenageado, que participou da luta pela anistia, num mandato com muitas dificuldades. Segundo Renato Rabelo, “como no filme O Baile de Ettore Scola, é possível ler a história do nosso país observando os líderes que corajosamente lutaram e lutam em defesa do nosso povo dentro do Parlamento; nos faltava a justa homenagem ao operário Aurélio, que sozinho enfrentou este desafio quando ainda vivíamos sob a ditadura militar”.

segunda-feira, 22 de novembro de 2010

Bacelar: preconceito contra nordestino é contra pobre

A seguir, texto a respeito das manifestações preconceituosas contra a população nordestina, da  socióloga e economista Tânia Bacelar, que concedeu entrevista ao site do Instituto Humanitas Unisinos


Tânia Bacelar: Preconceito contra nordestino é contra pobre


A eleição de Dilma suscitou duas questões importantes que precisam de reflexão e discussão no Brasil: o movimento conservador, que levantou bandeiras preconceituosas durante as eleições movendo votos consideráveis e, também, o crescimento da discussão política que envolve a atuação do Nordeste, antes esquecido e renegado no ‘canto do país’. Em entrevista ao Instituto Humanitas Unisinos, a professora e economista Tânia Bacelar discute esses assuntos.


“O Nordeste tem 28% da população total do Brasil, mas tem metade dos que ganham salário mínimo no país. Nesse sentido, o Nordeste foi bastante beneficiado por essa política (do atual governo). Aumento de renda significa aumento de consumo e o aumento de consumo destacou a economia do Brasil, mas, particularmente, do Nordeste”, relatou durante a entrevista que concedeu por telefone.

Leia o resto da entrevista, publicada no Vermelho, clicando aqui.

sexta-feira, 19 de novembro de 2010

De novo, a inquisição literária brasileira

Um século de história censurado pela inquisição literária brasileira



Após a tentativa de proibição de Caçadas de Pedrinho, do escritor Monteiro Lobato, patrimônio cultural brasileiro – o autor e a obra –, uma decisão judicial pretende insistir na censura literária, uma inquisição baseada na falta de conhecimento e no conservadorismo.

Desta vez, o Tribunal de Justiça de São Paulo atendeu em parte o pedido feito pelo Instituto Nacional de Defesa do Consumidor, e proibiu a distribuição do livro Os Cem Melhores Contos Brasileiros do Século na rede estadual de ensino de SP.

O motivo, segundo a liminar assinada pelo desembargador Fernando Antônio Maia da Cunha, presidente da Seção de Direito Privado do Tribunal, foi o conteúdo “inapropriado” para estudantes entre 11 e 17 anos de três dos textos que são consideradas obras-primas da história literária brasileira.

Foram censurados escritores da ordem de Graciliano Ramos, Clarice Lispector, Machado de Assis, Rubem Braga, Drummond e Lima Barreto. São ilustres representantes da todas as etapas da formação do Brasil, que não podem mais chegar gratuitamente às mãos da juventude paulista pela rede pública de ensino.

Um triste exemplo para as novas gerações e uma mácula em nossa jovem democracia.

Diálogo pela democracia

O advogado Paulo Brêda representou a OAB na mesa da sabatina sobre reforma política

Retomando os agradecimentos, como prometido, falo desta vez da Ordem dos Advogados do Brasil e do seu presidente em Alagoas, Omar Coelho. Parabéns à entidade pelos debates promovidos durante a campanha eleitoral ao Senado da República, salutar para a construção de diálogos democráticos a respeito dos rumos do país, e pelo respeito à pluralidade de opiniões.


Além de Omar, cumprimento também o advogado e companheiro Gilberto Irineu, que compareceu ao debate

Lição de um tigre asiático

A Resenha Estratégica mais uma vez traz uma análise importante a respeito da economia brasileira, desta vez vislumbrando as escolhas a fazer em relação a sua soberania nacional, de desregulamentação do sistema financeiro, de um lado, e do exemplo da Malásia, o tigre asiático que adotou uma política econômica contrária ao que desejava o Fundo Monetário Internacional (FMI), porta-voz do neoliberalismo, de outro. O texto segue na íntegra:

O que o Brasil em 2010 pode aprender com a Malásia de 1998
 
17 de novembro de 2010 (www.msia.org.br) - Em setembro de 1998, em meio ao furacão que se abateu sobre os mercados financeiros asiáticos, o Governo da Malásia adotou soberanamente um regime de controle de câmbio seletivo, juntamente com outras medidas emergenciais de proteção dos interesses nacionais. A medida demonstrou ao mundo que, mesmo uma nação que estava longe de alinhar-se entre as mais poderosas em termos econômicos e políticos, poderia sobreviver rechaçando totalmente os ditames da oligarquia anglo-americana e do Fundo Monetário Internacional (FMI), que exigiam mais monetarismo, mais "globalismo" e mais "livre mercado". Um ano depois, foi possível comprovar que a Malásia teve êxito, enquanto as nações que seguiram ao pé da letra aquelas receitas ainda enfrentavam sérios problemas econômicos e a ameaça de ruína.
No segundo semestre de 1998, a Ásia estava sendo devastada por uma onda de especulação e desintegração financeira, com uma horda de especuladores como George Soros, respaldados pelos órgãos multilaterais que supervisionam as finanças mundiais, desfechando ataques impiedosos contra as moedas e as economias da Malásia, Tailândia, Coréia do Sul e Indonésia.
A crise havia se iniciado um ano antes, em julho de 1997, quando o governo da Tailândia, sob um implacável ataque especulativo contra a moeda nacional, o baht, tomou a decisão de desvinculá-la do dólar estadunidense e deixá-la "flutuar", medida logo seguida pela Malásia. Ao final do ano, o ringgit malaio havia se desvalorizado em 50% e o índice KLSE da Bolsa de Kuala Lumpur havia caído na mesma proporção.
Em 1º de setembro de 1998, o primeiro-ministro malaio Mahathir bin Mohamad deixou estupefatos a City de Londres e Wall Street, ao impor um controle seletivo de capitais, assim como um estrito controle do câmbio: os fluxos especulativos de "dinheiro quente" não podiam mais entrar na Malásia para saqueá-la e fugir em seguida. Mahathir suspendeu de fato a atividade do Central Limit Order Book, de Cingapura, de onde os especuladores estavam atacando a Bolsa de Kuala Lumpur. Além disso, aumentou o crédito bancário para a indústria e a agricultura e ampliou significativamente o orçamento público para o desenvolvimento da infraestrutura.
Diante do perigo, os financistas da City, Wall Street e seus porta-vozes responderam raivosos e com ameaças. Uma breve amostra das respostas ilustra a temperatura política daquele momento. 
Em 10 de setembro, a agência de avaliação de risco Fitch divulgou um boletim afirmando: "A recente imposição do controle de câmbio minou seriamente a confiança dos investidores estrangeiros na Malásia e coloca a economia em situação insustentável, o que poderá afetar adversamente o seu crédito externo." Ato contínuo, a agência rebaixou os títulos da dívida malaia à categoria F3, equivalente a "lixo".
Em 21 de setembro, a Dow Jones se manifestou: "As restrições do governo da Malásia, efetivamente, tirarão o país do rol dos investimentos, aos olhos dos investidores e dos agentes de investimento, que operam fora do país."
O próprio Soros escreveu em seu livro A crise do capitalismo global, publicado no final do ano: "Alguns países, como a Malásia, podem ir a pique, se persistirem em suas medidas xenófobas contra o livre mercado."

Em 16 de novembro, se juntou ao coro dos irados o então vice-presidente dos EUA, Al Gore, em um célebre discurso proferido na cúpula do Foro de Cooperação Econômica Ásia-Pacífico (APEC), em Kuala Lumpur, quando criticou as medidas protecionistas tomadas por Mahathir, afirmando "se deveria permitir ao livre mercado realizar a sua magia", e que "o protecionismo só nos protege da própria prosperidade". Com arrogância, Gore elogiou as manifestações públicas contra o governo malaio proferidas por círculos políticos ligados ao eixo Wall Street-City e ao FMI.

Medidas de guerra financeira

O conjunto de medidas ditado por Mahathir se baseou em quatro diretrizes principais:
1) Controle seletivo de capitais. Deteve a especulação contra o país e a entrada e saída de "dinheiro quente". A medida pôs fim à compra e venda ilícita de ações da Malásia fora do país. Segundo, impôs o controle de câmbio. A moeda já não flutuaria nem seria intercambiada livremente. Os possuidores de ringgits no exterior teriam que levá-los de volta ao país antes de certa data, após a qual perderiam o seu valor. A compra de dólares passou a exigir a comprovação de que seriam usados para propósitos econômicos legítimos. Além disso, o câmbio do ringgit foi fixado em 3,80 por dólar. Isto estabilizou a moeda e evitou que o Banco Negara, o banco central do país, tivesse que gastar (e, possivelmente, perder) uma grande quantidade de suas divisas estrangeiras, na intenção de sustentar o valor da moeda.
Igualmente, foi imposta uma "quarentena" de um ano aos investimentos em títulos e ações no país, o dinheiro proveniente do exterior não poderia abandoná-lo antes de um ano. O controle deteve a especulação de tal modo que, em fevereiro de 1999, considerou-se que a medida poderia ser afrouxadas, sendo então adotado um imposto sobre a remessa de lucros para fora do país, enquanto a soma principal dos investimentos estrangeiros ficava isenta dele. A medida bloqueou os investimentos "quentes" de curto prazo, já que os lucros não poderiam ser retirados sem ter que pagar impostos significativos. A desvalorização do ringgit e a especulação estrangeira a curto prazo foram detidas.
2) Juros baixos e liquidez para a economia real. Durante a crise especulativa, a economia física do país se contraiu, enquanto os enfraquecidos bancos nacionais diminuíam os empréstimos, o que ameaçava um derretimento ainda mais profundo da economia física. Diante da recomendação clássica do amargo "remédio monetarista" do FMI, o aumento dos juros e a restrição do crédito, Mahathir decidiu tomar um rumo oposto. Por sua sugestão, o Banco Negara reduziu os juros básicos, que eram de 11% em junho de 1998, até 6%, em junho de 1999. Ao mesmo tempo, o banco determinou a redução do encaixe obrigatório, as reservas monetárias que cada banco deve manter em caixa, dos 13,5% de fevereiro de 1998, para 6%. A redução das reservas liberou esses recursos para novos empréstimos e aumentou a liquidez do sistema bancário, para favorecer a indústria e a agricultura.
3) Aumento do orçamento para infraestrutura e combate à pobreza. Em julho de 1998, o governo criou um fundo especial de 5 bilhões de ringgits para investimentos em infraestrutura, especialmente, ferrovias, portos, rodovias, obras de abastecimento de água, drenagem e esgotos. Além do fundo, também foi dada especial relevância no orçamento aos programas de proteção dos setores de baixa renda dos efeitos adversos da crise financeira, incluindo programas de habitações de baixo custo e abastecimento. Com isso, foi evitada uma explosão social que acometeu várias nações vitimadas pela crise, como a Indonésia e outras.
4) Reorganização de empresas financeiras. Foram criadas três entidades financeiras específicas: 
- Danaharta, empresa de administração de ativos, para enfrentar o problema do grande número de empréstimos vencidos nas carteiras dos bancos nacionais;
- Danamodal, orientada para capitalizar e consolidar o sistema bancário, injetando capital nos bancos problemáticos; e o
- Comitê de Restruturação da Dívida Empresarial, para facilitar a reestruturação e redução de dívidas das empresas viáveis.
A reorganização bancária e da dívida das empresas foi um aspecto auxiliar, mas benéfico de todo o pacote. Posteriormente, Mahathir afirmou que, quando concebeu a idéia de impor o controle seletivo de capitais, se defrontou com uma certa resistência em seu gabinete, principalmente, do ministro da Fazenda Anwar Ibrahim, notoriamente vinculado aos interesses da City e de Wall Street, demitido sumariamente em 2 de setembro (e, em 1999, sentenciado a seis anos de prisão por acusações de corrupção).

Resultados

A despeito do forte impacto da crise na economia malaia, os resultados das ações protecionistas adotadas por Mahathir foram imediatos: 
- entre junho de 1998 e junho de 1999, a produção de automóveis aumentou em 112%;
- no mesmo período, a produção de ferro e aço aumentou 41%;
- a produção de alimentos registrou um aumento de 16%;
- em junho de 1998, o volume de crédito oferecido pelo sistema bancário aos setores industriais e agrícolas foi de 4,98 bilhões de ringgits; em fevereiro de 1999, a oferta de crédito atingiu uma média semanal de 6,55 bilhões de ringgits.
O que Mahathir demonstrou foi o funcionamento de uma política econômica orientado pelo princípio da soberania do Estado nacional. Por ocasião da "crise asiática", a Malásia era uma pequena nação de 22 milhões de habitantes, mas a determinação política das suas lideranças a fez resistir ao ataque implacável dos financistas internacionais e derrotá-los. Com isso, a Malásia foi o primeiro país a emergir da crise, deixando um exemplo concreto do que um Estado soberano pode fazer diante das forças financeiras aparentemente implacáveis, se tiver à frente um líder determinado e comprometido com o bem comum.

domingo, 14 de novembro de 2010

Brasil, finalista do Mundial de vôlei




A garra, a graça e a competência das meninas brasileiras, finalistas do campeonato mundial de vôlei no Japão.

ATUALIZADA ÀS 20h30

Parabéns às jogadoras brasileiras do mundial de vôlei, que protagonizaram uma bonita batalha contra as russas, e voltam para casa com uma medalha de prata.

Resenha Estratégica: A Reserva Federal e o câncer monetário

A Resenha Estratégica, uma revista eletrônica da qual sou assinante, publicou, em sua última edição, um excelente texto a respeito das medidas econômicas adotadas pela Reserva Federal dos Estados Unidos para responder ao baixo crescimento do país e à crise mundial financeira, e o papel das nações emergentes, como Brasil e Índia, no atual contexto. Segue o texto na íntegra:

Reserva Federal propõe metástase global para combater câncer monetário



10 de novembro de 2010 (www.msia.org.br) - A esperada decisão do Sistema da Reserva Federal dos EUA de injetar mais 600 bilhões de dólares no sistema financeiro com a compra de títulos do Tesouro, anunciada na quarta-feira 3 de novembro, sinaliza um ponto de inflexão talvez determinante para os desdobramentos da crise sistêmica global. A medida, que tornou ainda mais carregada a atmosfera na qual deverá ocorrer a cúpula do G-20 em Seul, em 11-12 de novembro, colocou os EUA numa posição antagônica à praticamente todo o resto do mundo e, principalmente, sinalizou de forma ostensiva a determinação da cúpula do Establishment oligárquico de preservar a qualquer custo o sistema financeiro mundial em sua presente forma.

O "recado", dado com a arrogância típica dos altos serviçais do Establishment, foi transmitido sem meias palavras pelo economista Stanley Fischer em entrevistas publicadas em vários jornais do planeta, entre eles os brasileiros O Globo e O Estado de S. Paulo. Fischer, que já foi o segundo em comando no Fundo Monetário Internacional (FMI) e atualmente preside o Banco Central de Israel (além de ter sido orientador de tese do atual presidente da Reserva Federal, Ben Bernanke), deixou quaisquer pudores de lado e colocou os fatos com a sutileza de um capo da Camorra:

(...) No fundo, o problema principal consiste em saber como distribuir a conta do ajuste e se os mercados estão em condições de distribuí-la bem. A outra questão é o que vai fazer a China. Se mantiver seu câmbio atrelado ao dólar, um peso maior do ajuste será descarregado sobre os demais países... Há outra maneira de considerar o problema. Há a hipótese A, em que os EUA adotam os mecanismos de afrouxamento quantitativo, inundam o resto do mundo com capitais e provocam excessiva valorização cambial, mas retomam o crescimento, todos podem voltar a exportar para eles. E há a hipótese B, em que os EUA não fazem nada, não há essa enorme pressão sobre os mercados de câmbio, mas o crescimento econômico americano se mantém baixo por muito tempo. Eu prefiro a hipótese A. A gente tem de trabalhar com os instrumentos que tem. A situação ideal é aquela em que todos os países colaboram no ajuste, incluindo a China. Prefiro que os EUA saibam o que fazer para voltar a crescer.

Evidentemente, Fischer descarta qualquer alternativa protecionista como linha de defesa de países individuais contra a tsunami global.

No mesmo diapasão, o economista Kenneth Rogoff, da Universidade Harvard, teve um artigo divulgado pelo Project Syndicate e publicado em jornais de vários países (inclusive O Globo de 10 de novembro), no qual afirma com todas as letras que os países que não ajudarem os EUA "estão brincando com fogo". Em suas palavras:

Os líderes do G-20 que escarnecem da proposta dos EUA para limites numéricos das balanças comerciais deveriam saber que estão brincando com fogo. Os EUA não estão fazendo uma exigência, tanto quanto estão emitindo um apelo por ajuda.

As economias emergentes foram alvos preferenciais da retórica belicosa de Rogoff:

Índia, Brasil e China, por exemplo, continuam a explorar as regras da Organização Mundial do Comércio que permitem longos e graduais períodos para a abertura plena dos seus mercados domésticos às importações dos países desenvolvidos, mesmo quando os seus próprios exportadores desfrutam de pleno acesso aos mercados dos países ricos. Uma defesa canhestra dos direitos de propriedade intelectual agravam o problema, prejudicando as exportações estadunidenses de software e entretenimento.

Um esforço determinado dos países de mercados emergentes que têm saldos comerciais, no sentido de expandir as importações dos EUA (e da Europa) faria mais para corrigir os desequilíbrios comerciais globais a longo prazo do que alterações nas suas taxas de câmbio ou políticas fiscais. Os mercados emergentes se tornaram muito importantes para se permitir que continuem a atuar pelas suas próprias regras comerciais. Os seus líderes devem fazer mais para enfrentar os interesses estabelecidos domésticos e incentivar a competição externa.

Como se percebe, Bernanke, Rogoff, Fischer e caterva continuam aferrados aos disfuncionais e falidos axiomas que levaram o sistema financeiro e a economia mundiais a um impasse terminal, entre eles, o "livre comércio". Ou seja, o que pretendem é nada menos que acelerar a metástase de um sistema levado a um estado terminal pelo câncer da financeirização que se espalhou pelo mundo após a ruptura do velho sistema de Bretton Woods, o qual possibilitou duas décadas e meia dos maiores índices de desenvolvimento per capita da História. O recém-falecido economista Angus Maddison, especialista em estatísticas econômicas históricas, aponta que, entre 1950 e 1973, a diferença de PIB per capita entre os países mais ricos e os mais pobres caiu, dos 15:1 registrados no período 1913-50, para 13:1; no período 1973-98, na por ele denominada "ordem neoliberal", o índice subiu para 19:1 (e este número não considera o período de agravamento da crise, ao longo da década passada).

Embora não se deva subestimar a capacidade de autoperpetuação do Establishment, o fato é que o presente sistema baseado no controle majoritariamente privado da emissão de moeda e crédito, coordenado por meio de uma rede internacional de bancos centrais "independentes", não mais se coaduna com a complexidade e o dinamismo crescentes das economias modernas. Definitivamente, não é mais possível financiar governos e economias produtivas do século XXI com métodos que remontam à criação do Banco da Inglaterra, no final do século XVII. Esperemos que, a partir de Seul, tal realidade comece a ficar evidente para as principais lideranças políticas mundiais.

terça-feira, 9 de novembro de 2010

Caçada do multiculturalismo


O livro que pretendem censurar, em uma edição antiga, e seu
criador, caricaturado por Theo
(fontes: lobato.globo.com - desenho e afinsophia.wordpress.com - livro)

     

     Recomendo a leitura de importante texto de Aldo Rebelo contra a censura da cultura e da literatura brasileiras pelos tribunais de inquisição do politicamente correto, cuja vítima mais nova foi o grande escritor Monteiro Lobato, pai do Jeca Tatu e responsável pela criação de um mundo ficcional infantil que até hoje faz parte da memória das crianças brasileiras. Segue o artigo publicado na Folha de S. Paulo, que também pode ser conferido no Vermelho:





Aldo Rebelo: Monteiro Lobato no tribunal literário


O parecer do Conselho Nacional de Educação (CNE) de que o livro "Caçadas de Pedrinho" deve ser proibido nas escolas públicas, ou ao menos estigmatizado com o ferrão do racismo, instala no Brasil um tribunal literário.

A obra de Monteiro Lobato, publicada em 1933, virou ré por denúncia -é esta a palavra do processo legal-de um cidadão de Brasília, e a Câmara de Educação Básica do Conselho opinou por sua exclusão do Programa Nacional Biblioteca na Escola.


Na melhor das hipóteses, a editora deverá incluir uma "nota explicativa" nas passagens incriminadas de "preconceitos, estereótipos ou doutrinações". O Conselho recomenda que entrem no índex "todas as obras literárias que se encontrem em situação semelhante".


Se o disparate prosperar, nenhuma grande obra será lida por nossos estudantes, a não ser que aguilhoada pela restrição da "nota explicativa" -a começar da Bíblia, com suas numerosas passagens acerca da "submissão da mulher", e dos livros de José de Alencar, Machado de Assis e Graciliano Ramos; dos de Nelson Rodrigues, nem se fale. Em todos cintilam trechos politicamente incorretos.


Incapaz de perceber a camada imaginária que se interpõe entre autor e personagem, o Conselho vê em "Caçadas de Pedrinho" preconceito de cor na passagem em que Tia Nastácia, construída por Lobato como topo da bondade humana e da sabedoria popular, é supostamente discriminada pela desbocada boneca Emília, "torneirinha de asneiras", nas palavras do próprio autor: "É guerra, e guerra das boas".


Não vai escapar ninguém -nem Tia Nastácia, que tem carne negra". Escapou aos censores que, ao final do livro, exatamente no fecho de ouro, Tia Nastácia se adianta e impede Dona Benta de se alojar no carrinho puxado pelo rinoceronte: "Tenha paciência -dizia a boa criatura. Agora chegou minha vez. Negro também é gente, sinhá...".


Não seria difícil a um intérprete minimamente atento observar que a personagem projeta a igualdade do ser humano a partir da consciência de sua cor. A maior extravagância literária de Monteiro Lobato foi o Jeca Tatu, pincelado no livro "Urupês", de 1918, como infamante retrato do brasileiro. Mereceria uma "nota explicativa"?


Disso encarregou-se, já em 1919, o jurista Rui Barbosa, na plataforma eleitoral "A Questão Social e Política no Brasil", ao interpretar o Jeca de Lobato, "símbolo de preguiça e fatalismo", como a visão que a oligarquia tinha do povo, "a síntese da concepção que têm, da nossa nacionalidade, os homens que a exploram".


Ou seja, é assim que se faz uma "nota explicativa": iluminando o texto com estudo, reflexão, debate, confronto de ideias, não com censuras de rodapé.


O caráter pernicioso dessas iniciativas não se esgota no campo literário. Decorre do erro do multiculturalismo, que reivindica a intervenção do Estado para autonomizar culturas, como se fossem minorias oprimidas em pé de guerra com a sociedade nacional.


Não tem sequer a graça da originalidade, pois é imitação servil dos Estados Unidos, país por séculos institucionalmente racista que hoje procura maquiar sua bipolaridade étnica com ações ditas afirmativas.


A distorção vem de lá, onde a obra de Mark Twain, abolicionista e anti-imperialista, é vítima dessas revisões ditas politicamente corretas. País mestiço por excelência, o Brasil dispensa a patacoada a que recorrem os que renunciam às lutas transformadoras da sociedade para tomar atalhos retóricos.


Com conselheiros desse nível, não admira que a educação esteja em situação tão difícil. Ressalvado o heroísmo dos professores, a escola pública se degrada e corre o risco de se tornar uma fonte de obscurantismo sob a orientação desses "guardiões" da cultura.


Fonte: Folha de S.Paulo

Avelar: a falsa tese do "país dividido"

Leitura fundamental é a do artigo do Idelber Avelar, publicado ao seu blog, O Biscoito Fino e a Massa, e reproduzido pelo Vermelho. Ele questiona a tese do país dividido entre "vermelhos" e "azuis", com base no resultado da votação presidencial, conforme mapa pintado pela grande mídia. Abaixo reproduzo o texto na íntegra.

Idelber Avelar: a falsa tese do “país dividido”

Nem bem contada estava a maior parte dos 55.752.529 votos recebidos por Dilma Rousseff e um insidioso meme começava a circular pelos meios de comunicação brasileiros, especialmente pela Rede Globo de Televisão. Parece que não entendiam, ou se recusavam a entender, o momento histórico que vivíamos. Trata-se da cantilena do “país dividido”, reforçada por um enganoso mapa em que o Brasil aparecia separado entre estados azuis e vermelhos.


Por Idelber Avelar no blog O Biscoito Fino e a Massa


Acompanhado por uma série de bizarras declarações de figuras como W. Waack (“a imprensa criou o mito de Lula e ele se voltou contra ela, ingrato”) ou do inacreditável Merval Pereira (“Dilma deve saber que a oposição teve uma votação muito alta”), o mapa cumpriu o papel de sugerir uma divisão que absolutamente não existe: Dilma venceu com larga margem (12%), que em qualquer democracia presidencialista qualificaria como um sacode-Iaiá. Basta lembrar que na categórica vitória de Obama sobre McCain a diferença foi 52,9% a 45,7%, pouco mais da metade, portanto, da diferença imposta por Dilma a Serra.


Como apontou Alexandre Nodari no seu Twitter, a divisão por estados peca por impor ao Brasil um modelo que é essencialmente estadunidense, baseado no princípio de que o candidato vencedor num determinado estado leva todos os seus votos a um Colégio Eleitoral, numa eleição que é, para todos os efeitos, indireta. No Brasil, como se sabe, o presidente é eleito por sufrágio universal, e nele a ideia de estados “vermelhos” e “azuis” não faz o menor sentido. O mapa do Estadão, colorido por municípios e com várias gradações de azul e vermelho, esse sim, serve a um estudo sério, já iniciado pelo Fabricio Vasselai.


A ideia dos estados azuis e vermelhos faz menos sentido ainda depois de estudado o mapa eleitoral do pleito de 2010. A grande maioria dos estados que aparecem em azul no “país dividido” da TV Globo são unidades da federação em que Serra venceu por mínima diferença: Goiás (50,7%), Rio Grande do Sul (50,9%), Espírito Santo (50,8%), Mato Grosso (51,1%). Não se encontra, na coluna azul, nem rastro de um estado em que a vantagem se compare com a conquistada por Dilma em lugares como Amazonas (80%), Maranhão (79%), Ceará (77%), Pernambuco (75%), Bahia (70%), Piauí (69%) e vários outros. Num país com eleição por sufrágio universal e uma diferença tão acachapante entre os estados “dilmistas” e os “serristas”, só com muita desonestidade intelectual você colore alguns estados de azul e outros de vermelho, sem variação no tom das cores, para apresentar um país “dividido”.


Se a tese do país dividido não tem fundamento, menos ainda o tem a tese do país dividido entre Sul/Sudeste, por um lado, e o Norte/Nordeste, por outro. Não custa lembrar, mas essa divisão grita em desacordo com os fatos: Dilma enfiou goleadas acachapantes em Serra no Rio de Janeiro (60,5% x 39,5%) e Minas Gerais (58,5 x 41,5), além conquistar um empate no Rio Grande do Sul. Não custa lembrar aos jornalistas da Globo: Dilma Rousseff venceu as eleições no Sudeste, caso o fato tenha passado despercebido no Jardim Botânico.


Já na segunda-feira, a mídia brasileira havia conseguido insuflar uma onda divisionista que não demorou em encontrar solo fértil no nosso bom e velho racismo latente. No Twitter, proliferava o discurso do ódio aos nordestinos, desinformado até do básico dado de que Dilma teria ganho eleição mesmo se o Brasil não incluísse o Nordeste. Aludindo de forma desonesta ao “fato” que ela mesma havia ajudado a criar, a Globo relatava que havia um “embate” entre regiões do Brasil nas redes sociais, quando na verdade o único embate se deu entre a sanidade e uma minoria racista e ressentida. Começa mal, muito mal a Vênus Platinada, talvez como consequência do que aconteceu nesta eleição histórica: Dilma venceu o pleito com o debate da Band, desmontou a última armação com um vídeo do SBT e concedeu sua primeira entrevista à Record.


Sinais dos tempos.

domingo, 7 de novembro de 2010

O voto do Nordeste

A economista e socióloga Tânia Bacelar concedeu entrevista ao Diário de Pernambuco sobre artigo que escreveu a respeito do voto nordestino. Intitulado "O voto do Nordeste, para além do preconceito", causou grande repercussão entre os blogs e sites políticos e respondeu às críticas voltadas para a votação elevada obtida pela presidente Dilma na região.

Recomendo a leitura dos dois materiais. Também há um vídeo no link da entrevista que vale à pena ser assistido.


- Entrevista: http://www.diariodepernambuco.com.br/2010/11/07/politica12_0.asp
- Artigo que provocou a entrevista: http://www.vermelho.org.br/noticia.php?id_noticia=139373&id_secao=1

quinta-feira, 4 de novembro de 2010

Três mitos sobre a eleição de Dilma

Recomendo e publico aqui ótimo texto de Marcos Coimbra, presidente do instituto Vox Populi, copiado do blog do jornalista Luís Nassif, que analisa os erros dos discursos simplificados para explicar a vitória de Dilma Rousseff para a presidência do Brasil. Confiram abaixo:


Três mitos sobre a eleição de Dilma


Enviado por luisnassif, dom, 31/10/2010 - 22:59

Por zanuja castelo branco

Três mitos sobre a eleição de Dilma

Marcos Coimbra 31 de outubro de 2010 às 19:25h

Marcos Coimbra desfaz falsas análises a respeito da eleição da petista


Enquanto o País vai se acostumando à vitória de Dilma Rousseff, uma nova batalha começa. Nem é preciso sublinhar quão relevante, objetivamente, é o fato de ela ter vencido a eleição, nas condições em que aconteceu. Ela é a presidente do Brasil e, contra este fato, não há argumentos.


Sim e não. Porque, na política, nem sempre os fatos e as versões coincidem. E as coisas que se dizem a respeito deles nos levam a percebê-los de maneiras muito diferentes.


Nenhuma versão muda o resultado, mas pode fazer com que o interpretemos de forma equivocada. Como consequência, a reduzir seu significado e lhe diminuir a importância. É nesse sentido que cabe falar em nova batalha, que se trava em torno dos porquês e de como chegamos a ele.


Para entender a eleição de Dilma, é preciso evitar três erros, muito comuns na versão que as oposições (seja por meio de suas lideranças políticas, seja por seus jornalistas ou intelectuais) formularam a respeito da candidatura do PT desde quando foi lançada. E é voltando a usá-los que se começa a construir uma versão a respeito do resultado, como estamos vendo na reação da mídia e dos “especialistas” desde a noite de domingo.


O “economicismo” – O primeiro erro a respeito da eleição de Dilma é o mais singelo.


Consiste em explicá-la pelo velho bordão “é a economia, estúpido!”


É impressionante o curso que tem, no Brasil, a expressão cunhada por James Carville, marqueteiro de Bill Clinton, quando quis deixar clara a ênfase que propunha para o discurso de seu cliente nas eleições norte-americanas de 1992. Como o país estava mal e o eleitorado andava insatisfeito com a economia, parecia evidente que nela deveria estar o foco do candidato da oposição.


Era uma frase boa naquele momento, mas só naquele. Na sucessão de Clinton, por exemplo, a economia estava bem, mas Al Gore, o candidato democrata, perdeu, prejudicado pelo desgaste do presidente que saía. Ou seja, nem sempre “é a economia, estúpido!”


Aqui, as pessoas costumam citar a frase como se fosse uma verdade absoluta e a raciocinar com ela a todo momento. Como nas eleições que concluímos, ao discutir a candidatura Dilma.


É outra maneira de dizer que os eleitores votaram nela “com o bolso”.


Como se nada mais importasse. Satisfeitos com a economia, não pensaram em mais nada. Foi o bolso que mandou.


Esse reducionismo está equivocado. Quem acompanhou o processo de decisão do eleitorado viu que o voto não foi unidimensional. As pessoas, na sua imensa maioria, votaram com a cabeça, o coração e, sim, o bolso, mas este apenas como um elemento complementar da decisão. Nunca como o único critério (ou o mais importante).


A “segmentação” – O segundo erro está na suposição de que as eleições mostraram que o eleitorado brasileiro está segmentado por clivagens regionais e de classe. Tipicamente, a tese é de que os pobres, analfabetos, moradores de cidades pequenas, de estados atrasados, votaram em Dilma, enquanto ricos, educados, moradores de cidades grandes e de estados modernos, em Serra.


Ainda não temos o mapa exato da votação, com detalhe suficiente para testar a hipótese. Mas há um vasto acervo de pesquisas de intenção de voto que ajuda.


Por mais que se tenha tentado, no começo do processo eleitoral, sugerir que a eleição seria travada entre “dois Brasis”, opondo, grosso modo, Sul e Sudeste contra Norte, Nordeste e Centro-Oeste, os dados nunca disseram isso. Salvo no Nordeste, as distâncias entre eles, nas demais regiões, nunca foram grandes.


Também não é verdade que Dilma foi “eleita pelos pobres”. Ou afirmar que Serra era o “candidato dos ricos”. Ambos tinham eleitores em todos os segmentos socioeconômicos, embora pudessem ter presenças maiores em alguns do que em outros.


As diferenças no comportamento eleitoral dos brasileiros dependem mais de segmentações de opinião que de determinações materiais. Em outras palavras, há tucanos pobres e ricos, no Norte e no Sul, com alta e com baixa escolaridade. Assim como há petistas em todas as faixas e nichos de nossa sociedade.


Dilma venceu porque ganhou no conjunto do Brasil e não em razão de um segmento.


O “paternalismo” – O terceiro erro é interpretar a vitória de Dilma como decorrência do “paternalismo” e do “assistencialismo”. Tipicamente, como pensam alguns, como fruto do Bolsa Família.


Contrariando todas as evidências, há muita gente que acha isso na imprensa oposicionista e na classe média antilulista. São os que creem que Lula comprou o povo com meia dúzia de benefícios.


As pesquisas sempre mostraram que esse argumento não se sustenta. Dilma tinha, proporcionalmente, mais votos que Serra entre os beneficiários do programa, mas apenas um pouco mais que seu oponente. Ou seja: as pessoas que tinham direito a ele escolheram em quem votar de maneira muito parecida à dos demais eleitores. Em São Paulo e Minas Gerais, por exemplo, os candidatos do PSDB aos governos estaduais foram eleitos com o voto delas.

Os três erros têm o mesmo fundamento: uma profunda desconfiança na capacidade do povo. É o velho preconceito de que o “povo não sabe votar” que está por trás do reducionismo de quem acha que foi a barriga cheia que elegeu Dilma. Ou do argumento de que foram o atraso e a ignorância da maioria que fizeram com que ela vencesse. Ou de quem supõe que a pessoa que recebe o benefício de um programa público se escraviza.


É preciso enfrentar essa nova batalha. Se não, ficaremos com a versão dos perdedores.

 Marcos Coimbra